sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Um sujo jogo diplomático: Voz da Rússia

18.01.2013, 21:03, hora de Moscou
Imprimirenviar por E-mailPostar em blog
judaísmo, Judeu, Biblioteca Nacional Russa, EUA, tribunal, diplomacia
SXC

Moscou ficou indignada com a decisão do tribunal norte-americano relativamente à coleção Schneerson. Segundo declarou o MRE da Rússia, Moscou pretende "responder com dureza" em caso de apreensão de patrimônio estatal russo.

O problema é a anterior decisão do tribunal, que obriga a Rússia a pagar uma multa diária de 50 mil dólares até a coleção ser entregue ao movimento judaico hassídico Chabad Lubavitch (sede em Nova York).
Neste momento, as obras da literatura talmúdica, obras raras da imprensa judaica, assim como outros livros preciosos, estão conservados na Biblioteca Estatal Russa. A história à volta da biblioteca do rabino Schneerson começou em 1915, ano em que ela saiu pela primeira vez da propriedade do rabino em Lubavitch (uma aldeia do distrito de Smolensk na Rússia) e foi transportada para o depósito. Na altura era necessário proteger os exemplares raros dos combates que se aproximavam. Depois da revolução, os 120 mil livros e 50 mil documentos foram nacionalizados pelos bolcheviques. Nos primeiros anos do poder soviético, os emigrantes que faziam parte dessa comunidade exigiram a restituição dos livros, mas sem resultados.
A questão de os livros terem de sair da Rússia voltou a surgir no final dos anos 80. Os representantes da comunidade hassídica até recorreram ao conhecido homem de negócios estadunidense Armand Hammer. Agora que esse tema voltou a surgir em primeiro plano, é cada vez mais frequente serem os cientistas a expressar a sua opinião. Na opinião do doutor em História Semion Yakerson, os livros, manuscritos e documentos devem permanecer nos depósitos e nas bibliotecas:
"Todas as grandes bibliotecas do mundo surgiram precisamente com base nas coleções particulares. Infelizmente, muitas delas foram incorporadas de uma forma pouco agradável. Hoje em dia, no meu ponto de vista, os livros, assim como outros artefatos culturais, são mais bem conservados nos museus e em bibliotecas do que nas igrejas ou nos templos. A Biblioteca Lênine é um lugar bastante aceitável para a sua conservação".
Se nos referirmos especificamente à coleção Schneerson, para ela foram criadas todas as condições indispensáveis. Eis o que nos diz acerca da sala, onde se encontra a coleção, Maria Khaitseva, perita do Centro de Literatura Oriental da Biblioteca Estatal Russa:
"Ela está completamente adaptada tanto para uma conservação a longo prazo dos livros da família Schneerson, como para a celebração de culto religioso. Os livros da coleção da família Schneerson são dispensados de acordo com as regras gerais".
Mas aqui surgem logo dois problemas que os representantes do movimento religioso Chabad Lubavitch preferem silenciar. O primeiro tem a ver com a disponibilidade do acervo em caso da sua transmissão, e o segundo tem a ver com os livros em si, recorda-nos Semion Yakerson:
"Existe um certo perigo. Quando uma biblioteca regressa à posse de uma determinada comunidade, ela se torna menos acessível. Outra questão muito discutível é a de quais são os livros, dos que estão agora na Biblioteca Lenin, que podem ser considerados como fazendo parte da biblioteca Schneerson e quais os que não podem. No meu entender, não existe um acordo completo entre as partes sobre quais são os livros que fazem parte da biblioteca Schneerson. É que se trata de uma denominação bastante convencional".
De fato o que se passa, insiste o perito, é que os representantes do Chabad Lubavitch simplesmente não querem recorrer aos livros que se encontram no depósito russo. O lugar da biblioteca é só na Rússia, é a convicção de Veronika Irina-Kogan, reitora da Academia Judaica Estatal Maimonid:
"Eu encontrei-a, depois de ela ter estado perdida durante 80 anos, na Biblioteca Lênine. Já desde o primeiro dia em que a encontrei que considero que ela não deve sair da Rússia porque ela foi compilada para os judeus russos, para os rabinos russos e para as yeshivot (estabelecimentos de ensino religioso judaicos) religiosas russas. Isto é propriedade coletiva nossa. Tanto que os pais dos judeus hassídicos que vivem agora na América viviam aqui em Lubavitch".
Finalmente, muitos peritos chegam à conclusão que é necessário discutir as possibilidades de transmitir a coleção à comunidade judaica russa ou a um dos estabelecimentos de ensino judaicos. Mas essa questão exige um estudo não só jurídico, mas também cultural. Veronika Irina-Kogan descreveu a última decisão do tribunal de Washington como "o ressurgimento dessa questão associada à reação adequada da Rússia à Lei Magnitski. Se trata de um jogo diplomático sujo e não de cultura, memória e religião".

Sem comentários: