Análise Por Benedito Marime
São 21 horas de sexta-feira, dia 24 de Agosto. Estou aterradíssimo.
Depois de ter lido na imprensa, nos dias 20 e 22 do mesmo mês, arengas de um tal “MIMO” e de um não menos despiciendo “Conselho de Álimos de Nampula”, a que se seguiu uma série de actos lesivos da normalidade democrática, protagonizados por essa cambada, pelo que acabei de ver, nos jornais televisivos desta noite, sinto, cada vez mais próximo, aquilo que sempre temi e contra o qual, para as páginas dos jornais, desde 1995 venho lutando: a instauração em Moçambique de um Estado Teocrático Islâmico, obviamente precedido de uma Jihad (Guerra santa!) que grupos integristas visando fins políticos alegam ou fingem protagonizar, apenas e só por motivos “religiosos”, que dizem representar.
Este é o primeiro equívoco.
Os que se assinam para as páginas dos jornais, pretensamente em nome dos “muçulmanos”, da “comunidade asiática”, etc., não podem apresentar nenhum documento que os credencie para se pronunciarem como tais, a despeito de ostentarem títulos de Sheiks, Imamos, e sei lá que mais. Igualmente não podem provar procuração da parte da “comunidade asiática”. Talvez seja mais fácil para nós outros, com referência a alguns dos que os vimos desfilar nos ecrãs, identificá-los como mainatos dos antecedentes, que os usam a eles como a inocentes úteis.
Todos eles, aqueles e estes, se representam
a si próprios, aos interesses obscuros que lhes interessam, mormente quando reclamam
tratamento de excepção religiosa, no quadro constitucional de um Estado Laico.
Querem impor lenços e burkas às suas fêmeas? Façam-no nos seus recintos religiosos, se tal for ali requerido. Não devem, é, pretender que, numa escola pública, por exemplo, possam modificar, acrescentando ou suprimindo peças de fardamento ao que já está fixado em diploma legal, dimanado de entidade competente. Aliás, existem escolas corânicas ou outras particulares, de orientação
corânica, onde bem podem normar para lá nesse sentido. Aí, com toda a legitimidade.
O segundo equívoco é o de nem terem ideia do peso do universo que dizem representar.
Se fosse verdade que este bando de tratantes representasse “a comunidade muçulmana” ou “a comunidade asiática”, haveria a dizer que, nem por isso, constituiriam qualquer ameaça eleitoral ao Partido Frelimo. Pelo último censo populacional, e cito de memória, a “comunidade muçulmana” não ultrapassa 20% do universo da população nacional. E não estamos a falar do universo de eleitores. Mais ainda, neste percentual, a maioria claramente não integra a “comunidade asiática”. Contas feitas, e por extrapolação minha, talvez só representassem, na melhor das hipóteses, 8% do universo eleitoral.
E não é líquido que cada um dos que perfazem os 8% iria seguir a “orientação eleitoral” do “Conselho de Álimos de Nampula” ou do “MIMO” (que trampa é esta? É a nova versão do PIMO?). De resto, a nossa História de processos eleitorais permite-me afirmar que nunca os resultados à boca das urnas amedrontarão o Partido Frelimo que, vivendo de expedientes, tem sempre a seu favor o essencial dos resultados eleitorais. A saída desse Partido da governação do país, pelo menos para os tempos mais próximos, não me parece que venha a ser possível por via das urnas. Oxalá, para bem da democracia e do Estado de Direito, eu esteja enganado!
Vamos, agora, ver o terceiro equívoco deste grupo de agitadores.
Pelos vistos, o “Conselho de Álimos de Nampula” e “a comunidade muçulmana” não gostaram das circulares 1387/2012 e 06/GM/MINED/2012, de 31 de Julho e de 10 de Agosto, respectivamente.
Têm toda a legitimidade para o fazer. Não tendo concordado, o caminho a seguir, para atacar actos normativos do Governo é o Contencioso, via Tribunal Administrativo ou Conselho Constitucional. Ao refilarem, nos termos em que o fizeram ou a ameaçarem o Governo, tal como também o fizeram, incorreram, no mínimo numa censura cívico-moral, se não mesmo num ilícito penal. Peço a quem de direito para investigar isto e, por consequência, agir em conformidade. A lei é para ser cumprida e é para todos, Álimos e asiáticos incluídos.
