quarta-feira, 31 de maio de 2017

Agricultura em Moçambique é absolutamente inviável com actuais políticas

Agricultura em Moçambique é absolutamente inviável com actuais políticas
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Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 31 Maio 2017
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@VerdadeO discurso de Filipe Jacinto Nyusi, e do seu Governo, sobre terem eleito a agricultura como prioridade para combater à pobreza não passa de boas intenções que não se traduzem em políticas, além disso os Orçamentos de Estado mostram a contradição entre as promessas e as acções. Estes factores, segundo João Mosca, aliados ao contexto internacional “tornam a agricultura em Moçambique absolutamente inviável”. O académico não tem dúvidas que “é preciso mudar muita coisa” e sugere investir na investigação, extensão agrária assim como defender mais e melhor os direitos das comunidades moçambicanas.
Moçambique é um dos poucos países do globo bafejados por extensas terras aráveis onde existem imensos recursos naturais, contudo a nossa “pérola do Índico” é um dos países mais pobres do mundo e, a julgar pelo caminhos que os políticos escolhem, assim vamos continuar por muitos e longos anos caso não se alterem as políticas e modelos de desenvolvimento.
“A terra e os recursos naturais não são condição necessária para o desenvolvimento e transformação estruturada, os exemplos são o Japão, Singapura e Qatar” disse João Mosca durante uma conferência organizada pelo Observatório do Meio Rural(OMR), semana finda, onde o mote foi “Agricultura, Diversificação e Transformação da Estrutura da Economia”.
Na sua apresentação o professor de Economia comparou os factores que diferenciam as economias de Angola, Moçambique, Líbia, Brasil, Qatar, Singapura, Japão e países nórdicos e constatou que “a terra e recursos naturais não são necessários para que exista numa determinada realidade crescimento económico e mesmo desenvolvimento”.
Todavia, de acordo com o académico e economista, “todas as economias desenvolvidas possuem boas instituições, têm democracia, instituições estáveis, com capacidade de intervenção e desempenho de acção, existe estabilidade no sector de negócios”.
“Contrariamente a Líbia tinha apreciável desenvolvimento social e certo desenvolvimento económico mas não tinha democracia e foi esse o factor que alterou profundamente a realidade política”, acrescentou Mosca na sua apresentação onde ainda fez notar que “o poder autoritário do Estado intervencionista está presente em todas as economias do mundo”.
“Nos países seleccionados por mim o Estado teve claramente um papel muito importante no desenvolvimento, em políticas públicas, na criação de infra-estruturas, na formação altamente qualificada dos recursos humanos, na democracia, são aspectos em que o Estado teve um papel muito importante, sendo ou não sendo autoritário”, explicou.
Investimentos na agricultura moçambicana têm sido pouco geradores de emprego
Foto de Adérito CaldeiraNa óptica de Mosca a opção política em Moçambique “é claramente o investimento externo, com pouca criação de valor acrescentado interno e reduzidas relações interserctoriais”.
“Temos a produção absolutamente vocacionada para exportação e secundarização do mercado interno, há duas ou três excepções, como é o caso do açúcar, mas grande parte do agro-negócio é sobretudo para exportação e é onde está concentrado o investimento externo. Temos a vulnerabilidade aos contextos externos, o algodão e o tabaco são casos de grande dependência dos mercados externos de exportação que criam muito acrescida vulnerabilidade ao produtor e da concepção do desenvolvimento que nós temos de dependência do investimento externo, não é o investimento externo que vai resolver os nosso problemas”, referiu.
Para o académico os investimentos feitos na agricultura moçambicana têm sido pouco geradores “de emprego e existe uma exclusão sistemática de mais de 95% dos produtores com a criação de conflitualidades sociais. Há um estudo muito interessante que revela que onde há penetração de capital no meio rural é lá onde existem maiores conflitualidades na questão da terra, reassentamentos. Existe uma agressão ambiental clara de muitas actividades agrícolas, sobretudos ligadas ao agro-negócio”.
