terça-feira, 7 de maio de 2019

Reviravolta. Rebeldes líbios desmentem declaração sobre libertação de “mercenário português”


Porta-voz dos rebeldes diz que não fez qualquer declaração a anunciar a libertação do "mercenário português". Ministério da Defesa português garante que piloto não pertence à Força Aérea.
Um piloto alegadamente português terá sido capturado e detido pelo autodenominado Exército Nacional da Líbia — que apoia o general Khalifa Haftar, antigo aliado de Kadhafi, na ofensiva que lançou este ano para tentar tomar o controlo do país.
Neste momento, circulam duas versões sobre o que estaria o piloto a fazer na Líbia. Inicialmente, foi avançado que estaria a combater na Líbia como mercenário ao serviço das forças que apoiam o governo. O próprio, num vídeo registado por elementos do Exército Nacional da Líbia, afirmou estar no país para “destruir estradas e pontes”, ser português, chamar-se “Jimmy Reis” e ter 29 anos. Um porta-voz do grupo rebelde, Khaled al-Mahjoub, corroborou a versão dizendo que “o piloto português será bem tratado de acordo com a ética militar de tratamento de prisioneiros e de acordo com a Lei Humana Internacional” e que “foi recrutado pelo governo Sarraj como mercenário para bombardear a Líbia em troca de dinheiro”. A queda do piloto ter-lhe-á provocado “ferimentos ligeiros”, adiantou al-Mahjoub.
Uma outra versão chegou a apontar para que o piloto estivesse na Líbia ao serviço de uma operação militar da União Europeia para ajudar a combater o tráfico de migrantes no Mediterrâneo. Numa declaração de Ahmed Al-Mismari citada pela estação saudita Al Arabiya, este porta-voz do Exército Nacional da Líbia (LNA) dizia que o piloto seria enviado “imediatamente para o seu país”, depois do “tratamento das suas feridas”. Al-Mismari dizia ainda: “Importamo-nos com a segurança do piloto português e estamos a tratá-lo como um convidado e não como um prisioneiro. O que aconteceu foi um erro que decorreu do estado de guerra em que estamos. Vamos entregá-lo”.
Nos últimos minutos, porém, o próprio porta-voz do Exército Nacional da Líbia terá desmentido essa informação, dizendo que não prestou quaisquer declarações. Contactada pelo Observador, a Força Aérea Portuguesa garantiu que Portugal não tem aviões de combate naquela zona, afastando, assim, a possibilidade de se tratar de um piloto português ao serviço da União Europeia. Fonte da FAP explicou que, na Operação Sophia, as forças portuguesas estão representadas apenas com aeronaves e tripulações de busca e vigilância — como um avião P3 ou um C295 — e não um F1 Mirage como o que terá sido abatido.
O capitão Antonello de Renzis Sonnino, porta-voz da Operação Sophia — que tem sede em Itália — também desmentiu ao Observador que tenha sido abatido um dos seus aparelhos em território líbio. Disse, aliás, que a Operação Sophia não tem aviões do género (caças Mirage F-1) a operar naquela zona: “Não é um dos nossos aviões”.
Também o Ministério da Defesa português confirmou ao Observador que não tem registo de qualquer piloto português pertencente à Força Aérea com o nome que foi identificado pelos rebeldes e pelo próprio homem capturado, repetindo a informação da FAP: Portugal não tem aeronaves F1 Mirage. A Defesa sublinhou ainda não ter a certeza de que haja qualquer piloto de origem portuguesa detido na Líbia, alertando para a proveniência dos relatos, inicialmente difundidos nas redes sociais das forças rebeldes líbias e posteriormente ampliados por uma agência turca.
Ao jornal britânico The Independent, um porta-voz não identificado do exército de oposição ao governo líbio afirmou apenas: “Neutralizámos um caça Mirage F1 e o piloto vinha de Portugal. Ele está seguro [e a ser] tratado devido a feridas causadas pela colisão”.
[Imagens do piloto português capturado na Líbia:]

Inicialmente, um comunicado das forças leais a Khalifa Haftar citado pela agência de notícias estatal turca Anadolu detalhava apenas que “o piloto do avião, de origem portuguesa”, tinha sido “detido”.
Antes de ser anunciada a intenção de o libertar, elementos do Exército Nacional da Líbia que terão capturado o piloto divulgaram fotografias e vídeos do homem, através do Twitter. Nos vídeos, é possível ver o prisioneiro com a cara ensanguentada enquanto os militares gritam com ele.
Foram também divulgadas selfies tiradas por militares sorridentes com o homem no meio. Outras fotos divulgadas estão cortadas para não se ver o rosto do piloto, como fez correspondente do The Independent para o Médio Oriente, que publicou fotos enviadas pelas forças de Haftar.
O piloto terá partido esta manhã de avião da cidade de Misrata, que tem servido de base às forças que apoiam o primeiro-ministro Fayez al Serraj, reconhecido internacionalmente como líder do governo do país. O avião terá sido abatido pelos apoiantes de Haftar na região de al-Hira, perto da cidade de Gharian. Tratava-se alegadamente de um caça Mirage F1, propriedade do governo de Al Sarraj.
[Neste vídeo pode ver os destroços do avião] 
Quando foi transferido para o quartel das forças para receber tratamento médico, o homem terá afirmado ser um cidadão português. Se for confirmada a nacionalidade, este não será o primeiro português na milícia líbia que apoia o governo de Tripoli. Em 3 de junho de 2016, um português que pilotava um outro caça Mirage teve um problema técnico com o avião. Ainda se ejetou, mas acabou por morrer por causa dos ferimentos.
A informação foi inicialmente divulgada pelo portal Speciale Libia e partilhada através do Twitter pela eurodeputada Ana Gomes, que entretanto confirmou ao Observador estar a tentar obter mais informação sobre o incidente.
Segundo fonte oficial ao Observador, o Ministério da Defesa “está a apurar” o que se passou.
Oito anos depois da guerra civil líbia e da morte de Muammar Kadhafi, a Líbia tem visto falhar as tentativas de democratização do país coordenadas pelas Nações Unidas
No início deste ano, Haftar, ex-aliado de Kadhafi, lançou uma ofensiva para tomar o controlo da capital, Tripoli, a partir do leste, onde tem as suas forças leais — o autodenominado Exército Nacional da Líbia.
As forças leais a Haftar têm encontrado resistência de alguns grupos que permanecem leais ao governo apoiado pelas Nações Unidas e reconhecido internacionalmente, como este baseado na cidade de Misrata.

Sem comentários: