O governador do
Banco Moçambique (BM) elogiou hoje o Presidente da República, Filipe Nyusi,
argumentando que garante a independência do banco, e lembrou medidas difíceis
como a liquidação de um banco e a subida das taxas de juro
Respondendo a
perguntas da audiência sobre corrupção durante um debate na conferência Horasis
Global Meeting, que decorre até terça-feira, em Cascais, perto de Lisboa,
Rogério Zandamela criticou a forte dependência do Governo e o sistema de
favorecimento aos empresários com ligações ao poder político, mas sublinhou que
no seu caso ocorre o oposto.
“A minha presença
no banco foi uma escolha pragmática, perceberam que algo tinha de ser feito. O
Presidente da República não interfere no trabalho do Banco Central”, disse
Zandamela, exemplificando com o aumento das taxas de juro e a liquidação de um
banco com ligações a membros do partido no poder.
“Subimos as taxas
para onde tinham de estar e isso nunca foi feito; fechámos um banco, uma coisa
inédita, e intervencionámos alguns relacionados com o poder político, que já
não eram bancos, mas ou o país caía com eles, ou fechávamos”, argumentou o
governador.
Segundo o
responsável, “a promiscuidade entre finanças, empresários e políticos está no
cerne do sistema de funcionamento do país”.
O problema, no seu
entender, “não é o dinheiro, mas a mentalidade”.
Zandamela explicou
que “para operar numa determinada área o ambiente empresarial não favorece o
negócio nem o crescimento a não ser que o empresário esteja ligado à realidade
política do momento”.
Sobre a sua
experiência no Banco Central, e pressionado por questões da assistência sobre a
independência da instituição, Zandamela declarou: “O Presidente apoiou muito,
honestamente; nunca vi nenhuma interferência política e isso mostra a
maturidade do Presidente e da sua equipa”.
Com base na sua
experiência à frente do Banco Central, disse também que achava que “dantes o
que acontecia era que era tomada uma decisão, os empresários ou banqueiros
corriam para o Presidente a pedir ajuda, e a decisão não era cumprida”.
Assegurando que,
no geral, o sistema financeiro de Moçambique é sólido e estável, Zandamela
admitiu algumas dificuldades, mas escusou-se a enumerá-las, argumentando que “o
tema é sensível”.
O responsável
também não respondeu sobre que trajectória das taxas de juro defendia para o
resto do ano.
Ainda assim,
criticou os “bancos internacionais que operam na arena global e chegam a
Moçambique e não cumprem as regras internacionais”.
Em Moçambique,
apontou, “todo o banco tem um presidente que é um político sénior, não pela
competência técnica, mas sim para garantir que nada se passa sem o controlo
deles; não são presidentes, são lobistas”.
Dívida Pública
& investimentos
Sobre a dívida
pública de Moçambique Zandamela afirmou que “passou de 40% do Produto Interno
Bruto (PIB) até 2013 para cerca de 120% agora, e isso é assustador”.
Sobre esta
material Zandamela acrescentou que “parte dessa dívida é da dívida não
divulgada, que é um montante enorme”.
O banqueiro
central mostrou-se, no entanto, confiante na capacidade do país em ultrapassar
a crise económica, orçamental e financeira em que está mergulhado, mas não
escondeu que há muitos desafios pela frente.
“Somos um dos
países mais abençoados do mundo [em termos de recursos naturais], mas
precisamos de um modelo de desenvolvimento que melhore a vida das pessoas e
também os indicadores económicos”, argumentou o governador, considerando que as
altas taxas de crescimento, na ordem dos 8% anuais, distorcem a realidade do
país.
O responsável
sublinhou que “o Investimento Directo Estrangeiro é bom e é uma bênção para o
país”, mas tem o problema de “ser concentrado nas minas, no carvão e no gás”,
enquanto “no resto dos sectores não se passa nada”.
Como exemplo,
apontou a agricultura.
“O sector está
dormente, apesar do enorme potencial que tem. A esmagadora maioria da
agricultura que se pratica é de subsistência, o sector está completamente
subdesenvolvido, há muito pouco para o agronegócio que se vê no Brasil e na
América Latina, e parte disso acontece por causa das regras de investimento. A
lei favorece os grandes investimentos, mas tenta-se fazer um pequeno negócio e
não se vai a lado nenhum”, disse Rogério Zandamela.
O governador, que
chegou atrasado à sessão matinal da conferência por causa dos problemas nos
aeroportos de Londres, acabou por concentrar as perguntas da assistência, e foi
numa dessas respostas que explicou: “O crescimento de 7% ou 8% ao ano faz
grandes manchetes na imprensa internacional, mas olhando para o que realmente
interessa, que são os cidadãos, nós não estamos bem, e as políticas
macroeconómicas também não são saudáveis”.
Moçambique,
lembrou, acumula défices orçamentais ano após ano, e respalda-se no
Investimento Directo Estrangeiro e nos doadores internacionais.
“Se este é modelo
de desenvolvimento que vamos continuar a ter, então vamos ter problemas. Vamos
ter muito dinheiro, mas vamos continuar pobres, porque a maioria da população
não tem emprego nem há hospitais”, exemplificou o governador, que admitiu que
por ter estado 40 anos fora do país se sente como “um ‘outsider’ a viver em
casa”.
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