terça-feira, 19 de junho de 2018

O eixo do mal


EDITORIAL

O eixo do mal

O eixo Salvini-Kurz-Seehofer faz parte de um mundo que nos quer voltar a impor fronteiras e muros, e que pretende destruir qualquer noção de solidariedade entre Estados e povos.

Os imigrantes ou são heróis como Mamoudou Gassana, que salvou uma criança de cair da varanda de um quarto andar de Paris e que a França regularizou num ápice, ou, então, não são nada. Os imigrantes ou são ricos e têm visto gold ou são considerados indocumentados, ilegais, sem direitos (como na abjecta separação entre menores e adultos na fronteira dos EUA com o México). Num país presidido pelo neto de um imigrante — ele próprio casado com uma imigrante —, crianças são colocadas em gaiolas pelo simples crime de acompanharem adultosna ânsia de uma vida melhor, com a intenção de assim castigar quem o fez e de dissuadir quem o queira vir a fazer.  


O racismo é um rolo compressor que cresce de forma larvar de eleição em eleição como o ovo de uma serpente. O ódio aos imigrantes trava qualquer solução política entre Estados e não olha a meios, por mais desumanos que estes possam ser, para atingir os seus fins. Jeff Sessions, ministro da Justiça da Administração Trump, e Sarah Sanders, porta-voz da Casa Branca, nem sequer têm pejo em invocar a Bíblia para defender o indefensável:  “Obedecer às leis do Governo” é “muito bíblico”. Tudo isto é muito pouco cristão.
Trump e o "Brexit" catalisaram esta onda galopante de extrema-direita que faz do imigrante, do refugiado ou do candidato a asilo o bode expiatório de todo o mal na Europa. As declarações do ministro do Interior alemão, que anunciou um eixo Roma-Viena-Berlim contra políticas de aceitação de mais imigrantes, são o último passo em direcção a um abismo. O eixo não está só. Os três podem contar com o apoio férreo de países como Hungria, Polónia, Eslováquia ou Dinamarca e com a complacência dos demais, o que transforma a Península Ibérica num oásis de lucidez. Neste cenário, estão reunidas as condições para que a cimeira da próxima semana seja mais um fracasso e para que pareça mais fácil erradicar a malária ou a poliomielite do que o racismo ou a xenofobia.
relatório anual sobre os casos de asilo na UE, que desceram 44% em 2017, permite concluir que hoje a crise migratória é, antes de mais, “uma crise de vontade política”, como sugerem responsáveis do Gabinete Europeu de Apoio em Matéria de Asilo e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. E ela aí está. O eixo Salvini-Kurz-Seehofer faz parte de um mundo que nos quer voltar a impor fronteiras e muros, e que pretende destruir qualquer noção de solidariedade entre Estados e povos.
  1. Excelente texto. O populismo é a essência do eixo do mal. A política destes três senhores consiste em nomear culpados „de qualquer coisa“ a executar em praça pública para fomentar a mentalidade panem et circenses (vénia a Juvenal). Distrai e faz esquecer a raíz desse mesmo mal. Destrói a confiança mútua. Cria „inverdades“ que são tão e somente mentiras. Não resolve nada, muito pelo contrário, cria mais e novos problemas. Maus e perigosos políticos.
  2. Mais uma vez, cá vai. Quando convém e se gosta, nem que seja por mais um, há grandes vitórias do povo. Quando não, há eixos de a-b- e c. Isto para muito boa gente não é tanto a vontade do povo é mais o que gostamos de dizer e fazer em nome dela. Mesmo que seja necessário negá-la.
  3. Juvenal Barbosa
      O olho do ciclone 
    Mais um ideólogo de imigração descontrolada. Não foi o Trump e o Brexit que contribuíram para o crescimento da extrema-direita, mas sim a imigração descontrolada, a falta de vontade por parte dos partidos tradicionais de solucionar o problema-estancar o fluxo ilegal, separando os refugiados dos imigrantes económicos,deportando os criminosos etc. As populações na Europa começam a sentir as consequências das políticas falhadas e por falta de alternativas votam na extrema-direita que parece ser a única a ouvi-los. A crise continua (os milhões já estão por cá e outros milhões aguardam para uma possibilidade de chegarem), apesar das tentativas de a disfarçar nas estatísticas. E perante essa realidade a Peninsula Ibérica não é um oásis de lucidez mas de loucura.
  4. Daniel Silva
      Lisboa 
    excelente texto. pena é a lucidez intelectual já não ser a regra para que esta mensagem seja consequente em muitas cabeças.
  5. Abismo, são as portas abertas às migrações.

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