sábado, 7 de janeiro de 2017

Os três momentos mais polémicos na vida de Soares




Quando Soares também não cancelou uma visita de Estado

António Costa não vai cancelar a visita à Índia para estar no funeral de Mário Soares. Em 1985, o então Presidente actuou de forma idêntica.



Tenente-coronel Jan Breytenbach


ele foi, também, o fundador e primeiro comandante do 1Comando de Reconhecimento (1 recce) que foi as primeiras forças especiais Sul-Africanas – precursor da actual Brigada das Forças Especiais do SANDF a Força de Defesa Nacional Sul-Africana equivalente ao SAS britânico (Serviço Aéreo Especial).


Interior do livro “Eden’s Exiles – One Soldier’s Fight For Paradise”


O delito gravíssimo e de cunho hediondo deste tráfico, é ainda maior, por ser realizado aquando Angola se encontrava sob um pantanal de sangue por uma violenta e terrificante “guerra fratricida”. Esta abominável corja de criminosos sem escrúpulos de moral contribuiram para o prolongamento da guerra, convertendo a morte e os sacrifícios de um povo, como benefício para a prática do tráfico das riquezas de Angola.


“CONFIDENCIAL”, MÁRIO SOARES OFEREÇEU MOÇAMBIQUE À FRELIMO:


Estes documentos fazem parte dos arquivos secretos dos Estados Unidos, da República Democrática Alemã e da União Soviética, sobre os acontecimentos que marcaram a África Austral durante a década de 70. Todos estes papéis foram agora finalmente desclassificados, encontrando-se ao dispor dos investigadores nos National Security Archives, em Washington.


Neles se revelam alguns dos aspectos mais dramáticos da história da “descolonização portuguesa” e das guerras civis que se seguiram nas antigas “colónias”. Demonstram sobretudo algumas das atitudes assumidas pelos principais protagonistas políticos que, na altura, conduziam a política externa dos seus países. Documento do departamento de Estado norte-americano sobre a descolonização de Moçambique, classificado como “secreto”. Nele se dá conta da opinião de Mário Soares, favorável à entrega imediata da colónia à Frelimo. Sem dar qualquer relevância à possível falta de representatividade do movimento marxista moçambicano.


Este primeiro documento cita a opinião do então ministro dos Negócios Estrangeiros, Mário Soares, sobre a descolonização de Moçambique: “A transferência imediata do poder para a Frelimo é a única saída para Portugal, independentemente de a Frelimo ser ou não realmente representativa da maioria da população”. Esta verdadeira entrega sem discussões do país à Frente de Libertação de Moçambique justificava-se, segundo o ex-Presidente da República, como a única forma de terminar definitivamente com a guerra.


De acordo com os norte-americanos, Soares entendia que se Portugal não fizesse esta outorga do poder “as tropas portuguesas iriam recusar-se a combater, o que resultaria num Moçambique independente governado pela Frelimo mas hostil a Portugal”.


Ao transferir o poder para os homens de Samora Machel, Mário Soares explicava desta forma “Portugal manterá a capacidade de exercer influência sobre o Governo de Moçambique”. O documento confidencial, intitulado “A escolha como Soares a vê”, explica mais adiante que o ministro dos Negócios Estrangeiros do I Governo Provisório acreditava que se Portugal aceitasse incondicionalmente “a Frelimo como condutora do processo de independência, Moçambique irá manter no futuro ligações linguísticas, culturais e económicas com Portugal e desejará manter permanentemente a presença portuguesa no território”.


30 de Maio de 1974: Telex do cônsul norte-americano em Luanda, relatando um encontro ocorrido a 24 de Maio entre António Almeida Santos, ministro da Coordenação Interterritorial, o cônsul americano em Luanda, Everett Ellis Briggs, e o seu colega italiano.


