Vou convidar o meu caro leitor a reflectir apenas no seguinte ponto que é absolutamente vergonhoso e irritante e que quase dá vontade de remeter as culpas em factores exteriores: Porque é que há fome em África?
Por Brandão de Pinho
Permita-me amigo leitor um pequeno preâmbulo. Nasci num país antigo, bafiento e com caruncho perdido num ideal infantil de superioridade mas cheio de mofo, menos de um mês depois do 25 de Abril que teve aspectos bons e coisas más, a pior das quais foi o oportunismo que propiciou que cidadãos sem mérito ou talento particulares viessem a ter posições de relevo e cujo lastro ainda persiste – sobretudo através do compadrio, nepotismo e do caciquismo que recorrendo ao veneno da cunha, do pequeno favor inocente, da corrupção e do roubo institucionalmente instalado podem assumir um poder devastador e quase invencível e assaz indelineável por mais riquezas de recursos naturais e humanos que esse país possua.
Tenho quase a certeza que uma sociedade é irreversivelmente desigual e sem viabilidade – e vou enunciar apenas 2 irritantes factores como a pertença a uma tribo ou a filiação numa ideologia partidária – a partir do momento em que um grupo muito minoritário de privilegiados recorrendo ao bastião da eterna troca de favores no seu farto seio sede de um viveiro de corrupção numa escalada de progressões geométrica, tendencialmente proporcionará vantagens uns aos outros que se alimentam da ganância insaciável e que vou realçar:
1- Vantagens e privilégios por se pertencer a uma determinada, tribo, clã, etnia ou até a um assentamento de indivíduos com determinada nacionalidade arregimentada e que são ainda mais descarados que os colonizadores europeus, árabes, cubanos ou bantos ou o que for. Não será o caso de Angola.
2- Privilégios e vantagens por ideologicamente, ou melhor, por partidariamente, serem filiados e abnegados membros de um Grémio Político – mesmo que a ideologia subjacente seja absolutamente contrária à doutrina associada à sua génese – ou por, no caso de estrangeiros terem contactos privilegiados com as suas altas esferas.
Ao longo da História, impérios e civilizações ruíram quando a FOME se alimentou dos cidadãos mesmo que doutrinados para a desigualdade de oportunidades e da quase impossível escalada na pirâmide sócio-económica como por exemplo foi o caso da tri-milenar civilização Egípcia… e genuinamente africana.
Quando há FOME, como demonstra a Pirâmide de Maslow, cuja base assenta nas necessidades fisiológicas mais elementares onde estão também a sede, o abrigo, o sono e até o sexo, muito provavelmente o regime em vigor por mais vigor que possua acabará por desmoronar de tão podre, oco e corroído.
Em Angola há fome? Em Angola há quem não meta alimento à boca em 24 horas? Talvez. Eu sei que, por experiência própria, 24 horas sem comer conduzem-nos a um estado animalesco e alienado e a água só apazigua um pouquinho esse monstro e dói quando bate no estômago.
Não tenho a certeza se haverá um fenómeno generalizado de FOME por falta de dinheiro ou de alimentos e às vezes acho que prefiro nem saber pois a constatar-se seria desumano dormir tranquilamente de noite sem recurso a estupefacientes. Sei que das 3 vezes que estive em Cabo Verde senti que existiam mecanismos subliminares para não se chegar a determinado limiar de desnutrição. E não havia mendigos. Povo digno sem dúvida. Na Tunísia e em Marrocos, antes da Primavera Árabe onde também estive, percebi claramente que nem que fosse para recrutar mais um fanático só as irmandades per si conseguiriam organizar-se e debelar esse problema.
Talvez a culpa tenha sido do Colono Europeu que dividiu num gabinete de Berlim, com régua e esquadro todo o continente com excepção da Etiópia… mas da antiga e uniforme Etiópia chegaram-me aos olhos pueris as primeiras imagens da crueldade da FOME, a preto e branco, e, todos os outros continentes foram subjugados pelos Europeus e jamais o fenómeno chegou a proporções tais em que as rodas dentadas responsáveis melo mecanismo responsável por saciar as pessoas tenham emperrado por falta de lubrificação. Com as devidas excepções de qualquer país do mundo num qualquer determinado período de tempo.
Por ventura estaremos nós, insignificantes humanos, a viver uma pequena era de FOME em África e fartura no Ocidente que em meia-dúzia de décadas se inverterá?
Talvez a culpa seja do clima, mas só de pensar como é que um país como o Canadá que nas suas latitudes mais setentrionais tem Invernos de 50 graus Celsius negativos de temperatura e mesmo assim consegue proteger o seu povo alcançar índices de desenvolvimento invejáveis, abandono logo essa hipótese.
Talvez seja da religião. Pois parece que os países protestantes, disseram-me para justificar o atraso do Sul da Europa, tinham fiéis obrigados a aprender a ler a Bíblia para cumprirem com os seus desígnios religiosos e graças a esse simples facto o povo tornou-se mais esclarecido e empreendedor. Mas de Norte a Sul do continente negro há toda uma miríade de religiões, umas mais imiscuídas e promiscuídas na governação, outras menos, e, não me parece que os países de matriz anglo-saxónica estejam melhor que Angola ou de que um qualquer país francófono. Pelo contrário.
Talvez seja das crendices que facilmente cegam o homem africano. Copular com um Pigmeu ou com uma virgem poderá ser a panaceia para a cura da SIDA? Ou fazer toda a sorte de sevícias a um Albino poderá de alguma forma mágica resolver algum problema? Excepto, quiçá, o de descarregar frustrações através da violência arbitrária a seres indefesos. Parece-me mais um pretexto e maldade do que IGNORÂNCIA… mas tais práticas revelam-na.
IGNORÂNCIA. Era até aqui que queria conduzir o leitor, caso tenha tido a paciência de, pese embora a fraca prosa e a pena frouxa – talvez devido ao advento do Outono – chegar até este parágrafo essencial. O Estado Novo em Portugal perdurou porque Salazar manteve a grande maioria da população na IGNORÂNCIA… e na FOME até que o inevitável aconteceu.
A solução para a FOME em Angola passa pela Educação. A todos os níveis. O estadista que semear um alfobre bem tratado irá colher os seus frutos. As possibilidades de uma geração Educada, Cívica, Exigente e Esclarecida de derrubar o status quo são totais. É uma questão de tempo desde que o terreno seja bem regado, sachado, mondado e adubado. Por inerência, um povo assim instruído, jamais aceitaria ver um seu compatriota deixar de tomar uma refeição que fosse por impossibilidades financeiras ou logísticas. Um jornal independente pode ajudar muito nessa tarefa pedagógica e patriótica e talvez um dia ajude a coçar definitivamente esse coisa irritante que é não ter que comer e que não se resolve com falinhas mansas e abraços fraternos.
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