terça-feira, 8 de maio de 2018

Trump retira EUA do acordo nuclear com o Irão:

 “Este é um acordo horroroso nunca devia ter existido”

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Donald Trump anunciou a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irão, em vigor desde janeiro de 2016. O Presidente dos EUA justificou a sua decisão em parte em apresentação de Netanyahu.
Zach Gibson / POOL/EPA
O Presidente dos EUA, Donald Trump, anunciou a retirada do acordo nuclear do Irão, tornando obsoleto aquele entendimento internacional que visava impedir o acesso de Teerão a armas químicas.
“Este acordo desastroso deu a este regime muitos milhões de dólares, alguns em dinheiro vivo, o que é uma vergonha para mim enquanto cidadão e para todos os cidadãos dos EUA”, disse Donald Trump numa declaração esta terça-feira. “Não vamos permitir que cidades americanas sejam ameaçadas com destruição e não vamos permitir que um regime que pede ‘morte para a América’ tenha acesso às armas mais mortíferas do planeta.”
“Temos provas definitivas de que esta promessa é uma mentira”, referiu-se ao compromisso do Irão, firmado em 2015,
Os EUA fizeram parte do processo negocial deste acordo, que começou a ser preparado em 2013, ainda sob a alçada de Barack Obama, e que entrou em vigor em janeiro de 2016. Meses depois, já em campanha eleitoral, Donald Trump prometeu retirar os EUA deste acordo — promessa que concretiza agora.
“Os EUA já não fazem promessas vãs. Quando eu faço promessas, eu mantenho-as”, sublinhou Donald Trump, que anunciou ainda que vão ser implementadas “sanções poderosas” contra o Irão.
Ao saírem do acordo nuclear com o Irão, os EUA passam a ser o único país com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas a não fazer parte do acordo. Esta saída é vista com relutância por parte da União Europeia, tal como da totalidade dos restantes países que assinaram o acordo com o Irão. Ou seja, França, Reino Unido, Alemanha, China e Rússia.
As autoridades do Reino Unido, França, Alemanha e a representante da política externa da UE declararam já o seu apoio ao acordo com o Irão, num encontro com o vice-ministro das Relações Exteriores do Irão, Abbas Araghchi, em Bruxelas, esta terça-feira, horas antes da declaração de Trump.
Segundo o The Guardian, a  Europa implementaria um novo acordo com o Irão, o Plano de Ação Integral Conjunto, desde que o Irão cumpra as suas obrigações.
“Nós, europeus, continuamos a confiar no JCPoA e na sua implementação total, a partir de nossos próprios interesses de política de segurança”, disse a fonte. “Os acordos de transparência e controle do JCPoA e as restrições do programa nuclear iraniano trouxeram um aumento na segurança”, disse a fonte, acrescentando que seria importante que todos os lados mantivessem contato “para evitar uma escalada descontrolada”.
Trump anuncia oficialmente a decisão às 19h00 de Lisboa, desta terça-feira.

O que é o acordo nuclear com o Irão e porque é que Trump o quer rasgar?

As sanções podem voltar a atingir a economia iraniana se o acordo nuclear sofrer um revés
ATTA KENARE/GETTY

Mais de 60% dos americanos querem que o acordo nuclear com Irão continue em vigor mas Donald Trump deverá retirar esta terça-feira os Estados Unidos do documento assinado em 2015 e que é defendido pela grande maioria dos aliados europeus