Um quarto equívoco podemos encontrá-lo na exposição que o “Conselho de Álimos de Nampula” terá dirigido ao Conselho de Ministros, segundo o qual “a comunidade muçulmana” “(…) contribuiu desde a fase pré-colonial, colonial e pós-colonial até aos nossos dias, de grande forma, para os diferentes aspectos de agenda de desenvolvimento deste país, sem necessidade de se especificar”. Desta vez, trata-se daquilo que ela identifica como as grandes partes em que se divide a História deste País. Os pulhas da exposição supra, numa clara amostra de que, de moçambicanos, só têm o nome, não conseguem ter outra referência para si, se não a do colonialismo, quiçá porque os acomodou e nós outros o não advertimos a tempo. Pois, até aqui, eu cuidava que poderíamos falar da Época de formação dos Estados bantu e afro-árabes, por um lado; da Noite imperialista e colonial até à Luta Armada de Libertação Nacional, por outro; e desta à Independência Nacional, a era que estamos a viver e, Deus queira, vivam para sempre os nossos descendentes, num Moçambique único e unido do Rovuma ao Maputo, se estes agitadores políticos e outros, oportunisticamente a eles associados, o não vierem a conseguir desfazer.
Entretanto, e só para reavivar a memória do “Conselho de Álimos de Nampula”: na época pré-colonial, os ascendentes de muitos deles vendiam gato por lebre, nas transacções com os nativos do nosso actual território – ouro, por espelhos; marfim, por missangas.
É deste “contributo” que se orgulham? Na Época colonial, não os vimos na denúncia contra a situação colonial, ao contrário dos Baneanes (Hindus), por exemplo, embora estes, fiéis aos sistemas de casta, vigentes na Índia, nunca se misturassem com os nativos.
Curiosamente, quando Salazar, em 1962, retaliando à invasão de Goa por Nehru, expulsou os Baneanes de Moçambique (as pouquíssimas famílias que ficaram não tinham nacionalidade indiana), foram os ascendentes dos actuais moçambicanos de origem paquistanesa quem recebeu, por adjudicação directa e até oferta, os bens dos Baneanes espoliados!
Dá para se orgulharem disso?
Na epopeia da Luta Armada de Libertação Nacional, os casos de elementos dessa origem que ali estiveram, foram casos excepcionalmente pontuais.
E esses não integram o grupo dos agitadores de que estamos a falar. Proclamada a Independência Nacional, muitos daqueles, ou, desde logo, por ele não optaram, ou a não pediram, podendo fazê-lo ou renunciaram à nacionalidade moçambicana, tendo, porém, fugido para muitos lados, entre eles Paquistão e Arábia Saudita, onde foram aprender a subversão, que, agora, praticam, impunemente, à luz do dia. Durante a tragédia da Guerra dos 16 anos, alguns destes conspiraram para o desembarque de armas na costa índica, a partir de países como Somália, Qatar, Oman, dessa forma contribuindo para o acirrar daquela triste carnificina entre nós. É disso que também se orgulham? Nas negociações de paz, que conduziram ao AGP, não os vimos, mas vieram às centenas, estabelecida a paz, pedir, uns a aquisição e outros a reaquisição da nacionalidade moçambicana – vejam-se, semanas inteiras, de B.R., I Série, dos anos 93-96! Vinham já para isto, pelo que se vê!
Apesar deste quarto equívoco, num ponto eles aceitaram em cheio, em termos de eficácia: já cheira a petróleo, até agora confirmado para o Norte do país, pelo que é sintomático que esta agitação, começada em Nampula, sob a batuta do Sheik Ismael Abudo, a 12 de Agosto de 2012, logo no dia 21 houvesse sido tema de Conselho de Ministros e no dia 22, um outro grupo, com bastantes caras do Maputo, capitaneado pela sinistra figura do Sheik Aminuddin (este, quanto a mim, um perigoso doutrinador extremista que, em doses pequenas, mas eficazes, vai testando, nos seus artigos a capacidade de adversa reacção da opinião pública ao veneno neles instilado: verificada ser mínima ou nula, apareceu, neste caso, à grande, em pessoa, à frente do grupo, a arengar com autoridade e aceitação do mesmo), a impor-se ao Governo, que cedeu, quando e onde nunca deveria ter cedido!
