Editorial:
A
morte é inevitável e mais dias ou menos dias ela chegará
inoportunamente a cada um de nós. Embora para alguns chegue com alguma
violência e outras de forma natural. Mas, independentemente das
circunstâncias, ela é sempre dolorosa, principalmente para a família que
tem de aceitar essa forçada partida. Não importa o quão carrasco o
finado era, tampouco as acções ou crimes que cometeu perante a
sociedade. É preciso respeitar a sua memória e a dor dos seus
familiares.
A
morte da empresária Valentina Guebuza, a filha do ex-Presidente da
República, Armando Guebuza, gerou uma onda de boatos e teorias de
conspiração a escala nacional. Alguns moçambicanos viram na trágica
morte de Valentina Guebuza uma oportunidade para demonstrar do quão
insensíveis são. Não só pela forma como morreu, mas também pelo que ela
era: ter amealhado riqueza graças à influência do seu progenitor. Alguns
moçambicanos foram longe de mais ao fazerem piadas e gracinhas nas
redes sociais. Ninguém merece tamanha profanação. Foi, diga-se em abono
da verdade, uma demonstração mórbida da insensibilidade, para além de
falta de moral.
Mas
há também quem tenha ficado abalado. Não faltam mensagens de
condolências e demonstração de dor e angústia pela triste situação. Até
porque é uma vida que se foi, e há uma criança que vai crescer sabendo
de que o seu pai baleou mortalmente a sua mãe.
Entretanto,
no meio de tudo isso é importante que se diga que há também muita
hipocrisia. Quase todos os dias, dezenas de moçambicanos são mortos. Se
não é o conflito armado, o esquadrão da morte, é a criminalidade e a
fome provocada pela crise que hoje vivemos no país. Há poucos dias,
sucedeu-se uma tragédia na província de Tete na qual perto de 100
pessoas perderam a vida, porém, não assistimos ao mesmo avalanche de
mensagens de condolências e homenagens. Milhares de moçambicanos passam
por dramáticas privações e ninguém se comove.
Uma
dezena de mulheres são violadas ou assassinadas pelos seus maridos
todos anos, mas não assistimos a esse teatro de comoção, igual a que nos
é mostrado em relação à morte da filha de um ex-Presidente da
República. Certamente, ela nunca teve de passar pelo que passa(ra)m
centenas de mulheres, que têm de sobreviver a todo. Nunca sequer teve de
ficar horas a fio numa fila de um hospital público. Provavelmente, terá
sido agredida mortalmente por, de forma deliberada, ignorar o seu papel
de mulher, pois acredita que o seu poder financeiro lhe dava o direito
de subjugar o seu cônjuge.
Importa
frisar que não estamos a afirmar que a morte de Valentina Guebuza foi
merecida. Nenhuma morte é merecida. Não estamos a favor da violência
contra a mulher. Só uma sociedade, indivíduos sem emoção nenhuma é capaz
de afirmar isso. O que queremos dizer é que ela foi mais uma vítima,
como outros moçambicanos o são todos os dias.
@VERDADE - 16.12.2016
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