Deslocámo-nos a Leixões e recolhemos opiniões de alguns dos retornados, desembarcados. Começámos por ouvir o sr. M. C. (iniciais do nome indicado), empregado de "boite" em Lourenço Marques. Eis as suas palavras:
- A Polícia de Moçambique queria obrigar-me a denunciar todas as mulheres que tinham trabalhado em "boites" em Lourenço Marques, e que eu conhecia, a fim de as deterem sob acusação de prostituição. Neguei-me a fazê-lo! A partir dessa minha recusa, comecei a ser alvo de perseguições e ameaças, até que consegui refugiar-me a bordo do "S. Tomé" que me trouxe para Portugal. Finalmente a salvo!
Era a primeira declaração de um dos fugitivos das arbitrariedades, sem fim, da Frelimo.
Porém, as queixas choviam de todos os lados. Frases soltas havia, como estas: "A Frelimo só nos deixou trazer roupa... mais nada", "até os discos me apreenderam", "a saída do navio foi retardada porque a lei das 'nacionalizações', decretada pelo 'camarada' Machel, já abrangera também as nossas bagagens, os nossos carros, as nossas mobílias. Assim, só pudemos trazer a roupa!!!"
Registamos todas as queixas chegadas até nós. Entre os refugiados,
gente de cor, afinal portugueses como nós! Ouvimos depois a D. Maria C.
Q. C. (iniciais do nome indicado), africana que, com seu filho de 9
anos, fugiu de todo aquele martírio, considerando-se finalmente a salvo.
Começou por nos dizer:
- Aquilo em Tete está muito mau! Não há lei, não há respeito por nada, nem por ninguém. Escorraçaram os portugueses de lá, para poderem ocupar as suas casas. Olhe, só peço a Deus é que o meu marido -que é branco - consiga salvar-se daquele inferno e chegue até nós, aqui, a Portugal!
- Que se passa efectivamente em Moçambique, para que tanta gente continue a fugir de lá? Perguntamos.
- Passa-se tudo. Eles chegam a matar crianças, cujo pai seja branco e a mãe de cor. Vi uma criança com 3 anos, ser trucidada por militares da Frelimo que a atropelaram com um camião da tropa. Depois, com ar de gozo, os ocupantes do camião, todos com farda da Frelimo, perguntarem aos presentes de que cor era a criança, e riam-se! Todas estas atrocidades a que nem os inocentes pequeninos escapavam, fizeram com que me viesse embora para a terra do meu marido.
- Quer então dizer que o ódio rácico não é só contra o elemento branco? - foi a pergunta que fizemos de seguida.
- Não! É também contra os "mistos"! Constantemente nos insultam e mandam embora para a terra dos nossos pais. As crianças mestiças só podem estudar até à 4a classe. Depois vão para as "machambas" trabalhar no campo.
- É verdade que se continua a prender gente arbitrariamente? -insistimos ainda. A nossa interlocutora mostrava-se aberta ao diálogo. Queria falar. Queria dizer a toda a gente o que era o martírio da vida em Moçambique!
- Continuam sim senhor! Estão a prender muita gente. Em especial raparigas, brancas, mistas e negras, para mandarem para as "machambas" onde fazem trabalhos muito difíceis! Eu tenho é muita pena dos brancos que lá estão presos. São obrigados a fazer os piores trabalhos, como "abrir latrinas" e nem sequer têm visitas. Tenho muita pena deles.!!!
- E os presos pretos? São bem tratados? - quisemos saber.
Não. É frequente até haver discussões entre presos pretos e carcereiros da Frelimo. Desta tive eu conhecimento: Houve um que foi mandado para a mata abrir latrinas. Ele recusou-se a ir, dizendo que no tempo dos portugueses trabalhava muito mas recebia ordenado. Agora levava pancada, trabalhava e não recebia nada. Além do mais, ele, que era preto, que fosse trabalhar pois não recebia ordens de pretos como ele! Isto originou violenta altercação. A certa altura o militar da Frelimo mandou o preso dar vivas à Frelimo. Este voltou a negar-se e, depois de ter gritado "abaixos" à Frelimo, deu vivas a Portugal e a Caetano. Depois destes incidentes, esse preso desapareceu. Nunca mais se soube dele. Se calhar foi morto!
In DESCOLONIZAÇÃO E INDEPENDÊNCIA EM MOÇAMBIQUE – FACTOS E ARGUMENTOS, de Henrique Terreiro Galha (págs 243 e seguintes)
- Aquilo em Tete está muito mau! Não há lei, não há respeito por nada, nem por ninguém. Escorraçaram os portugueses de lá, para poderem ocupar as suas casas. Olhe, só peço a Deus é que o meu marido -que é branco - consiga salvar-se daquele inferno e chegue até nós, aqui, a Portugal!
- Que se passa efectivamente em Moçambique, para que tanta gente continue a fugir de lá? Perguntamos.
- Passa-se tudo. Eles chegam a matar crianças, cujo pai seja branco e a mãe de cor. Vi uma criança com 3 anos, ser trucidada por militares da Frelimo que a atropelaram com um camião da tropa. Depois, com ar de gozo, os ocupantes do camião, todos com farda da Frelimo, perguntarem aos presentes de que cor era a criança, e riam-se! Todas estas atrocidades a que nem os inocentes pequeninos escapavam, fizeram com que me viesse embora para a terra do meu marido.
- Quer então dizer que o ódio rácico não é só contra o elemento branco? - foi a pergunta que fizemos de seguida.
- Não! É também contra os "mistos"! Constantemente nos insultam e mandam embora para a terra dos nossos pais. As crianças mestiças só podem estudar até à 4a classe. Depois vão para as "machambas" trabalhar no campo.
- É verdade que se continua a prender gente arbitrariamente? -insistimos ainda. A nossa interlocutora mostrava-se aberta ao diálogo. Queria falar. Queria dizer a toda a gente o que era o martírio da vida em Moçambique!
- Continuam sim senhor! Estão a prender muita gente. Em especial raparigas, brancas, mistas e negras, para mandarem para as "machambas" onde fazem trabalhos muito difíceis! Eu tenho é muita pena dos brancos que lá estão presos. São obrigados a fazer os piores trabalhos, como "abrir latrinas" e nem sequer têm visitas. Tenho muita pena deles.!!!
- E os presos pretos? São bem tratados? - quisemos saber.
Não. É frequente até haver discussões entre presos pretos e carcereiros da Frelimo. Desta tive eu conhecimento: Houve um que foi mandado para a mata abrir latrinas. Ele recusou-se a ir, dizendo que no tempo dos portugueses trabalhava muito mas recebia ordenado. Agora levava pancada, trabalhava e não recebia nada. Além do mais, ele, que era preto, que fosse trabalhar pois não recebia ordens de pretos como ele! Isto originou violenta altercação. A certa altura o militar da Frelimo mandou o preso dar vivas à Frelimo. Este voltou a negar-se e, depois de ter gritado "abaixos" à Frelimo, deu vivas a Portugal e a Caetano. Depois destes incidentes, esse preso desapareceu. Nunca mais se soube dele. Se calhar foi morto!
In DESCOLONIZAÇÃO E INDEPENDÊNCIA EM MOÇAMBIQUE – FACTOS E ARGUMENTOS, de Henrique Terreiro Galha (págs 243 e seguintes)
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