sábado, 20 de maio de 2017

Cerco judicial se fecha em torno de Temer


O presidente Michel Temer foi acusado pela Procuradoria-geral da República (PGR) de tentativa de obstrução à Justiça

O presidente Michel Temer foi acusado pela Procuradoria-geral da República (PGR) de tentativa de obstrução à Justiça, em um novo revés para o chefe de Estado que nesta sexta-feira (19) se esforçava para impedir a debandada de sua base aliada e se manter no poder.
Segundo a PGR, Temer teria agido em coordenação com o senador e ex-candidato à Presidência Aécio Neves, suspenso na quinta-feira (18), para impedir a continuação da Operação ‘Lava Jato’.
“Verifica-se que Aécio Neves, em articulação, dentre outros, com o presidente Michel Temer, tem buscado impedir que as investigações da Lava Jato avancem, seja por meio de medidas legislativas, seja por meio de controle de indicação de delegados de polícia que conduzirão os inquéritos”, afirmou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em seu pedido para que o Supremo Tribunal Federal (STF) autorize a investigação, ao qual a AFP teve acesso.
“Desta forma, vislumbra-se também a possível prática do crime de obstrução à Justiça”, concluiu.
O documento também menciona a participação na trama de Alexandre de Moraes, juiz do Supremo Tribunal Federal e ex-ministro da Justiça de Temer.
Veja também
As acusações se baseiam nas delações premiadas dos executivos da gigante mundial alimentícia JBS, entre eles seus donos, Joesley e Wesley Batista.
As delações só serão consideradas provas depois de validadas pela Justiça.
Desde quarta-feira (17), o Brasil vive um estado de comoção política, quando o jornalista Lauro Jardim, do Jornal O Globo, revelou uma conversa entre Temer e Joesley Batista, na qual, segundo Janot, o presidente deu sua anuência ao pagamento de propina para comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha.
“Depreende-se dos elementos colhidos o interesse de Temer em manter Cunha controlado”, assinala o texto.
Veja também
Nessa reunião, Temer também indicou a Batista que o empresário poderia entrar em contato com o deputado Rodrigo Rocha Loures, seu homem de confiança, para discutir temas de interesse do grupo JBS.
Autoridades registraram Loures e Batista discutindo crimes como garantir a concordância das versões dos acusados no esquema de propinas na Petrobras e da compra de seu silêncio.
O presidente Temer, de 76 anos, negou enfaticamente as acusações, assim como os pedidos para que renunciasse.
– Alarmes –
Os mercados ligaram seus alarmes diante da possibilidade de que a agitação política bloqueasse o avanço das medidas de austeridade impulsionadas por Temer, como o aumento da idade mínima para se aposentar e a flexibilização das leis trabalhistas.
Veja também
A Bolsa de São Paulo registrou uma queda de quase 9% e o real se desvalorizou fortemente frente ao dólar. Nesta sexta-feira, o mercado de ações recuperou um pouco o terreno, chegando a subir mais de 2,7%, embora depois do anúncio do pedido de abertura de inquérito contra Temer, tenha reduzido os ganhos para 1,8%.
O chefe de Estado se reuniu nesta sexta pela manhã com seus assessores legais e transferiu para a parte da tarde um encontro com o ministro da Defesa, Raul Jungmann, e com os comandantes militares.
“O governo está trabalhando em três frentes para voltar à normalidade depois da crise: política, judicial e econômica. O próprio presidente faz parte das negociações com a base aliada”, disseram à AFP fontes do Palácio do Planalto.
Esta crise acontece um ano depois da queda da ex-presidente Dilma Rousseff, acusada de maquiar as contas públicas. O seu impeachment possibilitou que Temer chegasse ao poder para completar o mandato até o fim de 2018, uma missão que parece cada vez mais difícil.
– Pressões –
Temer enfrenta desde quinta-feira oito solicitações de impeachment, além de um processo que corre no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que poderá anular as eleições de 2014 por supostas contribuições de campanha dadas pela Odebrecht, uma das principais envolvidas no escândalo do Petrolão.
A pressão social também cresce. Na quinta-feira, milhares de pessoas pediram “Fora Temer!” no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília, e há mais manifestações previstas para o fim de semana.
Veja também
A ex-ministra e senadora ambientalista Marina Silva, que nas eleições presidenciais de 2014 alcançou quase 20% dos votos, declarou que Temer “não está em condições de governar”.
O ex-presidente do STF Joaquim Barbosa comentou em seu Twitter: “não há outra saída: os brasileiros devem se mobilizar, ir para as ruas e reivindicar com força a renúncia imediata de Michel Temer”.
Em um editorial, o Jornal O Globo fez coro ao apelo em um duro editorial: “a renúncia é uma decisão unilateral do presidente. Não o que é melhor para si, mas para o país”.
Um eventual impeachment somente acontecerá se a base aliada de Temer, ou pelo menos uma parte dela, lhe der as costas.
“Por isso, a primeira questão é saber se os partidos que formam a base do governo deixarão ou não o governo”, disse à AFP Thomaz Pereira, professor de Direito Constitucional na Fundação Getúlio Vargas.
Por enquanto, seu gabinete só sofreu uma baixa: o ministro da Cultura, Roberto Freire, que renunciou ao cargo na quinta-feira.
A Constituição prevê que, em caso de vácuo na Presidência na segunda metade de um mandato, o Congresso elegerá um nome para concluí-lo. No entanto, há interpretações e propostas que permitiriam antecipar as eleições.