Interrompo, por agora, a enumeração dos equívocos do “Conselho de Álimos de Nampula” e da “comunidade muçulmana”, para lamentar essa postura de cedência do Governo, pelas razões que já acima indiquei, a que acrescento as seguintes: muitos há que têm tentado protestar contra isto e contra aquilo, de forma organizada, usando do direito legal de reunião e de manifestação – posso citar, apenas o caso dos desmobilizados, a título meramente exemplificativo. A estes, o Governo tem respondido por via da força, mobilizando efectivos para os dispersar e a não poucos tem levado à cadeia, em cenários claramente discutíveis, ainda antes de julgamento.
Quando apareceram estes tratantes a rosnar ameaças que, apesar do tom arrogante, objectivamente, não podem cumprir, o Governo cedeu de imediato, sem se aperceber do gravíssimo precedente que abriu.
Fica, agora, claro que, para esses, talvez porque, além daquelas agremiações, alegam representar também a “comunidade asiática” (na altura, isso não foi dito, mas pode supor-se, até porque – dizia Salazar – em política, o que parece é!), a regra é outra: paninhos quentes para eles, nem que seja vilipendiando um dos seus membros, neste caso o Ministro da Educação, que até tinha razão, ali, quase que em pose de réu. Confesso que fiquei indignadíssimo ao ver o Dr. Zeferino Martins reunido, ao lado da Ministra da Justiça, com aquele bando de guedelhudos fedorentos e de barba piolhosa, em tom triunfante, diante do humilhado Ministro. Dr. Zeferino Martins, da parte deste humilde cidadão, aqui vai o meu abraço de desagravo, pela humilhação em que foi obrigado a incorrer!
Deus lhe pague; e digo-o como cristão que sou, que lhe promete oração nesse sentido.
Como resultado da vitória obtida na quarta-feira, dia 22, e a partir do sequestro de uma donzela na noite de quinta-feira, decorreram, na sexta-feira em que escrevo, duas reuniões, desta vez, da “comunidade muçulmana”, da “comunidade asiática”, da “comunidade ismaelita” e da “comunidade hindu”.
No final desses encontros, foram dados avisos, claros e precisos, sobre o que estas comunidades exigem. Não tenho à mão o teor dos mesmos, mas fixei que o Governo deve tomar a sério o problema dos raptos, sob pena de algumas vindictas, designadamente: passeatas (é o termo!) a nível de todo o país, com concentração junto do Ministério do Interior; fecho dos seus estabelecimentos comerciais e industriais e recusa de cumprimento de obrigações fiscais.
Por fim, que desejariam “um encontro ao mais alto nível”, para um diálogo sobre a situação de insegurança que afecta, sobretudo, as “comunidades” emitentes do pronunciamento.
Mais uma vez, outros equívocos:
O quinto equívoco resulta do simplismo com que se pretende encontrar o busílis desta tragédia. Importa dizer que, desde que os mesmos começaram a ser notícia, três foram esclarecidos: o da senhora da comunidade ismaelita; o dos adolescentes mortos e o do menino que ia a ser vendido pela mãe, numa acção de vingança contra o pai. Coincidentemente, dos casos até agora não esclarecidos, todos são referentes a este grupo de integrantes da “comunidade muçulmana”.
Não dará isto substância aos que alegam que vítimas, mandantes, beneficiários e cúmplices, se situam todos no interior do grupo, a tal ponto que a Polícia, vezes sem conta, se queixa de falta de colaboração?!
Por via disso, já houve, até, quem dissesse que se desconfiava que os sequestros podiam ser uma das novas formas de transferência ilícita de capitais, por orquestração!
Pelo respeito que vítimas e suas famílias me merecem, espero bem que tal não seja o caso.
O sexto equívoco é o de que o país tem empresários “muçulmanos”, “asiáticos”, “hindus”, “ismaelitas” e por aí fora. Não os há. Existem, sim, muçulmanos, asiáticos, hindus e outros que são empresários, o que é diferente!