O actual presidente da Assembleia da República dizia que não havia outro caminho para Angola e Moçambique que não fosse “a imediata autodeterminação”. Segundo este documento, Almeida Santos afirmou no encontro com o cônsul norte-americano, Everett Briggs, que “o Governo provisório angolano não deverá depender de Lisboa: é impensável que Lisboa vá continuar a dirigir os assuntos angolanos e moçambicanos. A autonomia será conduzida para que o imediato exercício da autodeterminação possa ser genuíno”.


À altura, o então ministro da Coordenação Interterritorial ainda defendia que “a autodeterminação incluirá as opções de federação com Portugal ou de independência total”. Uma ideia que foi, como se sabe, rapidamente ultrapassada. Segundo o que relata Everett Briggs, mais tarde embaixador dos Estados Unidos em Lisboa, o Governo português mostrava-se claramente optimista no apoio de Angola “à manutenção de laços económicos e culturais com Portugal”, que deveria preservar também “responsabilidades partilhadas na área da Defesa durante algum tempo”.


Na reunião, que durou apenas “alguns minutos”, Almeida Santos teve tempo para defender ainda que “Cabinda terá de permanecer como parte integrante de Angola. Se Cabinda tivesse uma relação separada com Portugal, o resto de Angola seria vulnerável à desintegração.


Quando o ministro hoje se encontrar com uma delegação de Cabinda, tenciona abrir as conversações com uma declaração anti-separatista”. Almeida Santos referiu depois que “os EUA deveriam estar satisfeitos com o facto de Portugal ter finalmente aceite o princípio da autodeterminação”. Quanto à possibilidade de Washington oferecer assistência económica a Angola e Moçambique durante a “transição”, o responsável norte-americano “não deu qualquer tipo de encorajamento” aos pedidos do socialista português.


2 de Agosto de 1974: Documento classificado do departamento de Estado com o título “Descolonização em Angola: o passo acelera”. Nele se refere que “o conceito de Spínola de uma federação lusitana” se tinha tornado obsoleto. A fonte deste relatório secreto é um membro do Movimento das Forças Armadas, coronel Silva Cardoso, que revelou “os planos do MFA para realizar a independência antecipada de Angola sem a realização de um referendo”.


No texto da funcionária norte-americana, Marianne L. Cook, salienta-se que “o processo de descolonização em Angola foi acelerado com o novo Governo Provisório português dominado pelo MFA”, tornando obsoleto “o conceito de Spínola de uma Federação Lusitana”.


Já nesta data os norte-americanos reconhecem que, “apesar de Angola dever ser o último dos três territórios a obter a independência, vai consegui-la sem a realização de um referendo e muito antes do tempo previsto” por Portugal.

A fonte principal deste documento foi o coronel António da Silva Cardoso, membro do MFA enviado para Angola numa “comissão de averiguação” a recentes tumultos entretanto verificados. O relatório norte-americano afirma, preto-no-branco, que Silva Cardoso revelou “ao nosso cônsulo-geral em Luanda os planos do MFA para realizar uma independência antecipada sem realização, de um referendo”.


Lembre-se que a politica oficial do Governo na altura, tambem defendida por António de Spínola, que era ainda Presidente da República , afirmava que a independência de Angola só deveria acontecer depois da realização de uma consulta popular” aos povos a autodeterminar”.


O plano do MFA para a independência de Angola revelado por Silva Cardoso aos americanos, dependia de “um acordo prévio entre os três movimentos de libertação, as comunidades brancas e mestiças”, no sentido de formar um “ Governo provisório de coligação” semelhante ao que na altura existia em Portugal. As eleições democráticas seriam realizadas só depois da independência. Esta coligação impossível deveria incluir as três fracções do MPLA que na altura disputavam o poder, respectivamente lideradas por Agostinho Neto, Daniel Chipenda e pelo chamado, ”grupo de Pinto de Andradre”, englobando também a FNLA e a UNITA.