Filipe Nyusi tem cortado sistematicamente fundos para agricultura
OMRAlém disso João Mosca elencou várias políticas governamentais que não amigas da agricultura começando pelo orçamento cada vez mais diminuto que é alocado ao sector no Orçamento de Estado e que se reflete na pouca disponibilidade de recursos para a investigação, para a contratação de extensionistas e também para a formação dos camponeses.
O @Verdade verificou, através dos relatórios de execução orçamental desde que Nyusi é Presidente, que o montante destinado ao sector prioritário agrário tem vindo a ser reduzido. No primeiro ano do seu mandato Filipe Nyusi destinou somente 11,3 biliões de meticais a agricultura, menos 10,7% do que no último ano da presidência de Armando Guebuza, e em 2016 o montante reduziu mais 38,3%, cifrando-se em pouco mais de 8,8 biliões de meticais. Já em 2017, nos primeiros três meses, o sector agrário recebeu ainda menos 35,5% do que em igual período do ano anterior, somente 1,1 bilião de meticais.
“Existem poucos subsídios e esses não são acessíveis aos pequenos produtores, muitos nem sabem que existem e quando sabem os procedimentos administrativos são de tal maneira complicados que é preferível nem ter subsídio, e são ineficazes para os médios e grandes”, continuou o professor de Economia a apresentar as más políticas.
“O crédito para a agricultura é abaixo de 5 por cento, se retirarmos o açúcar e e outras culturas de rendimento o que chega aos pequenos produtores não chega a 1 por cento”, acrescentou Mosca que revelou que contactando vários cidadãos pelo país chegou a “conclusão que a lei de terra não é nem nunca foi uma boa lei como nós propagandeamos por aí, é uma lei cínica. E outras leis são deficientemente cumpridas, ou não são cumpridas pelo próprio Estado”.
Agricultura em Moçambique está numa tendência oposta as tendências normais da sua transformação
Ademais, “existe uma fraca realização de funções do Estado sobretudo ao nível da fiscalização, existem actividade predadoras permanentes, madeira cornos de elefantes. Existem agressões ambientais não fiscalizadas. A governação é hiper centralizadora que distorce os mercados, dificulta a iniciativa (o ambiente de negócios), obstaculiza a participação, é exclusivista e autoritária e é incompetente em muitos aspectos”.
“Hoje há menos disponibilidade de produção nacional per capita de alimento do que havia há 50 anos atrás” declarou Mosca recordando algumas das funções que foram definidas a agricultura, “a função de abastecimento do povo está completamente posta de lado. Havia uma segunda função que era o abastecimento de matérias-primas à indústria nacional, a única pergunta que eu coloco é qual é essa indústria?”.
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Apresentando gráficos comparativos entre Moçambique e o mundo, em termos de evolução do PIB, da geração de emprego, da produtividade por hectare, do tamanho das explorações agrícolas, da auto-suficiência alimentar e da balança comercial alimentar João Mosca demonstrou que “os indicadores mais utilizados para ver a transformação estrutural da agricultura estão numa tendência completamente diferente, oposta a aquilo que são as tendências normais da transformação da agricultura e da economia, completamente diferentes todos eles”.
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O professor de Economia deixou no entanto várias sugestões de opções que podem inverter o dramático cenário da agricultura em Moçambique. “As não opções são os baixos recursos de investigação e extensão, não é um problema de distração é uma não opção clara. Há uma deficiente defesa dos direitos das comunidades, porque criar conhecimento, criar advocacia, criar capacidade reivindicativa, criar capacidade de protesto contra a questão do direitos das comunidades penso que faz parte do sistema não criar essa capacidade”.
“É preciso ajustar concepções de desenvolvimento, o sector familiar não pode ser esquecido. Com isso não estou a dizer que não deve haver investimento externo nem grandes empresas”, declarou Mosca que concluiu enfatizando que “as actuais opções de modelos e de políticas, e o contexto internacional, tornam a agricultura em Moçambique absolutamente inviável. É preciso mudar, mudar muita coisa”.

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