Canal de Opinião
Por: Noé Nhantumbo
…coabitação e reciprocidade também deveria haver
Beira (Canalmoz) - Alguma imprensa tem noticiado que o Governo através dos Serviços de Migração de Moçambique está recambiando certos portugueses candidatos a emprego em Moçambique.
Quando são moçambicanos que se vêem mergulhados em inúmeras dificuldades cada vez que tentam entrar no espaço português quase ninguém reporta ou encomenda que seja colocado como notícia. Mas o inverso também tem estado a acontecer…
Há alguma confusão no seio de muito boa gente. Alguns reclamam que Moçambique está sendo demasiado rigoroso. Outros dizem que Moçambique está retaliando o tratamento que é dado em Portugal aos cidadãos moçambicanos que desembarcam em Lisboa.
Convém que não se faça ou se estabeleça confusão em matéria de migração, das leis de cada país e das obrigações que os governos dos países assumem com seus parceiros e organizações regionais ou continentais de que fazem parte.
Portugal tem uma política de migração elaborada em estreita concordância com aquilo que a União Europeia tem como legislação comunitária. Portugal não pode no contexto da União Europeia agir para com os cidadãos de Moçambique de forma diferente da política europeia de Migração, porque qualquer cidadão estrangeiro que entre em espaço europeu depois pode circular livremente em todo o território da União Europeia sem mais diligências migratórias.
Moçambique possui sua legislação própria e alguma relacionada com a SADC de que faz parte. Na SADC ainda há fronteiras migratórias entre os seus países membros.
O nível de entradas e de permanência de estrangeiros em Moçambique revela e denota o nível de organização de suas entidades. Aquela precariedade evidente em todo o aparato migratório em Moçambique não é algo falso ou inventado por alguma imprensa oportunista ou sensacionalista.
As lacunas são tantas que ao fim do dia temos emigrantes legais, refugiados legítimos, refugiados políticos e económicos legítimos. Mas em conjunto abundam e pululam em Moçambique todo lado inúmeros emigrantes ilegais, refugiados ilegais.
Uma avalanche de pessoas das mais diferentes origens demanda Moçambique com os mais diversos objectivos. Vêm os bons e os maus. Está por aí a aparecer de tudo.
Comenta-se que Moçambique pode estar servindo de corredor de contrabando de vária natureza. Armas, drogas, tráfico de pessoas, medicamentos entram e passam por Moçambique com relativa facilidade. Produtos animais como marfim, cornos de rinoceronte, barbatanas de tubarão, e outros são pirateados a partir de Moçambique.
Se alguma emigração legítima traz benefícios ao país, nesse sentido tem de ser encorajada.
Mas em Moçambique há que implementar uma política de migração baseada na legislação aprovada pelo parlamento nacional. Os arranjos migratórios que existam com países como Portugal ou outros devem obedecer a uma reciprocidade que faça sentido e signifique vantagem para os cidadãos dos países envolvidos. Os governos devem trabalhar nestes dossiers.
O presente dos países faz-se olhando para a frente e com sentido positivo. Se a história tem páginas negras e isso é inegável não deve constituir motivo que trave a adopção de regras actuais que protejam os países de movimentos migratórios ilícitos promotores de actividades perigosas para a segurança nacional.
As facilidades aparentemente gozadas por uma parte dos investidores incipientes, emigrantes que não trazem vantagens significativas devem ser desencorajadas através de um aperto dos mecanismos de controlo existentes.
Há uma tendência de algumas chancelarias endurecerem requisitos para entrada nos seus espaços nacionais que não encontram correspondência em Moçambique.
Mesmo com a criação da CPLP, Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, isso não se tem traduzido em celeridade e tratamento digno dos cidadãos dos diversos países que apresentam seus documentos nas diversas embaixadas.
É quase como que proibido solicitar visto para Luanda. Para Lisboa a pilha de documentos exigidos desencoraja qualquer pretendente. Ir a Rio de Janeiro é extraordinariamente complicado. Os diplomatas lá viajam com as suas facilidades especiais. Ao cidadão comum está reservado um tratamento que tira todo o sentido a pretensa amizade entre Povos e Estados.
Os turistas devem ter igual tratamento seja em que país for…
As vantagens que o fluxo de pessoas e bens origina são factos que os governos devem tomar em conta na sua acção legislativa.
Moçambique é um daqueles países que pode beneficiar extraordinariamente com a promoção de uma migração diligente, orientada para o preenchimento das necessidades de investimento e de recursos humanos tecnicamente preparados para atender aos novos desafios nacionais.
Há algumas correntes de pensamento escrevendo na comunicação social moçambicana que “vomitam” sentimentos de vingança e de desespero. Iniquidades e desequilíbrios não são vistos como desafios que se podem resolver com a intervenção de emigrantes qualificados e com arcaboiço financeiro.
Uma certa ingenuidade de governantes os faz criar facilidades ou dificuldades, consoante avaliações ou análises conjunturais, leva a que se cometam erros de consequências desastrosas.
Os avanços que se verificam tecnologicamente nos Estados Unidos da América são em parte produtos directos de uma migração secular altamente proveitosa.
Na África do Sul houve saltos na área tecnológica que resultaram de uma migração promovida até nos tempos do apartheid.
Israel coloca-se entre os mais avançados tecnologicamente porque numa acção concertada alguns países aliados aceitaram investir seus recursos humanos e financeiros em defesa de uma “linha da frente” entendida como garante de seus interesses na região do Médio-Oriente.
Não se pode falar de desenvolvimento em nenhum país do mundo sem que a dimensão de intercâmbio se faça presente.
As chamadas civilizações de hoje resultaram de correntes históricas migratórias que aconteceram ao longo dos anos, envolvendo interesses políticos e económicos.
O mundo é uma unidade interdependente que funciona ao abrigo de regras instituídas pelos governos. Hoje mais do que nunca.
Sem coabitação, mutuamente vantajosa, sem reciprocidade não há migração ou política de migração que se justifique.
De nada valem os esforços que extremistas tanto do Atlântico como do Índico empreendam em favor de dificuldades acrescidas no âmbito das actuais realidades migratórias.
Requer-se realismo e sentido de Estado na solução de qualquer problema que exista.
Convém não promover a disseminação de informação errónea, enganadora e eivava de fanatismo e raivas escondidas…
Hoje uns querem entrar em Moçambique. Ontem eram os Moçambicanos que sentiam necessidade de ir para os países vizinhos e outros. O Mundo acolheu muitos Moçambicanos que fugiam de políticas nacionais que os prejudicavam. Muitos Moçambicanos fugiram do governo que usava a repressão contra os que discordavam das suas políticas. Milhões de Moçambicanos foram acarinhados por muitos países quando Moçambique passou pelas dificuldades extremas sobejamente conhecidas. As dificuldades porque cada país passa não são todas iguais…
Há que ordenar o panorama de hoje e exigir que o governo moçambicano explore todas as vias para que se alcancem equilíbrios e uma reciprocidade de tipo novo e dinâmico.
Tem de se encontrar políticas que sejam benéficas para todos os países, reciprocamente.
Se no Mali ou na Nigéria é difícil os moçambicanos entrarem, também o mesmo deve acontecer em Moçambique para os nacionais daqueles países.
Angola não deve esperar tratamento especial para seus cidadãos em Moçambique enquanto as portas de Luanda não estiverem abertas do mesmo modo para os moçambicanos…
E quem fala destes países deverá ter em conta todos os outros. (Noé Nhantumbo)
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