Aconteceu que em 8 de Março de 1977, exactamente um mês depois do III Congresso da Frelimo – na verdade I Congresso do Partido Frelimo, o então Presidente da República, Samora Moisés Machel, decidiu convocar um grupo de estudantes para trabalhar em vários sectores da economia do país em resultado da saída de aproximadamente 200 mil portugueses para Lisboa ou países vizinhos. Este grupo ficou conhecido por 8 de Março. E estranhamente, alguns historiadores, agindo em causa própria, beatificaram o grupo que ficou conhecido pelo nome de Geração 8 de Março, escondendo e atirando para debaixo do tapete a grande arbitrariedade e o escamoteamento da história de Moçambique, não nos permitindo assim aprender as necessárias lições para desta forma evitar erros.
Para começar, a própria decisão foi má. Os actuais membros dizem que “aceitaram o chamamento”. Mas cá entre nós, era possível que alguém pudesse negar tal “chamamento”? Não. Não era. Este acto desumano e coercivo mudou indelevelmente a vida de muitos dos então estudantes e afectou outros milhares:
• Pensem na qualidade de ensino, no impacto sobre os estudantes ou alunos que aprendiam de outros alunos sem nenhuma formação sólida
• Pensem nos pacientes beneficiando de assistência de estudantes sem nenhuma formação seria.
• Pensem nas empresas que faliram porque geridas por estudantes sem nenhuma experiencia de gestão.
E depois disso tudo vem dizer que “analisando o percurso”, valeu a pena. Não valeu a pena não. Foi má a decisão.
A história económica deste país mostra claramente que de 1977 a 1984 (segundo a periodização do Professor Yussuf Adam) portanto, logo a saída do III Congresso (I Congresso do Partido Frelimo) a economia declinou. Este declínio teve por base não apenas a dificuldade em aplicar até as últimas consequências o modelo socialista escolhido mas também da incapacidade de o Estado pensar em alternativas para a solução de problemas concretos na altura. Portanto, o “chamamento” compulsivo de estudantes para unidades de produção, longe de ser visto como acto heróico deve pelo contrário ser questionado e considerado um gravíssimo erro estratégico, como aliás, pôde corrigir-se mais tarde, com o envio de milhares de moçambicanos ao exterior para estudar. É importante lembrar que na altura que isso acontece, o Estado moçambicano arranjara problemas com três sectores fulcrais para a estabilidade deste país: as autoridades tradicionais – acusadas de serem o reduto feudal e cúmplice do sistema colonial; a igreja – acusada de ópio do povo e obstáculo a materialização do projecto socialista, os COMPROMETIDOS - indivíduos que colaboraram com o sistema colonial e os combatentes moçambicanos do lado do estado colonial português.
A (pequenina) história do 8 de Março tem sido adulteramente associada ao sucesso das políticas sociais em sectores como saúde e educação. Na verdade, isto acontece porque parte dos redactores destas estórias foram outrora vítimas desta arbitrariedade. O sucesso da política da educação (redução em 20% da taxa de analfabetismo de 1975-1982) e saúde (na imunização) não se deveu a 8 de Março. Foi devido ao forte investimento do Estado nestas áreas com a forte ajuda da cooperação internacional: investimento na infraestrutura, meios humanos e técnicos. Esta forma aleatória e oportunista de associar factos sociais aos factos históricos está na origem deste mito de baixo consenso, que permite que os que se identificam com o tal 8 de Março tirem proveitos políticos e se aglutinem em torno do poder. Para finalizar, importa dizer que testemunhamos ao longos dos últimos cinco anos, uma autêntica peregrinação ao 8 de Março, numa tentativa de “purgar “os de lá e os de cá.
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