CONFLITO NA SÍRIA
A culpa é de Putin ou não?
Não bastam as declarações da Administração norte-americana de comparar Assad a Hitler, são necessárias provas claras e inequívocas de que foi o dirigente sírio que empregou as armas químicas.
O emprego de armas na Síria necessita de uma investigação independente e profunda a fim de deixar claro quem são os culpados, uma investigação que nos mostre se o ignóbil acto foi ou não cometido por Bashar Assad com o conhecimento de Vladimir Putin.
O ataque químico na Síria colocou uma vez mais a importância de uma informação mais equilibrada e cuidadosa para que não continuem a enganar a opinião pública.
Não nutrindo qualquer tipo de simpatia pelo Presidente russo, considero que ele está a utilizar um erro passado dos Estados Unidos para provar que, quem mente uma vez, mente outras vezes. O ataque norte-americano ao Iraque em 2003, como é sabido, teve como justificação a existência de armas de destruição massiva nas mãos do ditador Saddam Hussein, o que acabou por nunca ser provado.
O mundo está a pagar muito caro por esse engano, pois a invasão do Iraque é uma das etapas principais das guerras civis que assolam os países do Médio Oriente e do Norte de África. Dessa vez Vladimir Putin protestou, mas engoliu a amarga pílula de ver cair um dos seus aliados na região: tinha sido eleito Presidente da Rússia há apenas três anos e estava longe de ser o senhor autocrático que hoje é.
Mas desde aí as coisas mudaram muito e o Kremlin quer voltar a afirmar-se como uma peça fundamental, e até decisiva, na cena internacional. Depois de ter passado com êxito o teste da anexação de partes do território de países vizinhos como a Geórgia e a Ucrânia, virou-se para voos mais distantes a fim de não perder a única base naval que a Rússia tem no Mediterrâneo, e também a sua única base naval de “águas quentes” no mundo. O pretexto foi combater o Estado Islâmico, mas é sabido que, na realidade, Putin foi em defesa do aliado que lhe garante a presença na região.
Neste momento, o Presidente russo vê-se perante as acusações gravíssimas de ter permitido a Bashar Assad o emprego de armas químicas contra a oposição, sendo a Rússia o garante de que o regime sírio já não dispunha desse tipo de armamento.
Donald Trump, para surpresa de muitos, mandou bombardear uma base militar síria como represália pelo emprego de armas químicas pelo regime de Assad, criando uma situação, em crescendo, de potencial confronto entre a Rússia e os Estados Unidos. Moscovo, como é habitual, nega tudo e Putin até se dá ao luxo de recorrer aos clássicos da literatura soviética para comentar a situação: “Mas que tédio, raparigas. Já vimos e observámos tudo isso”.
Numa situação destas, não bastam as declarações da Administração norte-americana de comparar Assad a Hitler ou de Trump lhe ter chamado “animal”. São necessárias provas claras e inequívocas de que foi o dirigente sírio que empregou as armas químicas.
A imprensa russa controlada pelo Kremlin sustenta que as crianças vítimas do ataque químico já estavam mortas e que tudo não passou de uma encenação para que Trump desviasse a atenção da opinião pública dos problemas que enfrenta no seu país, mas o estranho é que essa imprensa foi buscar essa e outra informação a um sítio da internet pouco recomendável. Aí foi publicado o artigo “False Flag attack on Khan Shaykhun”, mais tarde retirado.
Além disso, a imprensa russa e a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Maria Zakharova, citam também uma pouco conhecida organização, os Médicos Suecos pelos Direitos Humanos (SWEDHR), que acusa os capacetes brancos de terem encenado a assistência às vítimas do ataque.
Esta é mais uma das razões para que se tente apurar a verdade e não permitir a repetição de tais barbaridades. Se ficar evidente que se tratou de um ataque de Assad, a reputação de Putin ficará afectada mesmo junto de muitos que o consideram uma “pomba da paz”. Caso contrário, ganham argumentos os que afirmam que os Estados Unidos são governados por políticos que tomam decisões antes de pensar e podem pôr o mundo no limiar do abismo.