Aliás, na mesma linha, seria bom que se esclarecesse, de uma vez por todas, que muitos dos que, no nosso País, se intitulam asiáticos não o são, a despeito de poderem invocar uma ténue ascendência asiática, de há duas ou mais gerações atrás; o que têm é uma epiderme diferente, na defesa da qual, por racismo, não querem ser havidos por moçambicanos, para não serem confundidos com a maioria Negra: esse é o caso! E é pena que, exactamente, por insistirem em ser asiáticos, nunca se integram, sentindo-se moçambicanos, filhos deste grande País que a todos os seus filhos acolhe, independentemente da cor da pele ou da religião. Veja-se, por exemplo, que nunca ninguém falou da “comunidade goesa” ou da “comunidade europeia”, a despeito de haver cidadãos moçambicanos dessas origens.
O sétimo equívoco vem do sentimento de que as ditas comunidades poderiam motivar os seus integrantes à greve fiscal.
A submissão ao Fisco, uma vez existente a respectiva incidência, é compulsória, sob pena de penhora de bens até ao montante correspondente. Tentem a greve. Quem sabe se, não hesitando o Governo, por via da penhora, pelo Fisco, de pecúlios provindos, não poucas vezes de traficância, se poderia, finalmente, dar início a um programa empresarial de “acção afirmativa”, à custa dessa greve?!
Idi Amin Dada, um muçulmano convicto, quando se apercebeu do comportamento destas “comunidades”, nomeadamente na sobre-exploração da maioria populacional e na agitação política, a pretexto da religião, não hesitou em fazê-lo. Se houver a mesma coragem, aqui, sem se mandar embora ninguém, as ervas daninhas secarão por si e, na seguinte estação das chuvas, de novos pastos e novos pastores passará o País a dispor.
Quanto aos demais pronunciamentos, se as passeatas cumprirem o estipulado na lei, serão um salutar acto de cidadania.
Que o Governo o permita e, a partir daqui, não só a estes. Ao Senhor Presidente da República peço que, em nome da dignidade da sua função de Chefe de Estado, se não humilhe, cedendo à intimação de, sob pressão, conceder a estes grupos, por agora e para o que de momento exigem ou ameaçam, o pretendido “encontro ao mais alto nível”!
Termino com um alerta: aos ismaelitas e aos hindus presentes nestas acções de concertação da “comunidade asiática”, a cargo da “comunidade muçulmana”: a História das vossas seculares relações tem sido de tudo, menos pacífica. Não vos deixeis enganar.
Quando conseguirem o que querem, largar-vos-ão, como de costume, se possível depois de vos comprometerem.
O mesmo pedido faço aos inocentes úteis, (aos cafres, como eles nos chamavam!): nos primórdios da História islâmica, aparece Bilal, sim, mas como escravo de uma ilustre figura árabe. Fugi desse papel, e não aceiteis ser mainatos desse grupo! Vede que, no nosso País, o Islão está implantado há mil anos, a ele tendo aderido largas dezenas de milhares de compatriotas.
Isso nunca foi objecto de conflitos entre nós. Temos, aqui mesmo no Maputo, confrarias islâmicas bicentenárias e património imobiliário que atesta a inserção do Islão nativo (Anuaril Issilamo, Comunidade Mahometana, etc.) que convive pacificamente com outros credos e cumpre a lei do Estado.
Mais recentemente, apareceram o Congresso Islâmico de Moçambique e o Conselho Islâmico de Moçambique. Foi deste último que começaram a emergir alguns dos mentores dos problemas de que a presente crise é, apenas, a ponta do iceberg.
Ao Governo, solicito que, não havendo espaço para ceder à chantagem deste grupo de agitadores, que não passa de pura bravata, mantenha a laicidade das escolas públicas, cumprindo-se, exactamente, como até aqui, sem excepções de grupos, nem de épocas lectivas.
Seria, também, de desejar que, em respeito à mesma laicidade, os dignitários do Estado exigissem, nas audiências, que os que as solicitam se apresentassem em traje civil e não com indumentária religiosa (estilo Sibindi, que até perante o Chefe de Estado se apresenta de bastão – será bastão de Marechal da Jihad?!). Creio que, por estas e por outras razões, deveria passar pelo Parlamento, com carácter de urgência, uma Lei de Liberdade Religiosa, que reafirme e regule, em pormenor, o exercício da garantia de que Moçambique é um Estado Laico, conforme sucessivamente reafirmado no nosso ordenamento constitucional.
Por um Moçambique de todos e para todos. A Luta continua!
