O ministro da Planificação e Desenvolvimento diz, em entrevista, que a concretização dos projectos de refinaria de Nacala e de areias pesadas de Chibuto está a tardar devido à crise financeira
O Ministério da Planificação e Desenvolvimento é um órgão central do aparelho do Estado, que dirige e coordena o processo de planificação e orienta acções para o desenvolvimento socioeconómico integrado e equilibrado do país. Estamos em 2009, ano do término da fase de implementação do PARPA II. De um modo geral,quais foram as grandes realizações alcançadas com a implementação do PARPA II?
De uma maneira geral, a operacionalização do Programa Quinquenal do Governo 2005/2009 vai terminar este ano e tínhamos, como grande objectivo, a redução da pobreza de 54%, em 2003, para 45%, em 2009. Neste momento está-se a fazer um levantamento para se aferir o nível em que estamos e, com base numa análise empírica, acreditamos que conseguimos reduzir o nível de pobreza. Mas há instrumentos, por exemplo, inquéritos às famílias feitos pelo Instituto Nacional de Estatística, que devem ser usados para se saber até que ponto conseguimos reduzir a pobreza. eesse trabalho está a decorrer. Fizemos a operacionalização do Mecanismo Africano de Revisão de Pares (MARP), que consiste numa auto-avaliação a níveis do Governo, das empresas e da sociedade. Temos a reabilitação da linha de Sena, que é um outro sector extremamente importante para a nossa economia. Temos a construção da ponte sobre o rio Zambeze. Estas são algumas das grandes realizações que estavam previstas no plano quinquenal do Governo e plasmadas no PARPA II e que foram concretizadas ao longo desse período.
Refere-se que mais de metade da população moçambicana (54%) vive abaixo da linha da pobreza. Será que com o fim do PARPAII, cujas projecções apontavam para a redução da pobreza para 45%, pode dizer-se que já é mais de metade da população que não vive abaixo da linha de pobreza?
Cremos que sim. Porque, primeiro, temos de ter em conta que estamos a sair de uma situação bastante difícil. A nossa população apresentava uma taxa de 54% em termos de prevalência de pessoas que viviam abaixo da linha de pobreza. De 2003 a 2009, queríamos reduzir para 45%. É um grande desafio para todos nós. É claro que o tempo não é suficiente, mas cremos que, em função daquilo que é a dinâmica da economia, estamos a crescer entre 7 e 8% anualmente. Acreditamos que esses 45% são posssíveis de ser alcançados.
Os dados que indicam que houve redução de 15% da pobreza foram obtidos em 2002/3 e foi quase nesse período que iniciou a implementação do PARPAI (aprovado em Abril de 2001 com efeito no orçamento de 2002). não acha que é tecnicamente insustentável associar a redução de 15% ao PARPA I? Como é que se explica que essa redução se tenha devido à implementação do PARPA I?
Temos a esclarecer que, na avaliação que fizemos em 2004, não recorremos às técnicas que estamos a usar agora. refiro-me às técnicas do INE, recomendadas a nível internacional e que consistem em inquéritos às famílias sobre a pobreza, os rendimentos, (...). O que fizemos foi aferir o nível em que estávamos em função do nosso nível alcançado em 2003. No ano em que acabávamos de sair da guerra e, de acordo com as informações disponíveis, achamos que era possível alcançar os 45%. Temos mapeado os distritos e postos administrativos do país, para saber o nível de pobreza existente nesses locais, e apura-se que os índices de prevalência de pobreza são gritantes.
Como é que o discurso do Governo, quando fala da redução da pobreza absoluta, principalmente da questão do PARPA I, sempre refere que a redução de 69% para 54% é resultado do PARPA I?
É resultado do PARPA I porque tínhamos, em 1992, indicadores correspondentes a 69%. Até 2003, conseguimos sair de 69% para 54%. E, agora, de 2003 para 2009, estamos a sair de 54% para 45%, precisamente devido ao trabalho que foi feito e aos investimentos aplicados na área social e rural. É por aí que o nosso programa prevê que, em 2009, iremos atingir os 45%.
O que virá a seguir ao PARPA II? Será o PARPA III ou existe uma outra perspectiva em termos de planificação?
O PARPA III é um nome que vai operacionalizar o programa quinquenal do Governo 2010-2014.
Uma das grandes preocupações no combate à pobreza em Moçambique está relacionada com o facto da pobreza rural estar a reduzir e a pobreza urbana estar a crescer. Que medidas estão a ser implementadas para a inversão desse cenário?
A pobreza urbana é combatida criando condições a nível rural. Aquilo que está a ser feito hoje visa combater a pobreza rural para que todos não saiam do campo para a cidade só porque gostam da cidade. Devem sair do campo porque vão à procura de melhores condições. E, se essas condições forem criadas a nível local, as populações vão permanecer nos seus locais de origem. O Governo está a atacar estas insuficiências, criando condições para que o fluxo campo-cidade se reduza, mas ainda ocorre esse fluxo porque os nossos recursos são escassos, apesar do trabalho que está a ser feito, no sentido de se criar condições a nível rural. Só para citar um exemplo, temos o caso da alocação dos “7 milhões” que visa, essencialmente, incentivar os empreendedores existentes a nível do campo.