O MFA esperava que um, ”MPLA unificado” – preferivelmente sob a liderança do moderado Pinto de Andradre – poderia conseguir governar uma “ Angola multi-racial”. Uma ilusão que veio a sair cara aos antigos “colonos portugueses” e ao povo Angolano em geral. Aparentemente, as conversas travadas entre os norte-americanos e o representante do MFA visavam obter o apoio de Washington para esta causa portuguesa.


Lisboa pretendia que os EUA viessem a pressionar a FNLA de Holden Roberto para que aceitasse participar no Governo de coligação. Lisboa confiava igualmente nos “bons ofícios” de Washington para assegurar o apoio de presidente zairense, Mobutu Sese Seko, ao plano de Portugal. Silva Cardoso revelou ainda “a sua preocupação com a eventual tomada de Cabinda por Mobutu” – o enclave angolano era considerado pelos portugueses como “ militar mente indefensável “.


Do ponto de vista do departamento Estado norte-americano, eram vários os problemas que poderiam inviabilizar este plano do MFA. Em primeiro lugar, “a atitude Holden Roberto”, que resistia à unificação dos movimentos rebeldes. Depois, “ a posição de Mobutu”, que pretendia assegurar um maior acesso ao mar e ao petróleo, só possível mediante a conquista de Cabinda. Em clara oposição mantinham-se também os colonos portugueses, “alguns dos quais mostrando-se dispostos a inviabilizar o projecto de Lisboa”.


Finalmente, e mais importante, o plano do MFA exigia que ”o Governo português tivesse capacidade de manter forças militares em Angola pelo menos durante algum tempo depois da independência”.


8 de Maio de 1974: Documento do Departamento da Defesa dos Estados Unidos, mais precisamente da Defense Intelligence Agency os serviços de informações militares. Aqui se relata a visita de Costa Gomes a Angola em 5 de Maio de 74. Comentando a visita de Costa Gomes, na altura membro da Junta de Salvação Nacional e CEMGFA, efectuada em 5 de Maio a Angola, os norte-americanos referem que o general “ prometeu que os guerrilheiros presos seriam libertados em troca da cessação imediata de hostilidades”.


Este facto conhecido é, no entanto, interpretado pelos EUA como sendo “ essencialmente motivado por questões de política interna” em Lisboa. Com esta acção, diz o documento, Costa Gomes esperava vir a “diminuir as pressões em Portugal por parte dos mais esquerdistas que defendem a independência imediata, negando também qualquer estatuto especial aos movimentos de libertação em futuras negociações”. Curiosamente, nesta altura, Costa Gomes surge como um travão aos elementos do MFA mais radicais empenhados numa” descolonização instantânea”. Uma posição que o próprio general irá deixar cair meses mais tarde, depois dos acontecimentos do 28 de Setembro, quando assume a presidência da República com o apoio da Comissão Coordenadora do MFA.


24 de Dezembro de 1974: Telex do cônsul norte-americano em Luanda sobre “a indisciplina das tropas portuguesas no território”. Meses depois do golpe de 25 de Abril, o estado das tropas portuguesas em Angola aproximava-se da anarquia, as ordens recebidas eram de não protecção, nem ajuda à população branca. MFA em Angola estava nesta altura a organizar equipas de oficiais, sargentos e praças para efectuar visitas às unidades que procuravam restabelecer o “sentido da disciplina e da responsabilidade”. As “fontes próximas” dos Estados Unidos afirmavam que “o Exercito está dividido entre os que querem partir imediatamente para a metrópole, independentemente das consequências, e os que sentem que têm a obrigação de assegurar a segurança e a defesa dos interesses dos seus compatriotas durante este período difícil”.


O documento não pode ser mais claro sobre o estado das forças portuguesas em Angola. “Considerando o aspecto das tropas e a sua recente falta de vontade para combater, o moral é provavelmente mais baixo do que o Alto – Comando português admite”, dizem os americanos.


De 28 a 31 de Outubro de 1975 recebeu em Lisboa Nicolae Ceausescu “o Facínora Ditador da Romênia Socialista” a quem admirava e se declarou amigo chegando apresentar como modelo, a seguir, para Portugal. E a exemplo do seu amigo, Nicolae Ceauşescu, também, pretendeu instituir o culto da sua pessoa para se converter numa figura popular para domínio do poder, e pretendeu, igualmente, colocar a “família” nos comandos estatais do País.


A 25 de Dezembro de 1989,


Nicolae Ceaușescu Presidente da Romênia Socialista, e Elena Ceaușescu Vice-Primeira-Ministra da Romênia Socialista, foram executados por crimes contra o povo romeno.


“O GANGSTER DO CRIME ORGANIZADO”


A Propensão ao crime fez dele “O homem preferido pelos traficantes de armas”


Deu livre curso à sua ganância na esteira da Revolução de todos os Crimes: Explorou povos; Contribuiu fortemente para a destruição da Nação e aos assassinatos dos povos nas províncias ultramarinas portuguesas;


Sem ética moral nem constrangimento explorou os dramas, o luto e a fuga dos portugueses à guerra em Angola, convertendo os crimes dolosos e os crimes contra a humanidade em benefício pessoal para se enriquecer;

Contrabandeou dinheiro sangue/CIA; Traficou diamantes e marfim de Angola;


Destruiu parte do Património de Portugal, durante o tempo em que comunistas e socialistas procediam à Destruição e ao Saqueio da Nação extinguiu a Companhia Portuguesa de Transportes Marítimos (CTM), em simultâneo a Companhia Colonial de Navegação (CCN) e a Companhia Nacional de Navegação (CNN), no conjunto, considerada uma das maiores e melhores Companhias de Navegação da Europa;

Corrompeu a Nação; Instituiu o Crime de Corrupção Activa e Passiva; Desrespeitou Leis; Ofendeu publicamente um Magistrado da Justiça; Ofendeu publicamente um Oficial da Autoridade (GNR) quando este agente cumpria o seu dever; E ao longo dos anos aproveitou-se de todos os portugueses contribuintes.






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João Soares fala com o pai no almoço dos 90 anos de Mário Soares
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João Soares fala com o pai no almoço dos 90 anos de Mário Soares Nuno Ferreira Santos
Deveria António Costa, primeiro-ministro e secretário-geral do PS cancelar a visita de Estado à Índia que começou neste sábado e dura até sexta-feira? A pergunta tem sido feita a vários protagonistas políticos desde que se soube da morte de Mário Soares. Costa já disse que não o fará, tendo o apoio do ministro dos Negócios Estrangeiros.


Augusto Santos Silva disse mesmo que, se Mário Soares pudesse saber que o primeiro-ministro não tinha cancelado a visita, “ficaria contente porque sempre pôs o interesse do Estado e do povo português acima de quaisquer outros”.
O próprio Mário Soares fez essa opção em circunstâncias absolutamente dramáticas, em 1985, quando estava a partir para uma visita de Estado à Hungria e à Holanda. Soube naquele momento que o seu filho, João Soares, tivera um desastre de avião quando partia da Jamba (quartel-general de Savimbi em Angola) e que estava num hospital da África do Sul às portas da morte. Manteve a viagem. Maria Barroso partiu para a África do Sul.
Joaquim Vieira, na biografia que escreveu sobre o antigo primeiro-ministro e Presidente da República (Mário Soares: Uma Vida, Esfera dos Livros, 2013), relata que, na Hungria, o então chefe de Estado “desdobrava-se entre as funções de Estado e o drama familiar”, acompanhado o estado de saúde do filho através de contactos telefónicos com Maria Barroso. Só depois do regresso da visita à Holanda partiu para a África do Sul para visitar o filho, que, entretanto, tinha tido uma melhoria do seu estado clínico.

