Joana Simeão num comício do GUMO em Lourenço Marques (1974)
Por: Linette Olofsson
A
Mulher é a guardiania da espiritualidade humana. É a matriz da vida. É a
personificação da grande Deusa.É a que acolhe, cria e desenvolve os
processos de vida.É a perfeição mais perfeita e completa do
Universo.Contudo, todos estes atributos podem não passar de poesia
quando olhamos para o passado e presente da mulher no nosso país.
Esta reflexão vem a propósito de mais um 7 de Abril, dia consagrada pela Frelimo como sendo o dia da mulher moçambicana.
Em
Moçambique, na fase pós-independência, a constituição da primeira
República estabeleceu direitos iguais para homens e mulheres. Não
obstante este facto, a situação da mulher em Moçambique continua a ser
influenciada predominantemente pela tradição e pelas atitudes e
estruturas do passado. A falta de capacidade de gerência para o
melhoramento das receitas e da segurança alimentar das famílias; a
persistente divisão do trabalho na base do gênero; o analfabetismo, o
HIV/SIDA e a mortalidade materno infantil tem constituído obstáculos
para a participacao da mulher em novos empreendimentos e na vida
pública. Os dados oficiais apontam que Mocambique tem mais de 19,889
milhões de habitantes (2006).Mesmo considerando a existência de alguns
centros urbanos relevantes como Maputo, Beira e Nampula, a maior parte
da população vive nas áreas rurais, distante das principais vias de
comunicação. E, para o “agrado” do “gênero masculino”, a maioria de
cidadãos é constituida por mulheres.
Sendo a maioria de cidadãos residentes em áreas rurais, não deixa de ser conveniente, oportuno e urgente apelar que se reforce o olhar para o empoderamento da
mulher a partir da própria zona rural. É um exercício dificil se feito a
partir do ponto em que me encontro (cidade capital e zona privilegiada
dessa cidade). O que me importa afirmar nesta data consagrada a mulher
em Moçambique é que chega de discursos prenhes de maquiavelismos, com
alguns a acumularem privilegios pessoais nas cidades em nome da mulher
rural.Na verdade, o que se assiste é uma grande exclusão deste grupo de
mulheres na gestão e solução dos seus próprios problemas, quer a nível
local, nacional e internacional. Penso que é tempo da mulher rural
ocupar o seu espaço, na qualidade de legítima portavoz dos seus
problemas, e nao permitir que o seu espaço continue a ser usurpado por
mulheres que nada têm a ver com a sua realidade. E pode-se tomar como
exemplo o que existe noutros quadrantes. Os governos da India, China,
Bangladesh, Brasil e alguns países da America Latina são pioneiros na
promoção da mulheres rurais, criando-lhes condições para a sua
participação directa nos foruns regionais, internacionais e outros, como
forma de as estimular na área específica em que estão inseridas, pois
entende-se que a zona rural é a base de desenvolvimento dos
subdesenvolvidos.
No
nosso país, infelizmente, as coisas estão invertidas. Os grupos que
participam nestas cimeiras importantes de desenvolvimento ao nível
mundial são constituidos por senhoras residentes em capitais
provinciais, senão mesmo apenas na cidade capital do país (Maputo),
preterindo-se a mulher rural que sofre na carne a “dor” de ser mulher
numa sociedade em que a tradição dá privilégio ao homem.
A
mulher mocambicana, como em outros países do continente africano,
participou na luta de libertacao nacional, assumindo tarefas femininas e
outras directamente relacionadas com a actividade militar. A maioria
das guerrilheiras não tivera uma evolução notória no panorama político e
social mocambicano. Com a excepção de Graça Machel (que pouco se sabe o
quanto se embrenhou pela matas de Cabo Delgado e Niassa à procura da
independência), nenhuma das guerrilheiras que lutaram lado-a-lado com
homens naqueles tempos dificeis atingiu, após a luta de libertação, um
lugar de destaque no panorama político do país. Quanto muito, ocuparam
alguns cargos de direcção (femininas, entenda-se) e de subalternidade na
ex-Assembleia Popular durante a vigência do sistema monopartidário.
Isto visava apenas emprestar certa credibilidade ao consagrado na
constituição. Tal como jamais se admitiu uma mulher chefe de família, as
mulheres na era samoriana mantiveram-se da mesma forma submissas ao
homem.
Na
esteira do actual debate de quem deve ser considerado herói nacional,
comemora-se hoje o 7 de Abril dia morte de Josina Machel, considerada Heroína pelo partido Frelimo dentro de um específico contexto Histórico.
O que
se sabe e que se lê sobre Josina Machel é que foi esposa de Samora
Machel; que foi uma das mulheres que “revolucionou” o papel da mulher na
luta de libertação nacional. É dito também que foi uma das fundadoras
da OMMe que morre vítima de doença a 7 de Abril 1971. Não se conhece
nenhum discurso político desta “heroína”, para além de algumas pessoas
que com ela privaram afirmarem que não passava de uma pessoa como outra
qualquer, que teve apenas a “sorte” de ser a esposa do então líder.
