Capitão “Comando” Sousa Gonçalves (1)
A
três meses de terminar a minha comissão em Angola – Agosto de 1966 -,
fui convidado pelo então Capitão “Comando” Jaime Neves, Comandante da
2.ª Companhia de Comandos, a seguir para Moçambique.
Decorria, então, um conflito com a Rodésia, e constava-nos que iriam invadir Moçambique.
Desde que parti, não viera mais à Metrópole, mas, na altura, já estava enraizada em mim o sertanejo e o sangue de África.
Aderi
de imediato e lá fomos para Moçambique no navio Pátria, que entretanto
acostara em Luanda, com tropa para aquele território, onde há pouco se
levantara o terrorismo de então, e/ou nacionalismo de agora.
Desembarcámos
em Lourenço Marques, agora Maputo, fizemos um desfile histórico nesta
cidade, e seguimos para o Lumbo, pequena localidade em frente à cidade
de Moçambique (Ilha de Moçambique), onde, em velhas instalações civis,
ficou a 2.ª Companhia de Comandos.
Norte
de Moçambique, - nada a ver com a civilização urbana -, terra santa que
jamais esquecerei, nem das suas boas gentes, cordiais e afáveis, e,
enquanto lá estive, amigas.
Quero
recordar e salientar o espírito “Comando” existente na companhia, como
num todo sagrado, entre oficiais, sargentos e praças.
Que espírito mais lindo.
Amor à nossa Pátria, na qual se incluía, na altura, Moçambique.
Espírito de servir, sem nada querer em troca.
Vida ou morte, tendo no meio a adversidade.
Camaradagem.
Disciplina.
Amizade.
Era lindo; por que não dizê-lo?
Porquê renegá-lo?
Mesmo que seja em nome do stress que dá o vil metal.
Era verdade, logo é verdade.
Combatendo no Niassa e em Cabo Delgado
Falemos agora da guerra propriamente dita.
Na época, 1966/67, apenas ocorriam acções de terrorismo (agora nacionalismo) em Cabo Delgado e Niassa.
Em
zonas próximo das fronteiras hostis – de onde se vinha e para onde se
fugia -, sem desenvolvimento económico e social e sem qualquer relevo
demográfico.
Em
Cabo Delgado havia contactos com os terroristas (agora nacionalistas),
nomeadamente no Vale de Miteda, Mutamba dos Macondes e Sagal. Isto para
além das minas nas estradas principais de acesso a locais onde se
encontrava a quadrícula das tropas portuguesas (da Metrópole e de
Moçambique).
Vila Cabral era conhecida pelo “estado de minas gerais”, pelas minas que punham nas estradas.
Quero
aqui deixar o meu testemunho de que, exceptuando casos especiais, como o
mais paradigmático, que referirei mais à frente, o inimigo, graças a
Deus, não era de grande qualidade, certamente por motivos que me
escapam, ou que, por uma questão de educação e de carácter não vou
referir.
Pelo
referido e tirando algum caso, certamente raro, na minha opinião, os
heróis da guerra de Moçambique, que eu conheço, foram todos os militares
que, na época(s), cumpriram a sua Missão.
Eu acho e para mim sei, que foi um todo, de centenas de milhares de gente humilde e séria do Povo Português (incluindo muitos naturais, na maioria esmagadora de raça negra, os brancos, muito poucos e quase todos obrigados), os que se notabilizaram.
Penso
que a maioria deles, e cada qual pelo seu motivo decorrente da (s)
missão (ões), deveriam possuir a Cruz de Guerra (colectiva).
Mas os “homens”, sempre os mesmos, não quiseram e não deixaram que assim acontecesse, para que muitos “desses”, sem nada fazerem de mérito, tivessem sido medalhados.
Fiz todas as operações da companhia.
Cumprimos sempre, mas sempre, rigorosamente todas as missões de que fomos incumbidos.
A
companhia trabalhava sempre a nível de grupo de combate completo (25
homens), ou dois grupos de combate incompletos. Algumas vezes, a nível
de equipa (cinco homens) ou menos (casos especiais).
Naquele
tempo as operações tinham o seu início (quase sempre) pela uma ou duas
horas da madrugada. De viatura, éramos largados nos locais próprios para
iniciar as longas caminhadas pelas matas do Norte de Moçambique (Mueda e
Vila Cabral). Em Vila Cabral também fomos transportados de barco (Largo
Niassa)
Na altura, em Moçambique, apenas havia dois helicópteros “Alouette II”. Um em Mueda e outro em Vila Cabral.
Passava-se extremo calor e extremo frio.
Às vezes falta de comer.
A Guerra, essa, era quase sempre igual.
A nossa vontade férrea e a técnica de combate apurada, traduziram-se em missões sempre cumpridas, completa e rigorosamente.
