quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

O povo já demonstrou o que quer


Canal de Opinião por Noé Nhantumbo

Multipliquem-se as reuniões de comissões políticas e tudo o que seja órgão deliberativo político, mas tragam a paz e concórdia. Podem dar voltas e realizar as mais variadas reuniões e concertação ao nível interno, interpartidário ou mesmo internacional. Façam tudo o que, afinal, é vossaresponsabilidade fazer.
Mas façam tudo tendo em conta os interesses de milhões de moçambicanos.
A Comissão Política da Renamo reúne-se na Gorongosa, e isso é bom, porque pode e deve trazer deliberações decisivas para retirar o país do “suspense” entorpecente. O país está amordaçado por causa de tanta indecisão sobre as eleições ocorridas em Outubro. São poucos os países que se dizem democráticos que levam tanto tempo a determinar quem é o vencedor.
Que se reúna também a Comissão Política da Frelimo e a do MDM para tratarem do único “dossier” que importa de momento. 
A incompetência, a incoerência e a desorganização de titulares de órgãos de administração eleitoral não podem hipotecar a estabilidade nacional e a paz.
As vantagens adquiridas pelo cumprimento escrupuloso de instruções prévias não se podem colocar no meio do caminho dos moçambicanos.
Muito já se disse e escreveu sobre as eleições gerais moçambicanas de 2014.
Ao invés de se esperar pelos préstimos de aliados ou parceiros para agilizarem entendimento sobre os nossos processos políticos, a liderança e seriedade devem partir de nós.
É vergonhoso que, depois de quase quarenta anos de Independência, um simples processo eleitoral não possa ser realizado de maneira credível e fora de qualquer suspeita de viciação de resultados.
Aventuras arriscadas e perigosas encetadas por pessoas conhecidas, políticos, podem ter efeitos adversos.
Os moçambicanos já demonstraram suficientemente que não são “gado domesticado” dirigido por remoto controlo, pacatos e obedientes cidadãos de segunda, esperando orientações de “gloriosos e infalíveis políticos que tiveram participação na luta anticolonial ou na luta pela democracia.
Há urgência de que surjam no horizonte sinais inequívocos de que os políticos estão comprometidos com a verdadeira agenda nacional.
Moçambique clama pelo fim do reinado das boladas, em que até mulheres indigentes se vêem obrigadas a varrer areia da estradas e venderem como ganha-pão.
Leis que servem só para prolongar o poder de oligarquias enferrujadas, que servem de suporte ao assalto do bem comum, devem ser consideradas ultrapassadas e revogadas para o bem do interesse nacional.
Não se pode entregar tudo para decisão de um colectivo de magistrados, da mesma maneira que a auto-regulação no sector económico-financeiro já se provou funesta.
Bancos e banqueiros são rápidos em construir sindicatos para adulterar a verdade do mercado e retirarem vantagens, como se viu com o grande escândalo do Libor em Londres.
De juízes e magistrados controlados na sua maioria por esquemas de obediência ao nível partidário não se pode esperar isenção e uma leitura das leis que tragam de volta a confiança que não existe por parte da maioria dos cidadãos.
Estamos em face de um problema político e é a esse nível que se devem encontrar as decisões pacificadoras e promotoras dos equilíbrios necessários no país.
Basta de jogos de entretenimento, pois o país não é um “Fama Show” ou “Verão Amarelo”.
É muito grave e pode ser extremamente perigoso insistir na adulteração da verdade eleitoral.
Muitos já estão propondo saídas, e nenhuma delas é recorrer à catalogação do que o outro sugere como “anarquia”, pois esta é a que se vive um pouco por todos os sectores de actividade no país.
Roubos, assassinatos, raptos, sequestros, fraude académica, reprovações escandalosas nos sistemas de ensino, mau tratamento hospitalar, rotura de “stocks” de medicamentos, ineficiência na execução de empreitadas públicas, “procurement” estatal controverso, nomeações para cargos públicos com uma grande carga política e sem a correspondente competência profissional, compadrios que lesam o interesse público configuram em si mais do que o suficiente para se afirmar que alguém está desnorteado e sem ideias quanto ao que seja governar.
A avalanche avassaladora do culto da personalidade demonstra que o país sofre de visão e de posicionamento por parte do “entourage” de alguns líderes políticos.
Quando se escolhe o servilismo e a obediência acrítica aos chefes e se espera a recompensa por tais posicionamentos, é motivo de preocupação geral, pois isso é sintoma de doença político-social grave.
Nomear e demitir em função de esquemas que obedecem a comandos declaradamente lesivos do interesse geral promove a incompetência que vimos e testemunhamos todos os dias nos mais variados sectores da vida nacional.
Governo inclusivo, de transição, federação pura e simples, Assembleia Constituinte para a revisão profunda da Constituição da República de modo a que se extinga um presidencialismo excessivo e redutor das aspirações democráticas da maioria, tudo serve, se trouxer a paz.
O que são os nossos problemas reais não pode ser escondido e de debate proibido, só porque não vai ao encontro do que quem exerce o poder quer, pensa ou pretende.
Democracia não se faz com tabus nem com posicionamentos que revelam travões político-mentais por parte dos seus actores.
Redescobrir a moçambicanidade que une e revigora as aspirações nacionais é um exercício vital e fórmula resolvente dos problemas que nos apoquentam hoje.
Falhou o projecto de “abocanhar o país”.
Falhou a aspiração de “elite única e imperativo nacional”.
Falhou a estratégia de “obliterar os outros”.
Persistir por essas vias é o mesmo que trazer novas convulsões para Moçambique.
Moçambique não se resume à concessão de contratos e megaprojectos.
Moçambique não pertence a um grupo de “amigos e aliados congénitos”.
Os moçambicanos não querem filhos de antigos combatentes feitos “empresários de sucesso” sugando como vampiros o seu sangue através do poder dos seus pais.
Justiça, paz, equidade, responsabilidade e pátria!
Não é preciso ser membro de partido algum para ser moçambicano. (Noé Nhantumbo)

CANALMOZ – 24.12.2014

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