O Instituto de Desenvolvimento Cruzeiro fez um estudo na zona norte do país (Niassa, Cabo Delgado e Nampula) e chegou à conclusão de que essas foram as províncias que, nos últimos anos, mais benefícios tiveram em termos de infra-estruturas, como estradas, escolas e postos de saúde. Mas as mesmas não são as mais ricas. Como explica este facto?
Constatou-se que a estratégia de desenvolvimento com base nas infra-estruturas não é suficiente para o combate à pobreza. O Governo está a fazer a parte que lhe cabe, mas como não pode trabalhar sozinho para o desenvolvimento do país, existem os seus parceiros que são o sector privado. Portanto, criámos as condições básicas como, por exemplo, as infra-estruturas, para atrair o sector privado embora, muitas vezes, o mesmo não esteja nas mesmas proporções que o Governo. Nós criámos a zona franca de Beluluane, que tem boas condições infra-estruturais, mas muitas empresas que operam lá são estrangeiras. Infelizmente, o nosso sector privado está descapitalizado.
Mercados agrícolas
Ainda neste quinquénio, foi lançado o Programa de Apoio aos Mercados Agrícolas (PAMA) e assinado o financiamento do Programa de Promoção de Mercados Rurais (PROMER), a serem implementados no Corredor de Nacala, cobrindo cerca de 15 distritos, com vista a reforçar as redes comerciais nas zonas rurais no país. Quais têm sido os resultados da implementação destes programas?
Esses são programas em que trabalhamos com o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola e que vieram substituir um outro programa, que vínhamos apoiando até ao ano passado e que permitiu a abertura de algumas estradas em alguns distritos, principalmente, aquelas estradas que ligam as áreas de produção e consumo. Foi através desse programa que ajudámos o município de Maputo a construir o mercado grossista do Zimpeto e, nessa segunda versão, são cerca de 40 milhões de dólares. afilosofia continua a mesma de permitir que o que for produzido a nível do distrito tenha o mercado necessário. Portanto, que seja possível escoar através da organização de feiras, abertura de estradas terciárias, sensibilização dos camponeses em relação às novas técnicas de produção. Em suma, são complementos do programa dos “7 milhões”.
Investidores redesenham engenharias de financiamento em face da crise
De 2006 a 2007, no âmbito de tornar o distrito como pólo de desenvolvimento, houve várias transformações. Temos, por exemplo, a questão dos conselhos consultivos. Houve um programa nacional de educação cívica para consciencializar os residentes nos distritos em relação a estas novas dinâmicas que estão a ser implementadas?
Há um trabalho que está a ser feito à medida que a descentralização está a ser implementada no terreno, que é resultado de um movimento a nível das próprias comunidades. Esse movimento é feito com o envolvimento de pessoas reconhecidas a nível do bairro pelo seu poder económico ou pela sua influência social. Trata-se de pessoas que são escolhidas num universo de 40 a 50 pessoas dependendo do distrito. E, conforme está previsto, o administrador tem que consultar essas pessoas criando uma inter-relação entre os programas.
“Sete milhões”
A aplicação do Fundo de Investimento de Iniciativa Local (FIIL) continua a alimentar acesos debates. Num encontro que decorreu este ano, em Nampula, revelou-se que foram investidos cerca de 200 milhões de dólares neste fundo, mas sabe-se que o nível de reembolso não é satisfatório. Em 2008, falava-se de 5 a 20%. O que é que está a ser feito para se alterar este cenário?
Estamos a trabalhar a níveis central e distrital. Em 2006, quando se alocou o Orçamento de Investimento de Iniciativa Local (OIIL), que são os 7 milhões, questionaram-nos sobre a uniformidade do valor para distritos diferentes. Tínhamos de encontrar indicadores que diferenciassem os distritos e a nossa tarefa era operacionalizar o princípio político de distrito pólo de desenvolvimento. Em 2008, já tínhamos escritórios para facilitar a alocação dos valores e já havia clareza sobre a importância do plano. Alguns abriram estradas, outros construíram residências para funcionários, mas, em 2007, a prioridade foi a produção de comida e a criação de emprego.
Nos relatórios do impacto do OIIL, fala-se de milhares de empregos que foram criados. O que isso significa? Será que estamos a falar de criação de novos postos de emprego ou foram potenciados os mesmos postos de emprego?
Isto tem a ver com cerca de 110 mil postos de emprego que foram criados até ao ano passado, o que significa que há novos empregos. Aqueles que receberam o montante estão empregados e já empregaram outras pessoas. Todos esses são novos empregos criados.
Alguns bancários já aparecem publicamente a dizer que seria mais viável se esses recursos fossem confiados a instituições financeiras, para que concedessem créditos às actividades a serem realizadas nestes distritos. Qual é a posição do Governo em relação a este assunto?