Canal de Moçambique – 29.08.2012
Querem impor lenços e burkas às suas fêmeas? Façam-no nos seus recintos religiosos, se tal for ali requerido. Não devem, é, pretender que, numa escola pública, por exemplo, possam modificar, acrescentando ou suprimindo peças de fardamento ao que já está fixado em diploma legal, dimanado de entidade competente. Aliás, existem escolas corânicas ou outras particulares, de orientação
corânica, onde bem podem normar para lá nesse sentido. Aí, com toda a legitimidade.
O segundo equívoco é o de nem terem ideia do peso do universo que dizem representar.
Se fosse verdade que este bando de tratantes representasse “a comunidade muçulmana” ou “a comunidade asiática”, haveria a dizer que, nem por isso, constituiriam qualquer ameaça eleitoral ao Partido Frelimo. Pelo último censo populacional, e cito de memória, a “comunidade muçulmana” não ultrapassa 20% do universo da população nacional. E não estamos a falar do universo de eleitores. Mais ainda, neste percentual, a maioria claramente não integra a “comunidade asiática”. Contas feitas, e por extrapolação minha, talvez só representassem, na melhor das hipóteses, 8% do universo eleitoral.
E não é líquido que cada um dos que perfazem os 8% iria seguir a “orientação eleitoral” do “Conselho de Álimos de Nampula” ou do “MIMO” (que trampa é esta? É a nova versão do PIMO?). De resto, a nossa História de processos eleitorais permite-me afirmar que nunca os resultados à boca das urnas amedrontarão o Partido Frelimo que, vivendo de expedientes, tem sempre a seu favor o essencial dos resultados eleitorais. A saída desse Partido da governação do país, pelo menos para os tempos mais próximos, não me parece que venha a ser possível por via das urnas. Oxalá, para bem da democracia e do Estado de Direito, eu esteja enganado!
Vamos, agora, ver o terceiro equívoco deste grupo de agitadores.
Pelos vistos, o “Conselho de Álimos de Nampula” e “a comunidade muçulmana” não gostaram das circulares 1387/2012 e 06/GM/MINED/2012, de 31 de Julho e de 10 de Agosto, respectivamente.
Têm toda a legitimidade para o fazer. Não tendo concordado, o caminho a seguir, para atacar actos normativos do Governo é o Contencioso, via Tribunal Administrativo ou Conselho Constitucional. Ao refilarem, nos termos em que o fizeram ou a ameaçarem o Governo, tal como também o fizeram, incorreram, no mínimo numa censura cívico-moral, se não mesmo num ilícito penal. Peço a quem de direito para investigar isto e, por consequência, agir em conformidade. A lei é para ser cumprida e é para todos, Álimos e asiáticos incluídos.
Um quarto equívoco podemos encontrá-lo na exposição que o “Conselho de Álimos de Nampula” terá dirigido ao Conselho de Ministros, segundo o qual “a comunidade muçulmana” “(…) contribuiu desde a fase pré-colonial, colonial e pós-colonial até aos nossos dias, de grande forma, para os diferentes aspectos de agenda de desenvolvimento deste país, sem necessidade de se especificar”. Desta vez, trata-se daquilo que ela identifica como as grandes partes em que se divide a História deste País. Os pulhas da exposição supra, numa clara amostra de que, de moçambicanos, só têm o nome, não conseguem ter outra referência para si, se não a do colonialismo, quiçá porque os acomodou e nós outros o não advertimos a tempo. Pois, até aqui, eu cuidava que poderíamos falar da Época de formação dos Estados bantu e afro-árabes, por um lado; da Noite imperialista e colonial até à Luta Armada de Libertação Nacional, por outro; e desta à Independência Nacional, a era que estamos a viver e, Deus queira, vivam para sempre os nossos descendentes, num Moçambique único e unido do Rovuma ao Maputo, se estes agitadores políticos e outros, oportunisticamente a eles associados, o não vierem a conseguir desfazer.
Entretanto, e só para reavivar a memória do “Conselho de Álimos de Nampula”: na época pré-colonial, os ascendentes de muitos deles vendiam gato por lebre, nas transacções com os nativos do nosso actual território – ouro, por espelhos; marfim, por missangas.
É deste “contributo” que se orgulham? Na Época colonial, não os vimos na denúncia contra a situação colonial, ao contrário dos Baneanes (Hindus), por exemplo, embora estes, fiéis aos sistemas de casta, vigentes na Índia, nunca se misturassem com os nativos.