Nunca tivemos, por que não dizê-lo, inimigos (na época) à altura (agora nossos amigos).
Quero só narrar uma operação que foi, efectivamente diferente das outras.
Recebemos,
no Lumbo, o General Costa Gomes, que transmitiu ao comando e oficiais
e, de seguida, a toda a companhia formada para o efeito, que no Vale de
Miteda (em Mueda), onde havia uma enorme e importante base do inimigo
(da altura) até aí inexpugnável, um Batalhão de Tropas Especiais (não
digo quais) não conseguia entrar e retirara com dois mortos e feridos.
Ele (General Costa Gomes) sabia que apenas nós seríamos capazes de cumprir a missão, e que a mesma tinha enorme risco.
De imediato gritámos nas nossas almas, Mama Sume (Aqui Estamos).
O Capitão Jaime Neves planeou com os oficiais (como era sempre seu hábito) como seria a operação.
Como os grupos estavam desfalcados por pessoal doente (a maioria de estômago), dividiu a companhia em dois agrupamentos: Um
com o 1.º e o 2.º Grupos de Combate, com o total de 29 comandos. O
outro, com o 4.º e 5.º Grupos de Combate, em que se incluía o Capitão
Jaime Neves.
Quero aqui realçar que o nosso comandante de companhia nos acompanhava sempre e, quando não o fazia era a nosso pedido,
para ir no avião e dar-nos indicações; isto é importante que seja dito,
porque é importante ser dito, como exemplo, quiçá raro, na guerra dos
que hoje lhe chamam de colonial e nós fizemos como sendo do Ultramar.
Continuando
a descrição. O 4.º e 5.º grupos seriam de apoio em caso de necessidade,
e o 1.º e 2.º grupos iriam entrar no Vale de Miteda, destruir a base e o
hospital e regressar à povoação. Retirar, nunca.
Foi uma operação curta. Iniciou-se na madrugada de um dia, “dormiu-se”
debaixo de chuva e, no dia seguinte, a altas horas da noite, já estava
em Miteda, com a missão cumprida. Várias armas capturadas, todas em
reacção às cinco ou seis emboscadas que sofremos, acampamento e hospital
destruídos (à sua entrada sofremos a última emboscada), e regresso sem
baixas.
Não esqueço:
Fizemos o planalto até ao início do vale, sempre a corta-mato, evitando os trilhos.
Ao iniciarmos a descida para o vale, fomos detectados e contados.
Diziam que éramos 29 e que não tinham morteiros nem bazucas e que íamos morrer.
Levávamos connosco um guia, que traduzia estas coisas.
Passámos a noite debaixo de chuva torrencial, encostados às árvores (sentados no chão) e com a segurança ao máximo.
Não havia “tecto” para podermos ser apoiados pela Força Aérea.
Até de madrugada nunca fomos atacados e apenas seguidos com gritos e frases de intimidação ouvidas ao longo do vale.
Ao iniciar a marcha, logo ao nascer do sol, passados poucos metros, tivemos a primeira emboscada, e assim sucessivamente.
Só o inimigo e a nossa apurada técnica de combate, e é claro, a sorte (A Sorte Protege os Audazes), impediu que tivéssemos qualquer baixa.
É
certo que a nossa postura em combate e também a nossa fama e proveito,
muito ajudaram a que a rapidez das fugas do inimigo fosse quase superior
à rapidez e certeza das suas balas.
Seguindo
sempre por trilhos frescos (com grande risco, mas só assim era possível
cumprir a missão) e vencendo as emboscadas sempre com êxito, chegámos
ao objectivo, que destruímos.
Nessa altura tomou-se a decisão brilhante de fazer tudo ao contrário do que o inimigo estava habituado.
Quando acabámos de atingir o objectivo e destruí-lo, caía a noite.
O
normal seria afastarmo-nos do local, e como bem sabíamos fazer,
arranjar o local melhor e mais seguro para dormir, arrancando de
madrugada de regresso a Miteda. Mas não. Apesar de estafados – é bom
lembrar que a resistência daqueles “comandos” era quase infinita -,
decidiu-se iniciar, de imediato, a marcha forçada de regresso.
Soubemos
mais tarde que o inimigo preparara uma grande emboscada à nossa espera,
na manhã do dia seguinte. Nessa altura já descansávamos calmamente no
quartel de Miteda, regressando depois a Mueda.
O que esperava desta operação? Uma Cruz de Guerra colectiva para os dois grupos de combate.
Enfim, era a vida!..., não foi assim. Também assim foi no 25 de Novembro de 1975!...
Não
falo mais de guerra, mas quero frisar que estes exemplos não interessam
aos pseudo-intelectuais da esquerda bem pensante. E digo da esquerda
porque não há direita. Assim, os pensadores são todos dos muitos lobbies da esquerda – vide afirmações do Dr. Alberto João Jardim.