Sempre tivemos instituições financeiras no nosso país. Dos 128 distritos, cerca de 45 é que têm bancos. O Governo tem duas linhas: uma linha de apoio às finanças rurais e a linha dos sete milhões. Pode não ser viável entregar esse dinheiro aos bancos porque, primeiro, eles não cobrem todos os distritos; segundo, precisam de alguma garantia para ceder dinheiro por empréstimo.
Acrise financeira internacional está a inviabilizar uma série de projectos, que contribuiríam para o aumento da riqueza e de emprego no país. Além disso, há previsões segundo as quais o continente africano será o mais afectado pelo fenómeno. Projectos como a construção de refinarias de petróleo em Maputo e em Nampula estão paralisados devido à crise. Por outro lado, há indicações de que o tráfego de passageiros, sobretudo de turistas, reduziu 25% nos aeroportos nacionais Até que ponto esta crise está a afectar o país e as contas do Estado? Quais são os sectores mais vulneráveis?
A crise tem três portas de entrada para o nosso país: a primeira porta é através do nosso orçamento, que vive à custa dos nossos parceiros internacionais. Felizmente, até agora não há sinais de alarmes. Os compromissos feitos para 2009 mantêm-se e, relativamente ao ano 2010, os nossos parceiros pronunciar-se-ão dentro de duas semanas. A segunda porta é relativa a programas sectoriais do Governo nas áreas da educação, saúde e, felizmente, também a este nível os compromissos mantêm-se. A terceira entrada está relacionada com os investimentos externos, nos quais temos alguns sinais que precisam de muita atenção. Trata-se de sinais relativos a alguns projectos, cujos proponentes estão a fazer a verificação da monitorização financeira para a sua aplicação, (...). Mas essas são cautelas que os investidores estão a tomar, redesenhando a engenharia financeira dos projectos. Um dos projectos é o da refinaria de Nacala, que ainda não avançou, e temos o das areias pesadas de Chibuto. Nestes dois projectos teremos de esperar mais um pouco.
A Autoridade Tributária disse, recentemente, que poderá haver uma queda de 100 milhões de dólares nas receitas devido à crise financeira internacional. Quanto é que o país está a perder, ou já perdeu, devido à crise financeira internacional?
Pode exemplificar-se com o caso da Mozal, que é um grande exportador. Só por se ter baixado o preço do alumínio no mercado internacional, as receitas do Estado também saem a perder. Mas a situação está a ser normalizada e a nossa balança de pagamento irá melhorar.
Como é que estão a decorrer os desembolsos ao Orçamento do Estado e aos projectos sectoriais, tendo em conta a presente crise?
O desembolso está a decorrer normalmente. Os projectos que foram planificados, tanto os que dependem do financiamento do Estado como os que dependem dos parceiros de cooperação, estão a ser financiados normalmente.
Há dados segundo os quais, na província de Nampula, as populações deixaram de consumir outros tipos de alimentos e recorrem à mandioca como estratégia de poupança. Neste caso, está-se a criar um outro problema que é a subnutrição. Como é que analisa esta situação?
Nas nossas comunidades, ainda que as pessoas se alimentem quase sempre de mandioca, há muita diversidade de alimentos disponíveis. Às vezes, é uma questão de hábito, porque há zonas em que não se come alface, não se come cacana, que são alimentos bastante nutritivos. E a questão que existe é a da necessidade de uma educação nutricional.
Microfinanças
Segundo o Balanço do PES de 2008, no mesmo ano, existiam cerca de 32 instituições microfinanceiras formais nas zonas rurais, 15 instituições informais e cerca de 3.008 grupos de poupança e crédito, baseados na comunidade (ASCAS), de modo a que todo o sistema de microfinanças beneficie cerca de 243.293 clientes...
Queremos expandir mais. Aliás, em 2007, conseguimos atingir 100 clientes de microfinanças. Temos um programa de apoio às finanças rurais e está adstrito ao fundo de rentabilização económica, FARO, que é tutelado pelo ministério da Planificação e Desenvolvimento. O nosso objectivo é estimular aquelas agências que querem operar a nível local. E, o tipo de estímulo que damos é o financiamento a essas instituições microfinanceiras. Não damos financiamento a retalho. O que fazemos é financiar as instituições microfinanceiras, e essas, por sua vez, vão financiar as populações. Até 2008, tínhamos 250.000 clientes.
Está em curso a revisão do documento final da Estratégia de Finanças Rurais em Moçambique (EFR), para a sua aprovação em 2009. Que medidas inovadoras este documento poderá oferecer para a aceleração da expansão dos serviços financeiros para as zonas rurais?
A nossa preocupação é expandir para mais beneficiários. A inovação é torná-las mais flexíveis no sentido da sua extensão territorial e das exigências que são necessárias, e naqueles elementos que o Governo pode participar através dos subsídios nas taxas de juro, porque, muitas vezes, essas instituições praticam taxas de juro bastante elevadas, incomparáveis com a dos bancos comerciais. então, negociámos no sentido de se superar essas limitações.
Sem comentários:
Enviar um comentário