Durante mais de dez anos, o Ocidente preocupou-se com a possibilidade de que o Irão, um regime xiita, profundamente religioso e conservador, pudesse estar a desenvolver capacidade nuclear colocando em risco alguns dos (poucos) aliados no Médio Oriente que tanto os Estados Unidos como os seus aliados europeus ainda mantêm. Quando o Plano Conjunto de Ação foi assinado, esse perigo dissipou-se um pouco mas a sombra do seu regresso voltou a aparecer esta terça-feira quando um artigo do “The New York Times” dava conta das intenções de Donald Trump em rasgar o acordo assinado ainda durante a administração de Barack Obama, antigo Presidente dos Estados Unidos.
O Plano Conjunto de Ação (ou Joint Comprehensive Plan of Action - JCPOA -, em inglês) é um acordo firmado a 14 de julho de 2015 em Viena pelo Irão e pelos países com assento no Conselho de Segurança da ONU, mais a Alemanha, e que visa restringir a capacidade do Irão desenvolver armas nucleares.
O Irão sempre disse que todas as suas atividades de produção e enriquecimento de urânio tinham fins pacíficos (como a produção de energia, a agricultura ou os avanços médicos), mas o Ocidente nunca acreditou e optou por impor ao regime iraniano algumas das mais pesadas sanções económicas conhecidas até à data. Só entre 2012 e 2016 a economia do Irão perdeu mais de 118 mil milhões de dólares (cerca de 93 mil milhões de euros) apenas no que toca às transações de petróleo, matéria-prima do qual é o quinto maior produtor do mundo. Depois do acordo, a economia cresceu 12,5% e mais de 100 mil milhões de dólares (cerca de 83 mil milhões de euros) “congelados” noutros país voltaram a circular.
Para voltar a poder transacionar a sua mais preciosa mercadoria, o Irão aceitou desligar dois terços das suas centrifugadoras nucleares, exportar o urânio enriquecido que já tinha (para a Rússia neste caso) e encher os seus reatores de cimento como forma de os inviabilizar para sempre. Claro que a aceitação destas medidas não pressupõe a sua implementação mas o Irão aceitou a monitorização exaustiva da redução das suas capacidades nucleares e, dos dez relatórios até agora publicados pela Agência Internacional de Energia Atómica, nenhum dá conta de que o Irão esteja a quebrar as regras.
Antes de julho de 2015, escreve a BBC, o Irão tinha um “stock” de quase 20 mil centrifugadoras, o suficiente para criar entre oito e 10 bombas. Na altura, os negociadores de Obama garantiam que se o Irão decidisse mesmo fabricar uma bomba nuclear conseguiria fazê-lo em “dois ou três meses” - o tempo que demoraria a, com aquela quantidade de centrifugadoras, a conseguir urânio enriquecido a 90% (ou urânio de ‘standard nuclear’). No total, a quantidade de urânio disponível em todo o país, para qualquer atividade, foi reduzida em 98%.

PORQUE É QUE TRUMP QUE SAIR DO ACORDO?

Uma das principais promessas eleitorais de Donald Trump foi reverter quase tudo o que caracterizou a presidência de Obama. Alguns analistas dizem que a intransigência em relação a um acordo nuclear que efetivamente fez aquilo a que se propunha - incapacitar o Irão de produzir armas nucleares - é motivada por esse desejo de se afastar por completo daquilo que Obama fez. Isto apesar de 63% dos norte-americanos, segundo uma sondagem divulgada segunda-feira pela CNN, se mostrarem favoráveis ao acordo.
Ele próprio prometeu “desmantelar o acordo”, que classificou “o pior de sempre” para os Estados Unidos e o “melhor de sempre” para o Irão. Em janeiro, Trump assinou mais um adiamento da imposição de sanções (o que tem que ser feito a cada 120 dias) mas disse que seria o último se não houvesse um esforço para se chegar a um novo acordo. Esse novo acordo, no entender de Trump, não contempla como devia o comportamento desviante do Irão no Médio Oriente; o seu programa de construção de mísseis balísticos, que são, por sua vez, fornecidos a milícias consideradas terroristas pelos Estados Unidos, como é o caso do libaneses do Hezbollah; e o facto de que algumas destas restrições ao desenvolvimento de armas nucleares serão progressivamente levantadas.
As razões exatas desta quebra com o resto dos países que assinaram o acordo - e que continuam preparados para o honrar mesmo na ausência da assinatura de Trump - são pouco claras, mas o posicionamento de Trump pode ser uma espécie de aviso à navegação para Kim Jong-un, que se deverá encontrar com o presidente dos EUA em Singapura já em junho. Negando ao Irão estas “benesses”, Trump deixa subentendido que a Coreia do Norte não deve esperar qualquer complacência da parte da equipa de negociadores norte-americanos. Mas ao contrário do que Trump diz, o acordo não irá dar ao Irão a possibilidade de voltar a desenvolver um arsenal nuclear assim tão cedo. Até 2018 nada muda e a maioria das restrições mantém-se até 2035. A proibição à produção nuclear com fins bélicos não tem prazo para acabar e também não está definido um prazo para o fim da monitorização por parte da Agência Internacional de Energia Atómica.

O QUE DIZ O IRÃO?

O Irão tem optado por uma mistura de duas posições: conciliatória com a Europa e desafiadora com os Estados Unidos. “Um homem que gere um país pode criar alguns problemas durante alguns meses mas nós vamos ultrapassar esses problemas. Sob sanções ou não, vamos conseguir erguer-nos pelos nossos próprios pés”, disse o Presidente iraniano, Hassan Rouhani. Já o presidente da Divisão de Direitos Humanos da Judiciária, Mohammad Javad Larijani, uma figura das mais conservadoras do Irão, disse que seria impossível permanecer num acordo sem os Estados Unidos, segundo uma notícia da agência de notícias Tasnim.

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