quinta-feira, 20 de setembro de 2018

A PILHAGEM DO PAÍS ATRAVÉS DOS DIAMANTES



O delírio com que os dirigentes se dedicaram a pilhar o país, sob o alto patrocínio de José Eduardo dos Santos, devastou as Lundas. Nesta região de Angola, a miséria, a desumanização e a desolação das vilas e aldeias contrasta com a incomensurável riqueza dos diamantes.
As autoridades, dando seguimento à promessa anticorrupção de João Lourenço, têm vindo a cancelar os contratos mais prejudiciais para o estado angolano no que diz respeito à comercialização de diamantes. Todavia, pouco ou nada têm feito para esclarecer as perdas efectivas, e não têm aplicado as devidas medidas legais contra os assaltantes do tesouro nacional.
Por ora, o governo mantém-se opaco em relação ao sector dos diamantes. Por sua vez, o Maka Angola investiga de que forma, entre 2013 e 2017, só em dois projectos diamantíferos o Estado angolano e seus parceiros registaram o desaparecimento de mais de US $290 milhões. Estamos a falar da Sociedade Mineira do Cuango e da Sociedade Mineira do Chitotolo.
Em Junho passado, a Sociedade Mineira do Catoca, que opera a quinta maior mina diamantífera do mundo, revelou ter acumulado perdas no valor de US $464 milhões nos últimos seis anos. Estima-se que a Sodiam, até 2017, impôs preços de compra 24 por cento abaixo do valor real de mercado.
Carlos Sumbula, anterior presidente do Conselho de Administração da Endiama, que durante o período em questão também controlou a Sodiam, era o ponta-de-lança do esquema de defraudação do Estado, como adiante explicaremos. A Sodiam é detida em 99 por cento pela Endiama, e o Instituto Angolano de Participações do Estado (IAPE) detém um por cento.
Através do Decreto Executivo n.º 156/06, o então Ministério da Geologia e Minas estipulou que a Sodiam, empresa estatal, seria a “central de compra e venda” e o “canal único de comercialização” da produção nacional de diamantes.
Especialistas do sector explicam ao Maka Angola que, detendo o monopólio exclusivo da compra e venda de diamantes, a Sodiam passou a ditar um preço muito abaixo quer do valor do mercado internacional, quer dos preços estipulados pela maior multinacional do sector, a De Beers.
A diferença entre o preço imposto e o valor real do mercado não aumentava as receitas do Estado. Pelo contrário, alimentava o enriquecimento ilícito dos seus promotores. Carlos Sumbula, enquanto líder do esquema, deve explicações sobre o destino dado a estes fundos.
Por ordem do Estado, a Sodiam limitava-se a cobrar cinco por cento sobre o preço dos diamantes por si estabelecido, constituindo esta percentagem as suas receitas próprias. Ao Estado cabe ainda uma taxa de 2,5 por cento de imposto de renda sobre o preço de compra determinado pela mesma Sodiam.
De acordo com dados obtidos pelo Maka Angola, no período em causa, a fixação criminosa de preços baixos lesou o Estado, só em lucros da Endiama e em impostos, num total de US $180 milhões.
A Sociedade Mineira do Cuango tem como accionistas a Endiama (41 por cento), a ITM Mining (38 por cento) e a Lumanhe (21 por cento). Os mesmos accionistas constituem o consórcio da Sociedade Mineira do Chitotolo (com 45 por cento, 40 por cento e 15 por cento, respectivamente). A ITM Mining, segundo dados verificados por este portal, reclama perdas totais no valor de US $125 milhões, enquanto a Lumanhe as contabiliza em US $41 milhões.
Mas a Sodiam também reclama perdas. Como é possível tê-las registado ao mesmo tempo que a sua direcção literalmente roubava da empresa-mãe, a Endiama, e dos impostos pertencentes ao Estado?
A explicação oficial, por um lado, e a política dúbia das autoridades em relação ao sector diamantífero, por outro, fornecem algumas indicações importantes. A 22 de Junho passado, a Sodiam anunciou a cessação do “contrato preferencial de compra e venda de diamantes brutos” com a Odyssey Holding, baseada no Dubai.
Segundo o comunicado, a empresa estatal apenas registava perdas e “uma transferência de ganhos da operação da Sodiam para o cliente preferencial”, a Odyssey.
Mantendo-se impenetrável, a Sodiam nada mais disse de substancial, para além de se manifestar altamente endividada durante o período em que favorecia o enriquecimento fácil dos proprietários da Odyssey Holding e outras aventuras obscuras em que se envolveu. Nem sequer revela quem são os donos da Odyssey.
Em Dezembro passado, a Sodiam rescindiu a parceria a meias que detinha com Isabel dos Santos – a “bilionária dos ovos” – na Victoria Holding Limited, uma empresa registada em Malta. Esta, por sua vez, é a companhia-mãe da Victoria Limited, também criada em Malta, e que desde 2011 é proprietária de 72,5 por cento da famosa joalharia suíça De Grisogono.
Como o Estado angolano já reconheceu, a sua participação nesta aventura internacional de Isabel dos Santos, no mundo sedutor dos diamantes, era “exclusivamente com custos para a Sodiam”. Ademais, tal como a própria empresa estatal reconhece oficialmente, a Victoria Holding Limited apresentava “sistematicamente” resultados negativos, e a Sodiam não era tida nem achada na gestão do esquema de Isabel dos Santos.
Na verdade, era a filha de José Eduardo dos Santos quem controlava a comercialização de diamantes do Estado e as suas receitas, ainda que a responsabilidade primária coubesse a Carlos Sumbula, enquanto gestor público da Endiama e da Sodiam. No intrincado jogo de cumplicidades e de prática do velho aforismo “uma mão lava a outra”, a empresa privada de Sumbula, Mi-Diamond, também era parceira da Sodiam na compra de diamantes nas Lundas.
“Tem de haver um mercado livre sobre o qual o produtor deve agir. A Sodiam deve ser autónoma. Enquanto isso, o Catoca e outros produtores resistem agora vender à Sodiam”, explica um vendedor.
Aguardemos pelos devidos esclarecimentos e pelas diligências judiciais.

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