Ah!, não tenho stress, não conheço ninguém com stress e penso que em nome da dignidade dos Combatentes do Ultramar, se lixe o vil metal.
A bom entendedor, meia palavra basta.
E para terminar mesmo esta parte, lamento não acompanhar as “lamúrias militantes” de todos os que agora escrevem e filmam sobre a Guerra Colonial, na altura, e para mim sempre, Guerra do Ultramar.
Trabalhando em Moçambique
Acabada a comissão em Moçambique e como comecei a namorar na sua parte final, por lá resolvi ficar.
Casei
em 4-11-1967, com quem jamais esquecerei (a minha falecida mulher Rosa
Maria) e em Moçambique – Ilha de Moçambique – nasceu a minha filha
Tatiana.
Nesta
Ilha havia desenvolvimento social, de educação, económico, e o ambiente
entre a população, que pessoalmente considero a mais portuguesa de
todas, era bom e saudável
Digo
que era a mais portuguesa da terra porque nela existiam todas as raças
do mundo e a miscigenação entre elas; talvez somente a pele vermelha não
existisse.
Havia clubes, onde proliferava uma forte convivência social.
As pessoas tinham uma excelente relação.
O Governo fazia um enorme esforço no sentido do desenvolvimento. Finalmente.
E havia o mar.
E havia o céu.
E havia o continente, ali tão perto.
Enfm, havia África.
Uma África dos homens, independentemente da cor da pele.
Uma
África da Paz – circulava-se total e livremente – com excepção de Mueda
e Vila Cabral, onde se fabricava o neo-colonialismo (actual).
Uma África onde a escola funcionava para todos e com disciplina.
Haveria certamente coisas más, como em qualquer sociedade humana, mas as boas eram tantas que as más passavam despercebidas.
E mesmo para os mais pobres, pelo menos não havia fome.
E havia saúde.
E havia livremente todas as culturas.
Não tenho dúvidas que se vivia muito, mas muito melhor do que depois e do que hoje.
É
pois mentira toda a arenga da pseudo-esquerda (já não há direita),
quando fala mentindo sobre esse período da História de Portugal, no
Ultramar
E veio o 25 de Abril.
E veio o 26 de Abril.
E veio o 1.º de Maio (o primeiro).
Qualquer
cidadão minimamente informado (não facilmente como hoje, pois os livros
da (s) cartilha (s) estão em todas as livrarias) ficou a saber que
vinha aí o ódio, o racismo, as perseguições e a guerra civil, isto é, o
comunismo (de então, que agora é democrata).
Decidi, de imediato, vir-me embora.
Fui o primeiro português a abandonar a Ilha de Moçambique, em 5-9-1974, com a minha mulher e a filha Tatiana.
Chorei amargamente ao abandonar a minha primeira casa em Família. (na Ilha de Moçambique).
Cheguei a Lisboa em 7 de Setembro.
Soube, mais tarde, que andaram à minha procura para me prenderem por causa do chamado 7 de Setembro.
E porquê? Por estar metido em alguma coisa ?
Não.
Porque era “Comando” e branco.
É
assim a justiça de todas as revoluções baseadas espiritualmente e a
seguir à Revolução Francesa – injustiças, mártires sem culpa, denúncias
falsas, terror e sangue inocente do Povo.
E “pronto”.
Para que se saiba e ao contrário do que muito inculto e ignorante pensa
- que os portugueses em África eram ricos e roubavam os pretos – e nem me refiro ao mentirosos, eu
era empregado bancário, a minha mulher professora primária desde os
vinte anos a ensinar, e bem, centenas de crianças de todas as raças e
cores, mas principalmente pretas, porque eram em maior número.
Servi a minha Pátria.
Nunca quis nada em troca.
Não renego nada.
Desembarquei
em Lisboa sem um escudo, apesar de ter recomeçado a minha vida logo em 1
de Outubro de 1974, 23 dias depois de desembarcar, sempre a trabalhar
honestamente e no duro.
Viva Portugal (por enquanto).
Nota:
(1)
Artigo feito a meu pedido. Este oficial teve papel preponderante no 25
de Novembro, depois de se ter oferecido para comandar uma das duas
companhias formadas por “comandos”, ex-combatentes do Ultramar, que tal
como ele, no “Verão Quente” de 1975, responderam ao apelo do Comandante
do Regimento de Comandos, Coronel Jaime Neves, abandonando os seus
empregos para reporem a democracia e a liberdade em Portugal. Entre1992 e
1998 foi Presidente da Associação de Comandos, substituindo o também
ex-alferes da 2.ª Companhia de Comandos, Vítor Ribeiro.
1 comentário:
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