Passados
quase trinta e seis anos da assinatura do misterioso “Acordo de
Lusaka”, os direitos consagrados do povo moçambicano continuam a ser,
infelizmente, hipotecados em prol de interesses obscuros de uma minoria
elitista e empresarial dos auto-proclamados “libertadores da pátria”. E,
para mais, tal como cantou o falecido músico beirense ‘Taz’ “à caça
mandam o cão, mas é o gato quem come a carne. E como agradecimento
recebe um pontapé no traseiro!”
A
escassos dias do país celebrar o 36° aniversário do misterioso “Acordo
de Lusaka” (que se assinala amanhã) que pôs fim à guerra travada pela
Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) contra a dominação colonial
portuguesa, acarrentando consigo o sonho de um Moçambique
verdadeiramente democrático, eis que as populações das cidades de
Maputo, Matola e Chimoio, respectivamente, sairam à rua para denunciar a
“febre hemorrágica” da carestia de vida no país.
Com
palavras de conforto e de solidariedade, cada um do jeito que pôde, o
país inteiro e além fronteiras, aderiu à greve que teve início no dia 1°
de Setembro na capital do país e na cidade satélite da Matola, lançando
consigo um forte apelo ao Governo da Frelimo no sentido deste,
piamente, desse provimento a diversos dísticos reivindicativos.
Não
era muito o que se exigia - o que se exige - nada que um bom Governo
democraticamente eleito não possa dar ao seu povo. O povo exige três
coisas tão fáceis de memorizar, nomeadamente: (1) não a subida do preço
do pão, (2) não a subida do preço dos transportes semi-colectivo de
passageiros (vulgo ‘chapa 100’), e finalmente, (3) não a subida do preço da água e da energia.
A
estes pedidos, o Governo da Frelimo respondeu aos manifestantes,
sobretudo aqueles que se fizeram à rua, com balas verdadeiras, atingindo
mortalmente ao que tudo indica 10 pobres almas, e mais de meio milhão
de feridos (rápidas melhoras). Entre as vítimas mortais consta um número
não especificado de “flores que nunca murcham” (crianças)!
Não
está ainda provado, mas também não é preciso entender de balistica para
concluir que o vilão chamado José Pacheco, ministro do interior ordenou
que as forças policiais e de seguranças públicas por ele tuteladas
atirassem à matar contra os manifestantes a quem, aliás, apodou de
“bandidos, aventureiros e vandalos”. É preciso ser estéril e grosseiro
da mais baixa categoria para apodar crianças de “bandidos, aventureiros e
vandalos”. Espera-se que, no mínimo, a Assembleia da República mais
concretamente a Comissão dos Direitos Humanos e de Legalidade mande
chamar em juízo o ministro Pacheco para se explicar, uma vez que os
nossos tribunais abdicaram desta responsabilidade. E porquê não forçar a
demissão do ministro Pacheco junto do Presdiente da República?
Espera-se também que esta mesma Comissão coloque em liberdade incondicional a todos os detidos em conexão com este caso (manifestações).
A
expectativa em torno da reunião do Conselho de Ministros, logo após a
aparente “erupção do vulcão das manifestações”, em Maputo e Matola,
resultou num autêntico fracasso. Envergonhados e sem nenhum plano
imediato para conter a “hemorragia popular” mandaram o vice-ministro da
Justiça dizer que “o povo tem que trabalhar mais”. Não se preocupe
senhor vice-ministro, porque o povo que lhe colocou no pódio viu o seu
semblante e depressa compreendeu que o senhor estava entre “a espada e a
parede”. Ingrata missão a sua de ser porta-voz da desgraça!
Pede-se
agora austeridade ao povo! Seria interessante questionar ao senhor
vice-ministro da Justiça se a ementa diária do pessoal do Governo será a
mesma aquela que o Conselho de Ministros extraordinário propos ao povo?
E se os ministros e vice-ministros também estariam em condições de
comer ‘mandioca’, ‘batata-doce’, ‘matorotoro’, ‘tapioca’ e/ou tubérculos
no lugar das deliciosas guloseimas importadas do estrangeiro? Era
importante que ao se propor algo para o povo “consumir” o Governo fosse
exemplar na ideia! Os monges agem assim, porque para eles, registe-se, o
exemplo vem de cima.
A
desorganização deste Governo leva a acreditar que é o próprio Governo
quem anda em manifestações. O discurso do Presidente da República,
Armando Guebuza foi tão evasivo quanto extenuado. E não se lhe pode
levar a mal. Para quem tem um contacto intermitente com a realidade, só
pode ver verde em pastos secos. Das alturas do céu onde lhe levam os 5
(cinco) helicópteros presidenciais (alugados), com certeza, boa visão da
pobreza genuina do maravilhoso povo moçambicano não pode ter. E quando
desce cá para baixo, no Moçambique real, é recebido pelos mesmos
camaradas de sempre que lhe dizem, enganosamente, que a revolução verde
está em curso. Tal só pode estar a acontecer em marcha-trás.
Sinceramente não seria de estranhar se ouvisse um novo discurso do
Governo pedindo que as populações usassem como umas medidas de
austeridade na área de energia, ervas secas para iluminar as suas
palhotas como acontecia (acontece) antigamente!
Passados
quase trinta e seis anos da assinatura do misterioso “Acordo de
Lusaka”, os direitos consagrados do povo moçambicano continuam a ser,
infelizmente, hipotecados em prol de interesses obscuros de uma minoria
elitista e empresarial dos auto-proclamados “libertadores da pátria”.
É caso para dizer que a luta pela independência nacional livrou-nos de um dorido cancro mas, ao mesmo tempo, deu-nos um tumor maligno, que por NADA autoriza o povo à grave, um direito que aliás jaz em letras douradas na Constituição da República.
Lá vem outra vez ‘Taz’ dizer que “o
problema é do ‘cabrito grande’ que come sozinho, onde está amarrado. Os
‘cabritos grandes’ apoderaram-se de todo o pasto e não deixam também
que os ‘cabritos pequenos’ saboreiem o capim ternro, que na verdade
pertence a todos nós.” E avisa: “não há nada nesta vida que não tenha um fim.”
Gento Roque Chaleca Jr.
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