Curiosamente, quando Salazar, em 1962, retaliando à invasão de Goa por Nehru, expulsou os Baneanes de Moçambique (as pouquíssimas famílias que ficaram não tinham nacionalidade indiana), foram os ascendentes dos actuais moçambicanos de origem paquistanesa quem recebeu, por adjudicação directa e até oferta, os bens dos Baneanes espoliados!
Dá para se orgulharem disso?
Na epopeia da Luta Armada de Libertação Nacional, os casos de elementos dessa origem que ali estiveram, foram casos excepcionalmente pontuais.
E esses não integram o grupo dos agitadores de que estamos a falar. Proclamada a Independência Nacional, muitos daqueles, ou, desde logo, por ele não optaram, ou a não pediram, podendo fazê-lo ou renunciaram à nacionalidade moçambicana, tendo, porém, fugido para muitos lados, entre eles Paquistão e Arábia Saudita, onde foram aprender a subversão, que, agora, praticam, impunemente, à luz do dia. Durante a tragédia da Guerra dos 16 anos, alguns destes conspiraram para o desembarque de armas na costa índica, a partir de países como Somália, Qatar, Oman, dessa forma contribuindo para o acirrar daquela triste carnificina entre nós. É disso que também se orgulham? Nas negociações de paz, que conduziram ao AGP, não os vimos, mas vieram às centenas, estabelecida a paz, pedir, uns a aquisição e outros a reaquisição da nacionalidade moçambicana – vejam-se, semanas inteiras, de B.R., I Série, dos anos 93-96! Vinham já para isto, pelo que se vê!
Apesar deste quarto equívoco, num ponto eles aceitaram em cheio, em termos de eficácia: já cheira a petróleo, até agora confirmado para o Norte do país, pelo que é sintomático que esta agitação, começada em Nampula, sob a batuta do Sheik Ismael Abudo, a 12 de Agosto de 2012, logo no dia 21 houvesse sido tema de Conselho de Ministros e no dia 22, um outro grupo, com bastantes caras do Maputo, capitaneado pela sinistra figura do Sheik Aminuddin (este, quanto a mim, um perigoso doutrinador extremista que, em doses pequenas, mas eficazes, vai testando, nos seus artigos a capacidade de adversa reacção da opinião pública ao veneno neles instilado: verificada ser mínima ou nula, apareceu, neste caso, à grande, em pessoa, à frente do grupo, a arengar com autoridade e aceitação do mesmo), a impor-se ao Governo, que cedeu, quando e onde nunca deveria ter cedido!
Interrompo, por agora, a enumeração dos equívocos do “Conselho de Álimos de Nampula” e da “comunidade muçulmana”, para lamentar essa postura de cedência do Governo, pelas razões que já acima indiquei, a que acrescento as seguintes: muitos há que têm tentado protestar contra isto e contra aquilo, de forma organizada, usando do direito legal de reunião e de manifestação – posso citar, apenas o caso dos desmobilizados, a título meramente exemplificativo. A estes, o Governo tem respondido por via da força, mobilizando efectivos para os dispersar e a não poucos tem levado à cadeia, em cenários claramente discutíveis, ainda antes de julgamento.
Quando apareceram estes tratantes a rosnar ameaças que, apesar do tom arrogante, objectivamente, não podem cumprir, o Governo cedeu de imediato, sem se aperceber do gravíssimo precedente que abriu.
Fica, agora, claro que, para esses, talvez porque, além daquelas agremiações, alegam representar também a “comunidade asiática” (na altura, isso não foi dito, mas pode supor-se, até porque – dizia Salazar – em política, o que parece é!), a regra é outra: paninhos quentes para eles, nem que seja vilipendiando um dos seus membros, neste caso o Ministro da Educação, que até tinha razão, ali, quase que em pose de réu. Confesso que fiquei indignadíssimo ao ver o Dr. Zeferino Martins reunido, ao lado da Ministra da Justiça, com aquele bando de guedelhudos fedorentos e de barba piolhosa, em tom triunfante, diante do humilhado Ministro. Dr. Zeferino Martins, da parte deste humilde cidadão, aqui vai o meu abraço de desagravo, pela humilhação em que foi obrigado a incorrer!
