domingo, 14 de setembro de 2014

GUEBAS E O G40 (II)




No meu primeiro dia de aulas tive várias surpresas e caíram muitas ideias pré-concebidas sobre o meu aluno ex-Guerrilheiro, semi-analfabeto. Primeiro, dactilografava muto melhor que eu e em menos de 15 minutos já dominava o complexo teclado Macintosh. Dominava a língua Portuguesa muito melhor do que eu. E sorria muito e com muita humildade o que me embaraçava sobremaneira.
No fim da hora de aula disse-lhe que achava que em uma semana (se não fosse faltoso) já podia despedir-me.
Mas como era faltoso ficamos quase um mês onde pouco eu fazia se não responder as suas dúvidas. No fim já operava o Word e Excel com muita mestria. E eu estava boquiaberto...
Durante estas sessões não tivemos nenhuma conversa sobre algo que não fosse relacionado com as aulas e Tecnologias de Informação. Por vezes falamos sobre as minhas aulas nas engenharias e não escondi a minha desilusão e frustração em relação ao curso.
No entanto, o “grapevine” ia funcionando. Eu continuava a minha rotina. Mas notava que no Ministério era olhado com outros olhos. Tornei-me rapidamente muito muito conhecido no Ministério.
O gabinete cresceu. Mais pessoas foram admitidas. Entraram o Pedro Navesse (Comercial), o Abel Esmael (Revisão), Fernando Timbe Jr. (Finanças) e o Luis Filipe (Gráfica). Ampliamos os nossos serviços e oferecemo-los à várias instituições externas incluindo empresas fora da tutela do MTC, principalmente no Design e Gráfica, a área que eu estava a coordenar. Em seguida o Gabinete entrou numa crise aguda de conflitos internos e interpessoais. Esta situação chegou ao Guebas que convocou uma reunião. Isto já em 1999, portanto dois anos após a minha entrada no Gabinete. A reunião durou 12 horas divididas em dois dias seguidas. Toda a gente falou. Guebas ouviu a todos durante o primeiro dia sem qualquer limitação ou restrição. Ninguém se sentia intimidado.
No fim da reunião pediu que déssemos propostas para reestruturar o Gabinete. Todos falaram. Acabou-se concordando em reestruturar o Gabinete, criando-se o Posto de Editor-Executivo para o qual fui apontado. Na altura já sabia que no ano seguinte rumaria para a Inglaterra para estudar Engenharia de Telecomunicações. Por isso só tinha um ano para ajudar a colocar o GIMTC nos carris e emendar a periodicidade da Revista CORREDOR.
Neste posto pude conhecer algumas figuras importantes dos Ministério. Principalmente das áreas de Telecomunicações e Aviação Civil que eram as área de meu interesse pessoal...
Mas também conheci alguns dos brancos. O Fernando Couto passava várias vezes pelo nosso gabinete e batíamos o papo. Mostrava admiração pelo facto de eu ser estudante de Engenharia e “jornalista”. Ele tinha passado pelo jornalismo também. E contou-me várias cenas do seu tempo de estudante de direito. Também já tinha contactos com o Pedro Figueiredo que era Director do SATCC (Southern Africa Transport and Communiations Commission) com quem tinha contactos frequentes de trabalho. Ele viria a ser substituído por Mugama Matolo que até hoje é meu amigo pessoal. Tive alguns contactos esporádicos com Rui Fonseca que estava baseado na Beira tal como com o Jorge Ferrão (actual Reitor da Unilúrio).
Em princípios de1990 a Maria Helena Paulo anuncia-me que o Guebas havia decidido que eu devia lidera um grupo que se encarregaria de divulgar a SADCC em Moçambique. O Ministro dos transportes e Comunicações é que era o Presidente do Comité de Ministros da SATCC e a cimeira de 1990 realizar-se-ia em Maputo e Chissano passava a presidir a SADCC. No grupo que eu ia liderar seria coadjuvado pela Maria Helena Paulo (que era Directora de Economia do MTC) e por Ângelo E. Mondlane, um economista docente da UEM e do ISRI que já conhecia da OJM.
Nesse ano Guebuza já desaparecia “misteriosamente” para Parte Incerta mas sempre havia alguma forma de contactá-lo. Trabalhamos neste grupo e “recrutamos” alguns experts da UEM e de outros ministérios para produzir uma brochura alusiva aos 10 anos da SADCC.
Por várias razões esta brochura não foi lançada a tempo da Cimeira. Não as vou detalhar aqui, mas foi uma grande frustração para mim. Em Setembro, logo após a Cimeira da SADCC eu e o Ângelo tínhamos que rumar para a Inglaterra onde íamos continuar os estudos. O Ângelo partiu e eu tive que ficar para ver se, mesmo atrasado conseguia imprimir a brochura que já estava pronta para impressão.
Alguns dias depois o Guebas manda-me chamar para saber o que havia acontecido para eu não partir. Expliquei-lhe e disse-me que devia era deixar a brochura com os outros e ir embora. Que não havia razão para eu adiar a continuação dos meu estudos porque tinha feito o que realmente me competia.
Dias depois, na véspera da minha partida fui despedir-me dele no seu gabinete. Enquanto aguardava a minha vez de ser chamado, chega o Rui Fonseca com uma ar muito taciturno. Perguntei-lhe o que se havia passado. Disse-me que havia recebido a notícia de que o pai havia falecido em Portugal essa manhã e que ia pedir autorização ao Guebas para partir de emergência para Portugal no voo do DC-10 do dia seguinte, o mesmo voo em que eu partiria. Achei estranho e perguntei-lhe se não bastava ter ligado para o “velho” e dizer-lhe isso ou apenas avisar o pessoal do Gabinete do Ministro e ir embora. O Rui disse que achava mais correcto falar com ele pessoalmente já que estava na Parte Certa...
Pouco depois fui chamado e logo em seguida disse-lhe que o Rui estava lá fora para falar com ele porque o pai havia falecido em Portugal. Guebas pediu-me que saísse e chamasse o Rui. E só depois do Rui sair é que pude despedir-me do Rui Fonseca.
Viajei o dia seguinte no mesmo voo que o Rui. Calhou-me a Lina Magaia como companheira de voo. O Rui juntou-se a nós e inevitavelmente a conversa centrou-se no Guebas. Neste voo soube mais sobre o Guebas do que em toda a minha vida. O respeito genuíno que o Rui e a Lina tinham pelo Guebas era muito profundo. E fiquei sem qualquer dúvida que Armando Emílio Guebuza era um grande homem.
E uma coisa interessante: EU NUNCA PARTICIPEI EM NENHUMA REUNIÃO DO PARTIDO FRELIMO desde 1980!
http://www.jornalnoticias.co.mz/index.php/analise/22914-g40-uma-escola-sem-igual
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jornalnoticias.co.mz|By José Salvador Tivane

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