Agora os “agentes da oligarquia” saqueiam a seu belo prazer em nome
da manutenção do poder…
Os tempos em que os diferentes governantes ainda guardavam e exibiam algum pudor e agiam no sentido de não ofender a moral pública e insultar o senso comum passaram vertiginosamente.
Logo que se revelou que a presença incómoda de Samora Machel já não existia para os apoquentar, os “camaradas” rapidamente enveredaram por caminhos que antes eram absolutamente impensáveis. E quem afirma isto são diversos “camaradas” que antes pertenciam à chamada “linha dura”. Uma linha ao fim ao cabo muito parecida com o que o estalinismo reinante na antes URSS preconizava. Com fervor e fôlego renovados uma boa parte dos “camaradas”que antes se escondiam seus apetites e ideias, arreganharam os dentes e lançaram-se ao assalto do espólio que sempre desejaram.
Numa combinação estreita com os novos valores em voga, uma vez consumada a queda do “Muro de Berlim” e da própria URSS, já não havia como parar ou frear a ala dos que decidiram bater-se pelo “Empoderamento Económico Negro”. De uma maneira estratégica a nova liderança livrou-se do empecilho que algumas figuras defensoras dos preceitos marxistas-leninistas representavam. Foram sucessivamente reformados ou colocados em posições marginais, muitos dos que se arvoravam em ideólogos do regime nos tempos de Samora Machel. Rapidamente se montou um esquema que excluía quem não estivesse disposto em alinhar com os novos paradigmas e isso surtiu os seus efeitos.
O que valia e era essencial para a sobrevivência política alterou-se de maneira profunda e uma nova realidade emergiu.
Se a postura antes apresentada pela maioria dos membros da Frelimo era de acordo com preceitos de pureza e perfeição revolucionária incontestável, cumprimento rigoroso das orientações emanadas pelos órgãos do partido e uma absoluta obediência ao que os superiores hierárquicos determinassem como caminho a seguir, agora agia-se em direcção completamente diferente. Da liderança a preocupação principal era distribuir e redistribuir entre si o que se apresentava com algum valor.
Desde empresas a terras, património do estado e de todos os moçambicanos foi estrategicamente transformado em propriedade privada sem qualquer contestação.
Houve tempos em que a contestação estava fora de questão pois nem no seio do partido nem no seu exterior não havia condições nem coragem para desafiar uma máquina partidária que remetia os opositores a campos de reeducação por simples discordância de uma orientação ou por comportamentos considerados sacrilégios pelo partido. Viviam-se os dias do estado policial e os “camaradas” tomavam posições em função de uma estratégia que não admitia a expressão ou manifestação de qualquer opinião contrária.
Um grupo de moçambicanos, protagonistas proeminentes no movimento de libertação, forçou suas teses políticas e filosóficas, se é que podemos afirmar tal coisa, em todos os outros concidadãos. Não havia pena nem agravo. Tudo se resumia a cumprir com as “orientações”.
Um sistema sofreu uma derrocada real mas deixou uma herança na memória colectiva e institucional.
O partido governamental, Frelimo, procurou mudar mas no essencial sua forma de actuar, os fundamentos orgânicos e a relação hierárquica no seu seio pouco se alteraram. O famoso centralismo democrático impera a todo o gás e a sua expressão é sentida em toda a sociedade.
Uma das características mais notáveis do regime de partido único antes em vigor era sem dúvidas a subordinação de todo o aparelho governamental às directivas do partido. Não havia algo que o partido quisesse que não fosse cumprido integralmente desde a administração de distrito até aos ministérios. Era difícil perceber ou interpretar o comportamento e procedimentos dos membros séniores do partido como arrogância ou demagogia pois em geral os cidadãos estavam a “leste” das teorias políticas. Era fácil ao partido agir e determinar o que todos deveriam seguir sem contestação.
Essa maneira de proceder não foi abandonada logo que o pluralismo político foi instituído com o fim da guerra civil. Com o mesmo partido formando o governo e praticamente com os mesmos actores o que se deu e aconteceu foi uma continuação mais ou menos camuflada do modus operandi anterior. Sem que fosse público o mesmo tipo de instruções quanto a drenagem de fundos governamentais para o partido no poder prosseguiu e cresceu conforme foi considerado estratégico pelo partido no poder.
Sabe-se e é deveras evidente que a maioria parlamentar nunca se manifestou ou agiu em defesa do regulamentado e legislado quanto a utilização ilícita dos fundos públicos para actividades políticas.
Face e perante um ambiente de permissibilidade total, de impunidade institucionalizada, todos os “cabritos estão comendo onde estão amarrados” e a justificação por todos utilizada é de que tudo o que fazem é nome da defesa do regime.
Quando se reabilita uma casa para receber a delegação do PR em “presidência aberta” e se adquirem novos mobiliários, as contas são empoladas a belo prazer do administrador ou governador local ou de suas equipas de administração e finanças. Ou não é assim que as coisas acontecem?
Não vale a pena inventar ou procurar descobrir justificações tanto ao hábito de muitos dos comentaristas televisivos que pululam pelo país. Também de nada vale procurar defender um estado de coisas pela via do silencia estratégico como muitas vezes se observa que fazem dos “críticos pagos pelo regime” para encobrir dossiers inquietantes e incómodos.
Uma das questões vitais para a república moçambicana é capacidade de se criar uma ordem institucional coesa, coerente com os mais altos princípios governativos.
No lugar de deixar-sebas coisas ao sabor do vento e da vontade ou inspiração de cada dirigente há que ver-se adoptado um código de conduta a que todos os agentes do estado se vejam obrigados a seguir. Já é tempo de olhar-se para o panorama político nacional e considerar que outros intervenientes e actores, poderão um dia não muito distante, tornar-se as cabeças do executivo e assim assumirem as prerrogativas inerentes à governação.
Este Moçambique clama por normalização governativa e isso deve ser feito independentemente dos apetites e agendas de que está no poder hoje. Exige-se que os políticos combatam a inercia institucional estratégica através da promoção de códigos de ética e moral que tragam credibilidade para a esfera pública.
Subverter a ordem democrática através da institucionalização de práticas promotoras de corrupção e assalto desmedido aos cofres públicos numa directiva que visa garantir as condições de manutenção no poder de determinada figuras de um partido é política mas ao mesmo tempo pode ser “disparar para os próprios pés”.
Aquele atraso na concretização de agendas até bem desenhadas e necessárias para o país e os moçambicanos deriva directamente das práticas que os responsáveis aos mais diversos níveis decidem implementar.
Enquanto os prevaricadores ainda merecerem prémios, emulação e bajulação o país está condenado a continuar tendo no seu executivo gente medíocre e de baixa índole moral e ética.
Quem se beneficiou ilicitamente de suas posições no aparelho governamental jamais deveriam ser recompensado com cargos na esfera privada de topo se isso não é feito como parte de uma orquestração e confraria de caracter “mafioso”. Serviste bem e acima de qualquer suspeita, então a tua reforma é seres PCA desta ou daquela empresa pública ou privada.
A avalanche de rombos e roubos do erário público acontecem num ambiente viciado pela impunidade.
Os gestores públicos ou de empresas públicas não tem receio de “irem aos cofres” sob sua guarda porque sabem que “suas costas estão quentes e são quentes”.
Defender o regime do dia é a justificação que muitos procuram oferecer quando questionados.
E como se sabe, a PGR não tem muito interesse em investigar assuntos que coloquem o partido vermelho em questão. Num ano de congresso do partido no poder, seguido de eleições autárquicas e depois legislativas e presidenciais, é evidente que das instituições que velam pela administração da justiça, não se vai ver muita gente “mexendo em palha ou procurando incendiar a pradaria seca” com julgamentos e detenções de membros do partido vermelho.
Se houvesse vontade política, integridade, verticalidade, hombridade e uma boa dose de honestidade por parte dos integrantes deste governo Moçambique estaria caminhando a passos largos para o progresso.
As falcatruas anunciadas periodicamente nos órgãos de comunicação social são factos reais que em países normais seriam exemplarmente punidos, em nome da justiça, da equidade e da responsabilidade governativa. A questão não é apoiar-se uma agenda puritana ou procurar estabelecer formas de coerção governamental incompatível com os preceitos democráticos. Todos têm o direito de defender-se perante a lei mas de igual modo todos são iguais perante a mesma lei.
Urge que os moçambicanos tomem conta de seu destino e isso passa necessariamente pela interrupção de uma cadeia de comando que não satisfaz nem corresponde aos seus anseios e aspirações legítimas a uma vida digna, entanto que seres humanos com direitos consignados na sua constituição.
Há forças sinistras e interesses conexos conjugando-se para que tudo continue na mesma o que obviamente não aceitável para a maioria dos moçambicanos.
E os moçambicanos mostram-se cada vez mais esclarecidos e informados quanto a sua real situação e ao que impede as mudanças pertinentes.
“Para a frente é o caminho” e decerto que os moçambicanos não desistirão nesta batalha fundamental pela sua vida e dignidade.
Canal de Moçambique – 26.09.2012
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