No estudo apresentado hoje, no 41º Conselho Consultivo do Banco de Moçambique, uma das preocupações da instituição é a fraqueza no mecanismo de transmissão da política monetária, isto é, o facto de as medidas que toma terem pouco impacto nos resultados que se pretendem. É o caso das taxas de juro a retalho, que não são necessariamente movidas pelas taxas de referência do Banco de Moçambique. Os desafios que se colocam neste capítulo são inúmeros, mas as discussões sobre o assunto só saem hoje. Tudo o que se sabe é que o Banco Central está em busca de um mecanismo de disciplinar as taxas de juro a retalho.
As fragilidades na relação entre as taxas de juro de referência (também designadas por taxas directoras) já vem sendo reportadas há vários anos. É que nunca há impacto visível no facto de o Banco Central mexer nas taxas de referência, com a intenção de sinalizar os bancos comerciais a seguirem o mesmo caminho para com os clientes.
Esta questão é já preocupação do Banco de Moçambique. Primeiro foi em Dezembro do ano passado, no encerramento do ano económico, que o Governador, Rogério Zandamela, afirmou que “visando reforçar a transparência no mecanismo de formação das taxas de juro que os bancos praticam com a sua clientela, o Banco de Moçambique está a negociar, com a Associação Moçambicana de Bancos, o estabelecimento de um indexante, que deverá ser único para todo o sistema bancário e que reflicta as condições de mercado”.
O problema é reflectido no estudo intitulado “Desafios da Modernização do Regime de Política Monetária: O Caso de Moçambique”, que junta quadros do Banco de Moçambique desde quarta-feira passada até hoje, na cidade da Matola.
Para melhor percepção da dimensão do assunto, importa dizer que o Banco Central realiza operações de crédito, de depósitos entre outras, com os bancos comerciais, através das taxas de juro de referência. Por várias vezes, nos últimos anos, as taxas de referência reduziram até atingir mínimos históricos. Com a medida, o Banco de Moçambique pretendia criar espaço para que os bancos comerciais baixassem o preço do dinheiro para com os clientes. Mas o resultado não foi satisfatório. Moçambique continuou (e continua) a registar as taxas de juro do sistema financeiro mais altas da África Austral, segundo um estudo realizado há alguns anos pelo próprio Banco Central, facto muito contestado não só pelo Banco de Moçambique, como pelo sector privado.
Os bancos comerciais, entretanto, alegam que a taxa de juro da Facilidade Permanente de Cedência de Liquidez – a que os bancos comerciais pagam pelo crédito contraído no Banco de Moçambique – não é o principal determinante dos custos a que incorrem nas suas operações, daí a inflexibilidade no ajustamento das taxas de juro a retalho em função daquela.
Economistas, entre eles o actual vice-ministro da Indústria e Comércio, Ragendra de Sousa, sempre defenderam que as taxas de juro a retalho são determinadas pelos grandes depositantes, que negoceiam com a banca o que preferem ganhar para depositarem lá os seus recursos. O fenómeno acaba por nivelar também por cima as taxas de juro dos empréstimos.
Só para ter uma ideia, no início de 2011, a Facilidade Permanente de Cedência de Liquidez estava na casa dos 16.5% e foi descendo até perto de 7%, em meados de 2015. Mas nesse período, as taxas de juro praticadas pela banca com clientes manteve-se ao redor dos 21%, por vezes com redução “tímida” para 19%.
Esta situação levou o novo governador a procurar formas de uniformizar as taxas de juro a retalho (cuja negociação com a Associação Moçambicana de Bancos está em curso).
Em Dezembro de 2016, Rogério Zandamela explicou que será num novo indexante (em negociação com a Associação Moçambicana de Bancos), que os bancos formarão as suas taxas das operações de crédito para as diversas operações com os seus clientes, devendo os respectivos spreads (diferença entre as taxas de depósitos e as de empréstimos) ser amplamente divulgados, permitindo deste modo, oferecer aos clientes do sistema bancário instrumentos transparentes de negociação da taxa final de cada empréstimo a contratar.
“Esperamos que esta negociação com a Associação Moçambicana de Bancos esteja concluída em breve e a mesma contemplará a cessação do mecanismo actual de indexação das taxas de juro do crédito bancário à taxa mais alta do mercado monetário interbancário (Facilidade Permanente de Cedência de Liquidez do Banco de Moçambique), devendo esta assumir o seu papel de taxa penalizadora das operações que se realizam no mercado monetário interbancário”, disse na altura o governador do Banco de Moçambique.
No estudo a ser discutido, o Banco de Moçambique apresenta como preocupação a ausência de um indexante uniforme de taxa de juro para o mercado a retalho, mais concretamente a utilização da Facilidade Permanente de Cedência de Liquidez por algumas instituições de crédito, apesar desta não reflectir as condições de liquidez do mercado; e a existência de prime rates (taxas de juro diferenciadas). A partir daqui, os grandes desafios, neste domínio, incluem “desenvolver um mecanismo de compilação das expectativas de inflação e alargar o leque de indicadores dianteiros e coincidentes que permitam ao Banco de Moçambique calibrar as suas medidas em tempo útil, tendo em conta o desempenho do sector real; reforçar o mecanismo de transmissão podendo adoptar um indexante uniforme de taxa de juro para o mercado a retalho”.
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