sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Cartas ao Presidente da República (27)

Ouvir com webReader LEVIATÃ Por Laurindos Macuácua
Digníssimo Presidente da República, bom dia. Hoje escrevo para lhe dar uma notícia má. Não. Não quero que se engasgue nessa vossa magna reunião da VII Sessão Ordinária do Comité Central da Frelimo. Quero que o Presidente sinta o sabor a fel destas palavras que agora lhe vou dirigir. Saem-me do recôncavo da alma. Se são cheias de espinhos não sei. Mas me foram embutidas pela Frelimo desde o primeiro dia que vi a luz do sol neste sítio chamado Moçambique.
Vim dizer aqui e agora que demito a Frelimo da minha vida. É isso mesmo: não quero mais a Frelimo mandando em mim. Razões? Tenho e em abundância! Não confio mais em tratantes. Primeiro, o senhor Presidente diz que os jovens devem ter amor ao trabalho para deixarem de viver de mão estendida. Até aqui tudo bem. São palavras sábias. Mas onde é que está o tal emprego? A receita que lhe pedi de como enricar criando patos, o senhor me deu? Enrolou, enrolou...e nada. É como a cesta básica.
A minha vida tem que ser um território soberano. As leis são por mim emanadas e eu mesmo é que as vou cumprir.
Quero ser um cidadão livre. Não quero que ninguém me chame de vadio, mendigo e outros adjectivos depreciativos. Eu serei dono de mim mesmo.
Mas antes da minha emacipação, quero que o senhor Presidente me explique como é que a Frelimo, nos distritos, montou um aparelho repressivo que quase supera ao do colonialismo português? Afinal, quando a Frelimo chegou não disse que era do povo? Era ludíbrio não é? Por isso que agora apostou na revitalização do Governo tradicional para vos servir. São muitas as queixas nos distritos por causa dos régulos. Não querem nenhum partido político que não seja a Frelimo. Rasgam bandeiras, destroem tudo o que é da oposição e em contrapartida ganham uniformes novos. Têm lugar no palanque quando o Presidente visita os seus distritos. São contemplados sempre- e nunca devolvem- nos sete milhões.
Presidente, afinal onde é que se enquadra a figura da primeira dama no ordenamento jurídico moçambicano? É que parece competição. Quando o senhor está em Muidumbe, na presidência aberta, ela está em Mavago com o mesmo
objectivo. E isso tudo custa dinheiro! Não seria esse mesmo dinheiro que iria alavancar a distribuição da cesta básica?
Às vezes tenho a sensação de que o senhor Presidente está longe da realidade moçambicana ou simplesmente tem desprezo pelo povo que o elegeu. Como é que a Frelimo vai combater a mendicidade se ela mesma é que a criou? Não é fabricar mendigos quando excluiu o povo das mais soberanas decisões para o melhor funcionamento do País? Por exemplo, consultou ao povo se era a favor de a ponte que ostenta o nome de Armando Guebuza assim se pudesse chamar?
Consultou ao povo se queria que o sector dos transportes fosse entregue ao privado? Sabe, sua excelência, o quanto dói apanhar “chapa”?. Experimenta! Vai disfarçado para que lhe não dediquem aqueles salamaleques e há-de, por si, provar a estupidez do cobrador. Para além de mandar-lhe pagar ligações no próprio terminal, vai proferir palavras insultuosas cujas línguas modernas as não comportam.
Vejo que está no fim do seu último mandato mas, Presidente, é bom revisitar o seu manifesto eleitoral. Sei que não vai valer em nada. Mas em alguns minutos vai se aperceber do quão falsa a Frelimo foi.
DIÁRIO DE NOTÍCIAS – 24.08.2012

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