São filhos de emigrantes, vivem na Europa e têm menos de 30 anos. Este é o perfil conhecido dos radicais luso-descendentes identificados que combatem na Síria e no Iraque. Um deles, em Maio, cometeu um atentado suicida nos arredores de Bagdad.
Doze jihadistas de origem portuguesa, e com passaporte nacional, estão identificados como membros das brigadas de diversos países europeus que apoiam os vários grupos terroristas – Estado Islâmico (EI), Ahnaral-Sham e a Frente al-Nusra – que combatem na Síria e em território iraquiano. Estes elementos são oriundos, na sua grande maioria, de países europeus onde residem como membros das segunda e terceira gerações de emigração, o que leva os especialistas a situarem como “moderado” o risco de atentados em Portugal.
É admitida a existência de outros indivíduos de origem portuguesa em número que, contudo, não será significativo. Da dúzia de elementos referenciados, dez são homens e duas mulheres, todos com idades inferiores aos 30 anos, e não têm qualquer relacionamento com a comunidade muçulmana residente em território português.
Existe ainda a possibilidade de estarem envolvidas outras mulheres que adquiriram a nacionalidade por casamento e têm passaporte de Portugal.
A esmagadora maioria dos portugueses identificados até agora saíram da Grã-Bretanha, França, Luxemburgo e Holanda, sendo descendentes de famílias de emigrantes sobretudo oriundas do Norte de Portugal. Existem, no entanto, elementos com ascendência das ex-colónias portuguesas, nomeadamente da Guiné-Bissau e Angola.
No caso dos que se encontram na Síria, chegaram àquele país através de duas vias: voos regulares para a Turquia e, depois, trajecto rodoviário até à fronteira turco-síria; ou através de um percurso mais longo, que os levou, primeiro, à Bulgária, para rumarem depois a território turco e, finalmente, à Síria. Este processo foi detectado a partir de 2012 e, no ano passado, o Relatório Anual de Segurança Interna, do Sistema de Segurança Interna, referia-se-lhe de forma sucinta no âmbito da “radicalização e fenómeno dos combatentes estrangeiros”.
Esta é há muito uma preocupação da União Europeia (UE). Aliás, L Jinny, o ex-rapper de 24 anos, cujo verdadeiro nome é Abdel-Majed Abdel Bary, apontado como o autor da decapitação do jornalista norte-americano James Foley, é filho de um refugiado egípcio, extraditado do Reino Unido para os Estados Unidos, referenciado como um dos homens próximos de Osama Bin Laden. Jinny juntou-se ao EI.
Em Portugal, os investigadores anotam especificidades aos jihadistas portugueses identificados. Vivem há longos anos em países estrangeiros e o seu doutrinamento e posterior recrutamento ocorreu nos locais de residência, nomeadamente na capital britânica e na Holanda. No entanto, há o caso identificado de um jovem que residia em França com os pais, naturais de Tondela, e que passou a integrar as fileiras dos jihadistas. Em 22 de Maio último, na área de Mashahada, nos arredores de Bagdad, no Iraque, cometeu um atentado suicida. Outra fonte de recrutamento, tradicional para todos os integrantes dos denominados “combatentes estrangeiros” é a Internet, onde abundam sítios de propaganda.
O PÚBLICO apurou que, até ao momento, não há conhecimento de que algum dos 12 identificados tenha regressado de forma definitiva a Portugal. É desconhecida qualquer vinculação destes à comunidade muçulmana portuguesa. Aliás, nas três mesquitas existentes em Portugal – Lisboa, Laranjeiro e Odivelas - e nos diversos locais de culto dispersos pelo país, de Coimbra a Faro ou do Porto a Viseu, não há registo de actividades de doutrinamento relacionadas com os jihadistas.
“Quanto mais significativa é a minoria muçulmana, maior é o risco”, admite ao PÚBLICO um especialista. A não radicalização da comunidade muçulmana em Portugal, tradicionalmente composta por comerciantes oriundos das ex-colónias, obsta a que os “combatentes estrangeiros” tenham um habitat favorável entre nós.
Diferente é a situação em países como a Grã-Bretanha, França ou Bélgica, num movimento detectado no ano passado na UE. Na Grã-Bretanha, o efectivo de combatentes, já 500, segundo as autoridades, levou Londres a alterar o seu estado de alerta antiterrorista para grave, o segundo de cinco níveis. Em Marrocos, o ministro do Interior, Mahamend Hassad, reconheceu ter mais de 1200 concidadãos em combates na Síria e no Iraque, além de outros dois mil radicais de origem marroquina com a nacionalidade francesa, belga ou de outros países da UE. Em Espanha, em finais de Maio, as autoridades contabilizaram desde 2011, cerca de 50 jihadistas saídos do país para lutarem na Síria contra o regime de Bashar al-Assad. Uma actualização recente admite que cerca de uma centena se integrou nos “combatentes estrangeiros”, beneficiando da porosidade dos enclaves espanhóis de Ceuta e Melilla, em território marroquino.
Uma parte importante dos que estão na Síria foi para lá com o intuito de prestar ajuda humanitária. No entanto, as autoridades admitem que podem regressar com missões específicas: cometer atentados em território europeu, depois de terem recebido conhecimentos na preparação de explosivos e fabrico de carros-bomba, com treino militar ou mesmo com experiência de combate.
Em Portugal, o facto de estes “combatentes estrangeiros” estarem identificados diminui a sua capacidade de infiltração. Para entrarem em Portugal sem serem detectados, teriam de recorrer a passaportes falsos, o que representa um risco e uma vulnerabilidade na sua capacidade operativa.
Esta segunda-feira, em Londres, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, admitiu a retenção temporária dos passaportes de indivíduos suspeitos, para evitar a sua saída do país. Uma medida que Paris também não põe de lado. Na UE, a habitual discrição que tradicionalmente acompanha as questões de segurança e antiterrorismo deu lugar a uma nova estratégia que é a da ofensiva informativa. O objectivo é alertar os pais dos menores para o doutrinamento dos filhos via Internet.
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