Denomina-se cessar-fogo, ou trégua, a paralisação temporária dos ataques durante um conflito armado. Os lados envolvidos nas operações de guerra concordam em suspender os ataques durante um período limitado de tempo em determinado território, sendo que o cessar-fogo ocorre de forma não formalizada, e costuma ser o passo anterior à assinatura de um armistício ou tratado de paz.
A diferença entre o armistício e o cessar-fogo é que o primeiro constitui um acordo formal no qual as partes envolvidas no conflito concordam em parar de lutar. Um dos exemplos de cessar-fogo ocorridos na história da humanidade é a “Trégua de Natal”, na noite de 24 de Dezembro de 1914.
Para Madhav Joshi e J. Michael Quinn (cientistas políticos e pesquisadores sobre acordos de paz), as abordagens teóricas dominantes para as negociações de guerra civil no campo da ciência política têm procurado explicar tanto a escassez quanto as altas taxas de fracasso de acordos negociados em conflitos civis.
Este padrão histórico, no entanto, mudou fundamentalmente nas últimas duas décadas, uma vez que as mudanças nas normas e leis internacionais, bem como o aumento da prevalência e da competência dos profissionais da construção da paz, exigem agora que os actores de conflito tenham um maior compromisso em negociações e na execução de acordos .
Enquanto os actores das guerras entre Estados buscam evitar a responsabilidade, os actores de uma guerra civil parecem abraçar as oportunidades que essas novas dinâmicas criam para alcançar reformas de ampla base em diversas áreas da política e do governo.
Pesquisas em ciência política mostram que o cessar-fogo muda mais do que apenas condições no terreno: eles alteram a forma como os participantes de uma guerra pesam os benefícios de lutar em vez de dialogar. O cessar-fogo pode criar algo como um ciclo virtuoso, que pode ser benéfico para a paz. Este ciclo nem sempre é tão visível ou politicamente urgente como a questão de quem está a lançar ataques diariamente, mas ao longo do tempo, pode deslocar o cálculo dos participantes de forma a construir condições para a paz.
Pagne Fortna, professora da Universidade de Columbia e pesquisadora em negociações de paz, diz que acordos "fragmentários", embora modestos e raramente bem sucedidos, podem eventualmente alinhar os incentivos de grupos cujas demandas no momento são irreconciliáveis. Mas há um outro lado, às vezes, o cessar-fogo pode criar um ciclo vicioso em vez de um virtuoso. A desconfiança pode se aprofundar, as partes podem se afastar e os incentivos podem mudar para tornar a paz ainda menos atractiva.
Em 2015, Madhav Joshi e J. Michael Quinn, publicaram um estudo examinando 196 cessar-fogos e acordos de paz de 1975 a 2011. Eles descobriram algo surpreendente: um dos melhores elementos do sucesso de um acordo de paz é simplesmente se as partes tinham acordos prévios, mesmo se aqueles cessar-fogo anteriores falharam. Nem mesmo, a duração de uma guerra ou sua intensidade pode prever de forma confiável o resultado de um acordo de paz. Nem a pobreza nem a diversidade étnica dos combatentes. "As falhas preparam o caminho para melhores acordos no caminho!" - Quinn.
Com o tempo, os participantes vêem o cessar-fogo como menos arriscado, pois, se todos os lados saírem a sentir que quebraram o mesmo, eles podem surgir mais dispostos a fazer um outro acordo. Por exemplo, na Jugoslávia, onde houve 91 tréguas mediadas ou cessar-fogos de 1989 a 2000. Desses, 35 por cento durou menos de uma semana e 13 por cento durou exactamente uma semana. Embora cada um pareça ser um fracasso catastrófico, culminaram nos Acordos de Dayton de 1995, que terminaram a guerra da Bósnia, que era um subconjunto do conflito maior, bem como acordos posteriores.
Em Moçambique vamos no segundo cessar-fogo no espaço de uma semana, é algo que se deve encorajar, sob o ponto de vista que possa criar mais confiança entre os actores envolvidos, mas a sua duração não deve tornar-se rotina, sob o risco de se viver uma paz intermitente. Deve quanto a mim, ser a oportunidade para que de uma vez por todas se chegue a paz definitiva e sustentável.
Para concluir, gostava apenas de ressalvar as palavras do Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, na sua mensagem inaugural (01.01.17):
‘’(...) Como ajudar os milhões de seres humanos vítimas de conflitos e que sofrem enormemente em guerras que parecem não ter fim?...Nestas guerras não há vencedores; todos perdem. Gastam-se biliões de dólares na destruição de sociedades e economias, alimentando ciclos de desconfiança e medo que podem perpetuar-se por gerações. Vastas regiões do planeta estão inteiramente desestabilizadas e um novo fenómeno de terrorismo global ameaça a todos...Façamos da Paz a nossa prioridade. Façamos de 2017 um ano em que todos – cidadãos, governos, dirigentes – procurem superar as suas diferenças.
Seja através da solidariedade e da compaixão nas nossas vidas quotidianas, seja através do diálogo e do respeito, independentemente das divergências políticas. Seja por via de um cessar-fogo num campo de batalha ou mediante entendimentos conseguidos à mesa de negociações para obter soluções políticas. A procura do bem supremo da Paz deve ser o nosso objectivo e o nosso princípio orientador.
A dignidade e a esperança, o progresso e a prosperidade – enfim tudo o que valorizamos como família humana – depende da Paz. Mas a Paz depende de nós.''
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Referências:
1.The New York Times - The Surprising Science of Cease-Fires: Even Failures Can Help Peace (03.01.2017)
2.Is the Sum Greater than the Parts? The Terms of Civil War Peace Agreements and the Commitment Problem Revisited - Research Report – January 2015, Madhav Joshi e J. Michael Quinn (03.01.2017)
3.Nações Unidas - António Guterres faz apelo à paz (02.01.2017)
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