Os quatro caminhos que podem derrubar Temer

Processos de impeachment, uma ação no STF, outra no TSE, mais a pressão. Entenda cada uma das forças que age contra a permanência de Michel

A gente sabe que você já está por dentro: Joesley Batista, dono da JBS (a maior companhia de carnes do mundo), fez uma delação premiada acompanhada de gravações de Michel Temer conversando sobre Eduardo Cunha, compra de juízes e promotores – o que ninguém realmente sabe é se continuaremos com o pemedebista até 2018.
A situação, afinal, é tão confusa que, mesmo que as gravações sejam julgadas como irrelevantes, Temer ainda pode sair do cargo.
O que dá para cravar é o seguinte: há quatro mecanismos para apeá-lo do poder. E vamos explicar cada uma delas abaixo:

1- Impeachment

A velha palavra de quatro sílabas pode voltar a dar suas caras depois de dominar praticamente todas as conversas de bar do último ano.
Desde a noite de quarta, 17, quando o jornalista Lauro Jardim trouxe a público a história das gravações, foram protocolados 8 pedidos de impeachment contra Michel Temer.
O número não é incomum, o volume ajuda a pressionar uma decisão favorável à saída do chefe do executivo (só para efeito de comparação, foram produzidos 48 contra Dilma Rousseff).
As ações pela saída de Temer, aliás, não são homogêneas, elas vieram de partidos de quase todos os espectros ideológicos: PSDB, PSB, PT, PCdoB, PHS, Rede e PRP.
Em geral, os textos afirmam que Temer violou a Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950 (que regulamenta o impeachment) no artigo 6 (Opor-se diretamente e por fatos ao livre exercício do Poder Judiciário), 9 (proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo) e 12 (Impedir mandados ou decisões do Poder Judiciário).
Ou seja: os pedidos se baseiam no fato de Temer ter ouvido confissões estapafúrdias de Joesley, como a de que o dono da JBS já tinha pago juízes e um promotor para se livrar da Lava Jato, e, em vez de reagir, não disse nada além de “Ótimo, ótimo”.
Bom, para que Temer deixe o poder por isso, o passo a passo será igual ao que tirou Rousseff e Collor do poder.
O presidente da Câmara permite que a votação tenha início, dois terços da Câmara aceitam a abertura do processo, o presidente do Senado decide se recebe o caso e se a maioria simples do Senado der continuidade ao processo, o presidente da República é afastado do cargo.

2- Supremo Tribunal Federal

Caso a Procuradoria Geral da República (PGR) afirme que Temer cometeu um crime durante seu mandato, ela pode fazer uma denúncia penal ao STF. Em seguida, o Supremo encaminharia o pedido para a Câmara que, com uma aprovação de dois terços do plenário, manda de volta a denúncia para o STF.
Se o Supremo aceitar a denúncia, Temer é afastado de seu cargo por 180 dias, e se for considerado culpado nesse meio tempo, ele o perde permanentemente.
Esse cenário também não está tão distante da realidade. Na última quinta, 18, o ministro do STF Edson Fachin autorizou a abertura do inquérito na Procuradoria que tem Temer como alvo.
Na prática, significa que o presidente se tornou, oficialmente, um investigado na Operação Lava Jato. Agora, a PGR convocará testemunhas e reunirá provas relativas às infrações do Presidente.
Caso as conclusões sejam de que Temer, de fato, cometeu um crime, a denúncia poderá ser encaminhada ao STF e dar início ao processo de afastamento.
3- Tribunal Superior Eleitoral
Uma terceira possível rota para a queda de Temer começou antes mesmo dele assumir como vice-presidente reeleito. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tramita um pedido de cassação da chapa Dilma-Temer.
A ação teve início em dezembro de 2014, quando um documento do PSDB pedia que tanto Dilma como Temer tivessem impedido o direito de governar.
A justificativa é que a campanha teria usado dinheiro de Caixa 2 – e há toneladas de provas de que usou mesmo, como virtualmente todas as outras campanhas de grande porte.
A diferença é que até agora ninguém teve problemas com isso. Mas é aquela história do Al Capone: o gângster não era o único sonegador de impostos na Chicago dos anos 1930, mas quando deu essa brecha, caíram em cima.
É bastante provável que aconteça basicamente o mesmo com o agora isolado Presidente.
Esse julgamento acontece no dia 6 de junho.
4- Renúncia
A pressão sobre Temer é maior do que a que pairava sobre Dilma. Equivale à que Fernando Collor viveu em 1992. O editorial d’O Globo, desta sexta, que pede sua saída imediata dá o tom: Temer está só.
A direita, a esquerda, o centro, os liberais, os socialistas, ninguém quer a permanência de Temer. É pressão o bastante para fazer o Presidente renunciar. A qualquer momento. Sim, ele já disse que não fará isso.
Mas como Michel mesmo já disse: “verba volant” (as palavras voam).
PS: Mas quem assume em quaisquer desses casos?
Essa resposta você encontra, em detalhes, aqui.
Este conteúdo foi publicado originalmente no site da Superinteressante.
Veja também

Sem comentários: