terça-feira, 30 de maio de 2017

“A minha presença no banco foi uma escolha pragmática”


Governador do Banco Central diz que sem renegociação da dívida, o país não anda e acrescenta que há promiscuidade entre política e negócios
O governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, disse, último domingo, citado pela Lusa, que “a promiscuidade entre finanças, empresários e políticos está no cerne do sistema de funcionamento do país”. A afirmação foi feita em Portugal, Cascais, durante uma conferência internacional que discute os horizontes para o desenvolvimento sustentável. 
Aos olhos de Zandamela, o problema “não é o dinheiro, mas a mentalidade”. E explicou que “para operar numa determinada área, o ambiente empresarial não favorece o negócio nem o crescimento, a não ser que o empresário esteja ligado à realidade política do momento”.
Sobre a sua experiência no Banco Central, pressionado por questões da assistência sobre a independência da instituição, Zandamela declarou: “O Presidente apoiou muito, honestamente. Nunca vi nenhuma interferência política e isso mostra a maturidade do Presidente e da sua equipa”.
Com base na sua experiência à frente do Banco Central, considera que “antes, o que acontecia era que era tomada uma decisão, os empresários ou banqueiros corriam para o Presidente a pedir ajuda e a decisão não era cumprida”.
Assegurando que, no geral, o sistema financeiro de Moçambique é sólido e estável, Zandamela admitiu algumas dificuldades, mas escusou-se a enumerá-las, argumentando que “o tema é sensível”.
O responsável também não respondeu sobre que trajectória das taxas de juro defendia para o resto do ano. Entretanto, criticou os “bancos internacionais que operam na arena global, que chegam a Moçambique e não cumprem as regras internacionais”.
No nosso país, apontou, “todo o banco tem um presidente que é um político sénior, não pela competência técnica, mas sim para garantir que nada se passa sem o controlo deles. Não são presidentes, são lobistas”.
O governador do Banco de Moçambique elogiou o Presidente da República, Filipe Nyusi, argumentando que garante a independência do banco, e lembrou medidas difíceis como a liquidação de um banco e subida das taxas de juro.
Favorecimento aos partidos
Respondendo a perguntas da audiência sobre corrupção, durante um debate na conferência Horasis Global Meeting, que decorre até esta terça-feira, em Cascais, perto de Lisboa, Rogério Zandamela criticou a forte dependência do Governo e o sistema de favorecimento aos empresários com ligações ao poder político, mas sublinhou que, no seu caso, ocorre o oposto.
“Subimos as taxas para onde tinham de estar e isso nunca foi feito; fechámos um banco, uma coisa inédita; e intervencionámos alguns relacionados com o poder político, que já não eram bancos, mas ou o país caía com eles ou fechávamos”, argumentou o governador.
Dívida pública a 120% do PIB
A dívida pública de Moçambique “passou de 40% do Produto Interno Bruto (PIB), até 2013, para cerca de 120%, agora, e isso é assustador”, disse o governador do Banco de Moçambique. Respondendo a perguntas da audiência durante o debate na conferência Horasis Global Meeting, em Cascais, Rogério Zandamela acrescentou que “parte dessa dívida é da dívida não divulgada, que é um montante enorme”.
O banqueiro central mostrou-se, no entanto, confiante na capacidade do país ultrapassar a crise económica, orçamental e financeira em que está mergulhado, mas não escondeu que há muitos desafios pela frente. “Somos um dos países mais abençoados do mundo (em termos de recursos naturais), mas precisamos de um modelo de desenvolvimento que melhore a vida das pessoas e, também, os indicadores económicos”, argumentou o governador, considerando que as altas taxas de crescimento, na ordem dos 8% anuais, distorcem a realidade do país.

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