Canal de Opinião, por Noé Nhantumbo: NEGÓCIOS, NEGOCIATAS E O G-19
Estou
em crer pelos reflexos das tentativas havidas em mostrar uma face de
interlocutores interessados em contribuir para o desenvolvimento de um
ambiente democrático, que até se tentou. Mas infelizmente foi uma
tentativa insuficiente e de impacto nulo.
O modo como se cosem as
linhas e estão definidos os alinhamentos entre os membros do G-19 e
Moçambique, o hábito e tradição da relação Moçambique e o resto do
mundo, a correlação de forças entre as chancelarias ocidentais e o
gigante chinês no panorama africano fizeram recuar as intenções
democráticas de alguns parceiros internacionais ocidentais. No seio dos
G-19 alguns senão a maioria dos países agem por simpatia e não por
convicção democrática. Nunca tiveram a intenção de levar algo até as
suas últimas consequências.
A
maneira como procedem é quase sempre uma posição definida pelo carácter
dos interesses das corporações económicas e financeiras dos países do
que propriamente algo que tenha relação ou tenha a haver com conceitos
políticos do tipo democrático ou antidemocrático. A Portugal não
interessa objectivamente nada se Moçambique é mais ou menos democrático.
Se Angola é mais democrática. De Londres não receberemos mais elogios
se formos mais democráticos. O que interessa a esses países ou aos EUA é
como os seus interesses estratégicos ou assim definidos são protegidos e
assegurados. Aconteça o que acontecer os moçambicanos que se arranjem
mesmo que isso signifique matarem-se.
O que pode acontecer é vermos mais um moçambicano premiado por
coisa que não fez. Quando se deveria ver alguns governos como o de
Moçambique punidos pelo rumo que dão aos assuntos políticos de seus
países temos seus representantes regularmente premiados e elogiados. É
nefasto e perigoso para um país receber indevidamente prémios. Quem
premeia ou assim procede não tem boas intenções. A penetração e
influência que as corporações mineiras, petrolíferas, farmacêuticas e
militares possuem na manobra operacional das chancelarias ocidentais é a
razão de muitos dos prémios. Muitos dos posicionamentos incompletos e
medíocres da diplomacia dos nossos parceiros tem relação e explicação na
natureza dos seus interesses nos minerais moçambicanos. Toda aquela boa
vontade da Irlanda em cooperar com Moçambique não resulta de puro
altruísmo. As areias pesadas de Moma são um bom motivo e tudo o a
Kenmare fizer para influenciar seu governo no sentido de aplaudir o
governo do dia melhor será para as suas operações em Moma. Ou não é
assim? Os espanhóis não descobriram a bondade e a solidariedade em
Moçambique. Quanto já pago pelo camarão moçambicano? Todos sabem menos
os moçambicanos.
Numa posição relativamente de força sobretudo a
partir da altura em que o governo da Frelimo tinha garantias sólidas de
puder contar com o apoio financeiro chinês para substituir uma eventual
retirada de apoio ocidental ao Orçamento Geral do Estado, viu-se de modo
claro a implementação de uma política de “cegueira e surdez
estratégica” por parte dos órgãos de soberania moçambicanos. Reclamações
legítimas, baseadas nas leis do país foram sucessivamente ignoradas
pela Procuradoria Geral da República e pela Polícia nacional. Órgãos
eleitorais de que se esperava um posicionamento mais equilibrado e de
acordo com os interesses da promoção da democracia apresentaram-se
amarrados ou com a sua acção limitada pelos interesses do partido no
poder. Afinal quem nomeia acaba tendo a prerrogativa de demitir...
De
uma maneira clara todo o mundo ficou a entender que as organizações da
sociedade civil moçambicanas ou pelo menos a maioria das que se
manifestaram sobre as eleições recentes são fortemente tendenciosas. A
presença do partido no poder faz-se sentir por quase tudo o que é
organização. Até partidos políticos que se supunham livres da influência
da Frelimo acabaram entregando-se a esta ou pelo menos seus líderes
aplaudindo e beijando “as mãos de Judas”. Aconteceram coisas incríveis
jamais vistas no quadro do surgimento e desenvolvimento dos partidos
políticos em África. Yacub Sibindi vai entrar na história pelas mais
negativas razões e outros como o Miguel Mabote também. A venda pura e
simples, a sobreposição de valores como os materiais a qualquer
coerência ideológica tem se tornado claros em muitos dos nossos
compatriotas. Aquilo que jamais foi desvendado começa a tornar-se claro.
Se o MBS paga as dívidas de Sibindi não será que outros políticos viram
as suas dívidas pagas via Banco a mando de determinadas figuras do
partido no poder noutras ocasiões? Será que todos os rumores que
circulam na praça sobre uma alegada recepção de dinheiros “pesados” por
parte de determinados líderes políticos tem alguma base? Será que em
Moçambique se faz política por encomenda e que o protagonismo ganha-se a
custa de compra e venda de obediência?
Pode-se dizer muita coisa
mas algo não se pode deixar de dizer: em Moçambique passam-se muitas
coisas estranhas no domínio político.
Na memória do povo moçambicano
vai ficar a viva impressão de que o G-19 é movido por interesses
económico-financeiros e outras considerações estratégicas que não tem
relação alguma com a democracia neste país. O acesso ao porto e
aeroporto de Nacala tem mais importância do que a participação deste ou
daquele nas eleições. Convenientemente situada nos limites daquilo que é
considerado ingerência em assuntos internos de outro país assistiu-se a
uma derrocada de posições que aparentavam ter alguma força. Nem a força
dos dinheiros do OGE travou a estratégia de eliminação dos partidos
políticos do processo eleitoral.
Moçambique tem de passar mais meia
dezena de anos trabalhando para a sua democratização quando tudo
indicava que já havia dado esse passo.
Queremos ver o Observatório
Eleitoral observando actuação chinesa e a política de migração eleita
pelo governo que ele aparentemente apoia.
Moçambique também se pode
chamar de “Mozambiquisitão” tal é a facilidade com que descendentes ou
naturais do Paquistão obtém Bilhete de Identidade e passaportes
moçambicanos mesmo não sabendo falar português.
Tal é atenção ou
distracção dos governantes que as negociatas são de tal ordem que
ultrapassam qualquer coisa que se possa imaginar.
Mas como diz o ditado “nunca é tarde”.
(Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 25.11.2009