domingo, 9 de junho de 2019

ISABEL DOS SANTOS E A PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA EM 2022



Uma notícia recente, que passou razoavelmente despercebida, foi a de que Victor Hugo Mendes declarou o seu apoio a Isabel dos Santos caso esta se candidatasse à presidência de Angola.
As mensagens delirantes de Tchizé têm ocupado o espaço mediático ocupado pelos filhos do antigo presidente, mas é em Isabel dos Santos que nos devemos focar, é  ela quem devemos levar a sério, mesmo que a afirmação de Victor Hugo Mendes, em si mesma, não tenha relevo.
A presidência de João Lourenço começou bem. O presidente da República iniciou uma retórica nova e de abertura, traduzida inicialmente em actos concretos. João Lourenço ganhou as suas esporas presidenciais, precisamente, com a exoneração de Isabel dos Santos da Presidência da Sonangol. Desde então, não custa perceber que Isabel se tornou a sua principal inimiga. Só ela tem capacidade financeira, rede de contactos e articulação internacional para fazer frente ao presidente. E é isso mesmo que tem feito, suave e discretamente, mas com efeitos desgastantes.
Por um lado, em Angola, Isabel tem encaixado os vários golpes que Lourenço lhe vai assestando, fazendo passar a mensagem de que é a maior empregadora privada do país – assim, que sentido pode fazer atacá-la, quando ela dá trabalho a tanta gente, quando produz tanto valor? Segundo os seus admiradores, ao atacá-la o governo está a prejudicar o desenvolvimento económico privado angolano. Este argumento tem percolado no país. Temos ouvido vários apoiantes de João Lourenço manifestando-se no sentido de ser necessário poupar Isabel, uma vez que ela é a maior empregadora do país. Com este argumento, Isabel dos Santos vai ganhando um capital de simpatia que não tinha no fim do mandato do pai, em Setembro de 2017.
Ao mesmo tempo, através das suas agências de comunicação e avençados, Isabel criou uma imensa barragem anti-João Lourenço nas redes sociais. Desde os falhanços do presidente nas tacadas de golfe no Mangais até à disseminação de relatórios técnicos críticos da política de Lourenço, tudo encontra o seu caminho nas redes. Ainda relativamente a Angola, aparecem várias consultoras “internacionais” críticas do presidente, que depois de devidamente investigadas têm sempre ligações a alguma empresa do círculo dos colaboradores do antigo presidente José Eduardo dos Santos.
A esta estratégia nacional adiciona-se uma estratégia internacional de Isabel, que assenta essencialmente em aparecer em locais de prestígio a falar em nome do futuro de Angola com pose de estadista. Muito recentemente, tivemo-la no Fórum Económico Internacional de São Petersburgo a ensaiar um discurso patriótico promovendo o investimento em educação para Angola. E o seu marido, Sindika Dokolo, ajuda. Vai criando fama de ser um coleccionador da arte africana de reputação impecável, aproximou-se do novo presidente da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi. Com estes activos, cria uma ideia de pan-africanismo cosmopolita que serve os interesses de Isabel.
Por outro lado, se João Lourenço ganhou as suas esporas com a exoneração de Isabel, caiu do cavalo com o “acordo” realizado com Jean-Claude Bastos de Morais, pelo qual Angola deixou de investigar criminalmente o antigo amigo e sócio de José Filomeno dos Santos, e gestor dos montantes do Fundo Soberano, em troca do acesso aos três biliões que estavam na sua alçada. Ficou assestado um golpe na credibilidade da luta anticorrupção.
Ultimamente, Lourenço tem-se revelado um presidente hesitante, desnorteado, sem domínio dos dossiers jurídicos e económicos, rodeado por uma clique que o engana, não faz descolar a economia. Está rodeado por pessoas que se apegaram às práticas de má governação e a esquemas altamente corruptos da era de José Eduardo dos Santos. O descontentamento começa a grassar. O povo, que se mostrou firme no apoio genuíno a João Lourenço, está outra vez à deriva, à mercê de falsos profetas.
Não invertendo o caminho que tem estado estranhamente a trilhar nos últimos meses, a sua popularidade rapidamente descerá, e as suas palavras deixarão de ter qualquer significado. Estiolará na presidência, não sendo reconduzido.
Não tem de ser assim. João Lourenço começou bem, exultou o país, espalhou confiança. Ultimamente perdeu-se, mas pode reencontrar a sua bússola.
Contudo, se não a reencontrar, está aberto o caminho para que Isabel dos Santos e familiares sejam os seus principais opositores e as vozes mais estridentes do coro de descontentamento. Com a oposição e a sociedade civil em estado dormente, os batuqueiros de José Eduardo dos Santos vão ganhando espaço e criando nostalgia à volta do homem que presidiu à pilhagem do país e afundou Angola. Por conta desse vazio, ao longo do tempo, a estratégia de comunicação de Isabel dos Santos causa a impressão de aumentar a sua fama como gestora e geradora de lugares de trabalho nas redes sociais. Mas, para o povo em geral, permanece a sua imagem de saqueadora. Todavia, com os seus contactos internacionais, tudo isto propiciará um momento que se poderá intensificar e levá-la a contribuir cada vez mais para o fim político da Presidência de Lourenço.
João Lourenço poderá sentir-se tentado a recorrer à repressão para impor a sua autoridade no meio de tanta fome e extraordinária incompetência por parte do seu governo. Este é o buraco que muitos dos seus já inimigos internos esperam que ele próprio cave para acabarem com a sua credibilidade.
Assim, a conclusão é simples, se João Lourenço não fizer o seu trabalho bem feito, não vale a pena pensar num segundo mandato. Quanto a Isabel dos Santos, mesmo que se candidate à presidência, também não passará. Nem o MPLA nem o povo se deixariam enganar pelo seu sorriso.
Talvez esta seja, afinal, a maior oportunidade para o Estado angolano se libertar do cativeiro do MPLA. Para que o Estado deixe de ser do MPLA e o MPLA deixe de ser o Estado. O próximo ano será decisivo para a redefinição das estratégias de governação e para a liderança do país.
Lourenço: acorde e faça história! Seja o homem da mudança. Faz coragem, camarada! o
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