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A vida de Soares foi rica em batalhas políticas e também em decisões e actos polémicos. O PÚBLICO elegeu três dos mais controversos do pós 25 de Abril de 1974 e que marcaram a vida fundador do PS.




luis vasconcelos
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LUIS VASCONCELOS

A vida de Mário Soares marcou a vida de Portugal. Uma vida rica em batalhas políticas e também em decisões e actos polémicos. O PÚBLICO elegeu três dos mais controversos do pós 25 de Abril de 1974 e que marcaram a vida fundador do PS. Decisões que lhe valeram inimigos para sempre; que quase “mataram” o soarismo e que terminou com sua mais pesada derrota de sempre. Três palavras: descolonização, Macau, Alegre. 




1. Da descolonização “pura e simples” ao ódio dos retornados

A 13 de Maio de 1974, Mário Soares, numa entrevista à revista norte-americanaNewsweek deixa clara a sua posição sobre o caminho a seguir nas ainda colónias portuguesas no ultramar: “Devemos começar a trabalhar imediatamente para um acordo de cessar-fogo com os guerrilheiros. O general Spínola [então líder da Junta de Salvação Nacional e que dois dias depois se tornaria Presidente da República] conhece a nossa posição: é a independência pura e simples.”
A 16 de Maio é nomeado pela Junta de Salvação Nacional o I Governo provisório do pós 25 de Abril, chefiado por Adelino da Palma Carlos. Soares é ministro dos Negócios Estrangeiros e começa de imediato a ter encontros com os movimentos de guerrilheiros com vista a um cessar-fogo e ao início do processo de descolonização e independência.
A pressa de Mário Soares para conseguir a “independência pura e simples” valem-lhe várias críticas: que não cabia a um governo provisório, mas sim ao que viesse a ser eleito pelo voto, tratar de algo tão importante; que se deveriam realizar referendos nos diversos países para os cidadãos decidirem o seu futuro; que havia outros processos de descolonização para além da independência “pura e simples”. 
A 8 de Junho de 1974 os oficiais do MFA decidiram o cessar-fogo imediato no ultramar. Estava definitivamente aberta a porta para a independência das antigas colónias portuguesas. Cerca de três meses depois (10 de Setembro de 1974) Portugal e o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) ratificam o acordo para a independência da Guiné-Bissau. Este país é primeira colónia portuguesa a conquistar a independência. 
No Alvor, Algarve, entre 10 e 15 de Janeiro de 1975, realiza-se uma cimeira para debater a independência de Angola. O Governo português (III Governo provisório, com Vasco Gonçalves primeiro-ministro e Mário Soares ministro dos Negócios Estrangeiros) e os três principais movimentos de libertação angolanos – Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) e Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) – chegam a um acordo para independência do país e ficam estabelecidos os parâmetros para a partilha do poder. Fica acordado o dia 11 de Novembro desse ano como a data da independência. Porém, pouco depois da assinatura do documento, os movimentos iniciam um conflito armado pelo controlo do país. Começava a guerra civil em Angola. O mesmo aconteceu sucessivamente nas restantes colónias. As críticas a Soares subiram de tom.
Desde meados de 1974 que alguns colonos estavam a regressar à chamada "metrópole", mas é na Primavera/Verão de 1975 que, com as guerras civis cada vez mais violentas nas ex-colónias, fogem para Portugal milhares de colonos. Cerca de 600 mil pessoas, a maior parte de Angola e Moçambique. São os chamados "retornados". Muitos trouxeram apenas a roupa que tinham no corpo. Outros tiveram tempo para encaixotar e despachar alguns dos seus bens, que se acumularam junto ao Padrão dos Descobrimentos, em Lisboa. Uma imagem que se tornou icónica no processo da descolonização.
Muitos destes retornados apontam o dedo a Mário Soares, que, desde 25 de Abril de 1975, é primeiro-ministro do I Governo constitucional. Acusam-no de ser o “pai” de uma “descolonização selvagem”, o culpado de tudo o que perderam, de ter “vendido as colónias a Moscovo”, de fazer a descolonização por “interesses pessoais”. Ainda hoje se escrevem em blogues e sites na Internet textos de puro ódio a Mário Soares devido à descolonização de 1974/75.
Soares sempre assumiu o seu papel no processo e embora tenha afirmado várias vezes que foi “a descolonização possível”, nunca mostrou algum arrependimento pelo seu desempenho político. “Enquanto estive [no exílio] em Paris, tinha tido muitos contactos com os africanos que lá iam, que me iam cumprimentar e diziam: ‘O que é que se vai passar, como é que se vai passar?’ A minha primeira ideia era descolonizar. (…) Sem descolonização não se passaria a nada, porque a guerra continuaria. E eu fui, de facto, a primeira pessoa que chegou a Angola e disse: ‘Vocês vão ser independentes!’ Já era ministro dos Negócios Estrangeiros, diga-se”, afirma num entrevista ao Deutsche Welle, canal público de informação da Alemanha, em 2014.
Na mesma entrevista, questionado sobre as críticas dos retornados, Soares, polémico como sempre, diz: “Os retornados nunca perceberam que foi a sorte grande que lhes saiu. Nunca perceberam isso. Vieram para Portugal em condições difíceis, é verdade. Porque se assustaram e fugiram. Chegaram a trazer automóveis; outros nem isso, não trouxeram nada. E nós arranjámos uma solução para lhes dar tudo. Demos-lhe dinheiro, casas… Fomos nós! Porque logo a seguir fui presidente do Governo e, por isso, dirigia essa questão.”
O principal fundador do PS diz-se ainda “muito orgulhoso do que se fez com a descolonização”. “Tenho muita honra em ter participado nisso activamente.” 

2. Macau, o maior abalo político do soarismo

Ficou conhecido como o “caso do fax de Macau” ou “caso Emaudio” e foi o episódio que mais beliscou a carreira política de Mário Soares.
O caso remonta a factos ocorridos entre 1988 e 1989, cumpria Soares o seu primeiro mandato de Presidente da República. Contado de uma forma muito resumida: Em Abril de 1988, menos de um ano depois de Carlos Melancia ser empossado governador de Macau por Mário Soares, a empresa alemã Weidleplan manifestou interesse em ser consultora na construção do aeroporto local. No entanto, em Fevereiro do ano seguinte, Luís Vasconcelos, membro do Governo macaense, concessionou o contrato à Aeroportos de Paris.
Menos de um mês depois, a Weidleplan enviou ao governador de Macau um fax pedindo-lhe que devolvesse o dinheiro (50 mil contos, hoje cerca de 250 mil euros) alegadamente pago para garantir a vitória no concurso. Este fax acabaria por ser divulgado pelo semanário O Independente e a polémica que se seguiu acabaria por levar à demissão do governador e seguir para os tribunais.
Esses 50 mil contos serviriam para financiar a actividade da Emaudio, uma empresa pensada por Soares e gerida por socialistas da sua total confiança, que tinha como objectivo criar um grande grupo de comunicação social que serviria de base de apoio ao PS.
O fax foi entregue a O Independente por Rui Mateus, amigo e conselheiro de Mario Soares e um dos administradores da Emaudio, que nessa altura já andava de candeias às avessas com Soares devido às contas da empresa. Mateus sempre afirmou que Soares sabia de tudo desde o primeiro minuto. O ex-presidente da República sempre negou ter conhecimento do alegado suborno, garantindo que só soube do caso e do fax quando ele foi publicado pelo O Independente.
Soares e Mateus cortaram relações e mais tarde (1996, já nos últimos meses do segundo mandato de Soares em Belém) o homem da Emaudio escreve o livro “Contos proibidos, memória de um PS desconhecido”, em que conta a sua história dos financiamentos do PS de Soares, com detalhe para o caso de Macau, em que mais uma envolve directamente o principal fundador do PS.
O assunto foi muito incómodo para Soares e para os socialistas que sempre fugiram a falar dele. Mas 20 anos depois da ocorrência dos factos, Almeida Santos, antigo presidente do PS que também esteve na Emaudio, acaba por desmentir Soares numa entrevista aoExpresso. “Mário Soares teve conhecimento prévio do Fax de Macau. Era uma situação complicada, punha problemas ao PS – ele tinha de ter conhecimento. Mas não tem culpas nisso. Eu sabia que o PS não tinha responsabilidades nisso, e Mário Soares muito menos”, afirmou.
Na sequência de um inquérito realizado em 1991, o Ministério Público acusou Melancia de ter recebido 50 mil contos de uma empresa alemã para influenciar um concurso relacionado com a construção do aeroporto de Macau, o que lhe valeu a acusação por corrupção passiva.
O processo Melancia andou pelos tribunais, com recursos atrás de recursos, e só em Outubro de 2002 foi dado por encerrado pela Justiça. Melancia saiu absolvido, não ficando nunca provado que tenha sido subornado ou objecto de qualquer promessa de suborno.