Nesta
data de 7 de Abril, o que pretendemos e o que questionamos é a
herocidade de Josina. O que diferenciou Josina de outras mulheres
combatentes naquela altura que também participaram na luta pela
independência? O que fez dela uma mulher especial e que as outras não
fizeram? Infelizmente, até hoje, ainda não existem estudos que nos
mostrem uma grande difereça entre esta senhora e outras que também
deram suas vidas heroicamente. Mas em Moçambique existem exemplos de
mulheres de fibra. O exemplo
da Dra. Joana Simeão pode considerar-se um caso ímpar se visto com
“olhos de ver” nos dias de hoje. Por conveniências políticas (neste país
de todos nós), pouco se sabe sobre a trajectória dessa senhora, senão
que foi reaccionária e traidora. Contudo, os poucos registos que existem
ilustram que em 1974/1975 em Moçambique estava-se perante uma mulher de
fibra, de facto, que na sua época havia ultrapassado algumas barreiras.
Com
efeito, mulher moçambicana da etnia macua, Joana Simeão foi uma das
poucas académicas de raça negra que se notabilizou nos anos 60 antes da
independência nacional. Assassinada pela Frelimo por possuir uma visão
política social diferente, se analisados hoje os seus depoimentos
televisivos e escritos, podemos chegar à conclusão de que se não
lhe
fosse tirada a vida seria uma grande mulher e, quiçá, fonte de
inspiração de muitas jovens, imediatamente após a conquista da
independência. E, escusado é dizer, o quão era necessária para as
moçambicanas (na época) uma fonte de inspiração viva. Penso que Joana,
muito teria contribuido para esta democracia nascida pela via do sangue e
violência. De certa forma, embora alguns círculos ligados ao poder
político em Moçambique a comprometam com o regime salazarista (o que
nunca se comprovou, documental ou detalhadamente), para todos os
efeitos, Joana Simeão foi um caso excepcional da emancipação da mulher moçambicana.
Contra toda a regra consuetudinária, foi a primeira mulher de
Moçambique a bater-se, ombro a ombro, com homens na matéria de
governação de um estado soberano. Na época, nenhuma mulher de raça
negra, para não dizer de qualquer outra raça em Moçambique, foi tão
longe quanto ela. Era uma mulher esclarecida que, não se comparando a
muitas que viriam a ser cooptadas a heroínas por conveniências
políticas, se pôs a brandir a sua valentia de não submissão cega. Tinha
uma arma, o saber, que em 1975 teria sido uma mais-valia para a
consecução do progresso da mulher em Moçambique. E, desde já, seria
interessante que os jornalistas moçambicanos, sobretudo os ligados a
estações televisivas como a STV, Miramar e outras, em colaboração com
RTP, retransmitissem as entrevistas dessa figura, para que no presente
todos possamos ajuizar. E isto pode ser feito por via de um programa
específíco, de natureza política e social, visando esclarecer os que não
viveram na época os sinuosos caminhos da descolonização portuguesa.
Aqui – proponho – chamar-se-iam também os que lhe vilipendiaram na época
(muitos ainda vivem) para apresentarem os seus argumentos e documentos
da então acusação.
Quando
de fala de 7 de Abril e de heróis nacionais o que se pretende não é
negar a eventual heroicidade de Josina. Tal como é discutível a sua
heroicidade, pretende-se, acima de tudo, que haja uma data consensual
alusiva à mulher moçambicana, de modo a que todas as sensibilidades da
esfera social moçambicana se sintam identificadas. E, penso que isto não
é pedir demais, pois após longos anos de colonização estrangeira, a
mulher rural mocambicana, enfrentou inúmeras adversidades durante a
construçao do Estado independente; viveu uma ditadura do ploletariado
imposta pela Frelimo e posteriormente a guerra civil; passou pelo
processo de mudanças quer no plano económico, político e social; passou
por um estado de guerra de armas num sistema de partido único, para um
estado de “paz aparente” num sistema democrático parlamentar, mas
continua a enfrentar a pobreza; doenças endêmicas e exclusão social,
pois não obstante o processo de tranformaçoes do séc. XX, acompanhado
pelo grande desafio que é globalização, ou mundialização neste limiar do
sec. XXI, a mulher rural de Moçambique continua sendo o estandarte em
que alguns se apoiam para alcançarem privilégios nas cidades capitais.
Urge pôr fim a isto, e pôr a mulher rural à frente dos seus problemas. O
sonho de Joana Simeão mantem-se vivo.
Linette Olofsson
Deputada suplente
Circulo Eleitoral de Zambézia
http://macua.blogs.com/moambique_para_to dos/2006/04/em_memria_de_jo.html
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Coloquei este "Post" no dia em que se celebra o Dia da Mulher Moçambicana, em homenagem a Josina Machel.
De acordo com os documentos recolhidos,
esta guerrilheira não teve qualque actividade política relevante e tem o
destaque que tem, por ter sido casada com o Samora Machel, nada mais.
Agora atribuir-lhe um dia em sua memória, foi mais um devaneio da Frelimo.
Publicado por gruposespeciais às 23:47
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