3. Soares/Alegre: a maior derrota na última batalha

As batalhas políticas de Soares, dentro e fora do PS, são infindáveis. São a sua vida e custaram-lhe mesmo alguns amigos e muitos inimigos. Foi marcante para o PS o seu desentendimento com o amigo Salgado Zenha, outro fundador do partido, que, em 1980, convenceu o PS a apoiar a recandidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República contra a vontade de Soares e que levou à sua demissão como secretário-geral socialista. Eanes ganhou, Soares voltou a liderar o partido e Zenha acabou expulso do PS por vontade do então líder do PS.
Inesperadamente, 26 anos depois, Soares teria outra batalha ainda mais dura com outro camarada de partido e amigo de longa data: Manuel Alegre. Ambos se candidataram à Presidência da República e apesar de Soares ter o apoio do PS, Alegre conseguiu ter mais 350 mil votos. Cavaco Silva foi eleito Presidente com 50,54% dos votos. Foi a última batalha política de Soares e a mais pesadas derrota.
A candidatura terá começado a nascer a 7 de Novembro de 2004. Mais de 2000 amigos de Soares reuniram-se com ele na FIL para festejarem o seu 80.º aniversário. Soares tinha uma surpresa reserva para esse dia: com uma só palavra (“basta”) anunciava o fim da sua carreira política activa. Porém, apesar do “basta”, muitos dos presentes alimentavam já a ideia de voltar a ver Soares em Belém.
Soares admitiu mais tarde saber que muitos dos presentes na FIL tinham essa ideia na cabeça, garantindo, no entanto, que naquele momento essa não era a sua vontade.
Soares começa a ser pressionado para avançar por várias figuras do PS e outras personalidades de esquerda que viam no velho “leão” o homem ideal para derrotar Cavaco. E quando José Sócrates, então primeiro-ministro secretário-geral do PS, lhe garante total apoio (financeiro, político, máquina de campanha socialista e total liberdade), Soares avança para a sua terceira candidatura a Presidente da República. Só que Manuel Alegre também já estava praticamente na corrida, até porque Sócrates, ainda que indirectamente, lhe tinha deixado a ideia de que poderia contar com o apoio do PS.
Foi o próprio Alegre que revelou mais tarde que Sócrates lhe tinha pedido que reflectisse sobre sua eventual candidatura a Belém, mas depois acabou por o trair e dar o apoio Soares. O peso do PS e de Soares não demoveram Alegre. Pediu um empréstimo bancário e fez-se ao caminho com uma candidatura independente. O PS estava dividido como nunca. E a esquerda também, já que Jerónimo de Sousa (PCP), Francisco Louçã (BE) e Garcia Pereira (PCTP/MRPP) também foram a jogo. 
Soares e Alegre e restantes candidatos de esquerda acabaram todos por perder para Cavaco. Os dois socialistas perderam também a velha amizade, mas Alegre ganhou a “guerra” entre camaradas, conseguindo quase mais 8% de votos que Soares. 
A amizade foi retomada sete anos depois, quando Soares foi internado de emergência em estado muito grave. Com o patrocínio do então secretário-geral António José Seguro os dois socialistas voltaram a dar as mãos.



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