Deus lhe pague; e digo-o como cristão que sou, que lhe promete oração nesse sentido.
Como resultado da vitória obtida na quarta-feira, dia 22, e a partir do sequestro de uma donzela na noite de quinta-feira, decorreram, na sexta-feira em que escrevo, duas reuniões, desta vez, da “comunidade muçulmana”, da “comunidade asiática”, da “comunidade ismaelita” e da “comunidade hindu”.
No final desses encontros, foram dados avisos, claros e precisos, sobre o que estas comunidades exigem. Não tenho à mão o teor dos mesmos, mas fixei que o Governo deve tomar a sério o problema dos raptos, sob pena de algumas vindictas, designadamente: passeatas (é o termo!) a nível de todo o país, com concentração junto do Ministério do Interior; fecho dos seus estabelecimentos comerciais e industriais e recusa de cumprimento de obrigações fiscais.
Por fim, que desejariam “um encontro ao mais alto nível”, para um diálogo sobre a situação de insegurança que afecta, sobretudo, as “comunidades” emitentes do pronunciamento.
Mais uma vez, outros equívocos:
O quinto equívoco resulta do simplismo com que se pretende encontrar o busílis desta tragédia. Importa dizer que, desde que os mesmos começaram a ser notícia, três foram esclarecidos: o da senhora da comunidade ismaelita; o dos adolescentes mortos e o do menino que ia a ser vendido pela mãe, numa acção de vingança contra o pai. Coincidentemente, dos casos até agora não esclarecidos, todos são referentes a este grupo de integrantes da “comunidade muçulmana”.
Não dará isto substância aos que alegam que vítimas, mandantes, beneficiários e cúmplices, se situam todos no interior do grupo, a tal ponto que a Polícia, vezes sem conta, se queixa de falta de colaboração?!
Por via disso, já houve, até, quem dissesse que se desconfiava que os sequestros podiam ser uma das novas formas de transferência ilícita de capitais, por orquestração!
Pelo respeito que vítimas e suas famílias me merecem, espero bem que tal não seja o caso.
O sexto equívoco é o de que o país tem empresários “muçulmanos”, “asiáticos”, “hindus”, “ismaelitas” e por aí fora. Não os há. Existem, sim, muçulmanos, asiáticos, hindus e outros que são empresários, o que é diferente!
Aliás, na mesma linha, seria bom que se esclarecesse, de uma vez por todas, que muitos dos que, no nosso País, se intitulam asiáticos não o são, a despeito de poderem invocar uma ténue ascendência asiática, de há duas ou mais gerações atrás; o que têm é uma epiderme diferente, na defesa da qual, por racismo, não querem ser havidos por moçambicanos, para não serem confundidos com a maioria Negra: esse é o caso! E é pena que, exactamente, por insistirem em ser asiáticos, nunca se integram, sentindo-se moçambicanos, filhos deste grande País que a todos os seus filhos acolhe, independentemente da cor da pele ou da religião. Veja-se, por exemplo, que nunca ninguém falou da “comunidade goesa” ou da “comunidade europeia”, a despeito de haver cidadãos moçambicanos dessas origens.
O sétimo equívoco vem do sentimento de que as ditas comunidades poderiam motivar os seus integrantes à greve fiscal.
A submissão ao Fisco, uma vez existente a respectiva incidência, é compulsória, sob pena de penhora de bens até ao montante correspondente. Tentem a greve. Quem sabe se, não hesitando o Governo, por via da penhora, pelo Fisco, de pecúlios provindos, não poucas vezes de traficância, se poderia, finalmente, dar início a um programa empresarial de “acção afirmativa”, à custa dessa greve?!
Idi Amin Dada, um muçulmano convicto, quando se apercebeu do comportamento destas “comunidades”, nomeadamente na sobre-exploração da maioria populacional e na agitação política, a pretexto da religião, não hesitou em fazê-lo. Se houver a mesma coragem, aqui, sem se mandar embora ninguém, as ervas daninhas secarão por si e, na seguinte estação das chuvas, de novos pastos e novos pastores passará o País a dispor.
Quanto aos demais pronunciamentos, se as passeatas cumprirem o estipulado na lei, serão um salutar acto de cidadania.
Que o Governo o permita e, a partir daqui, não só a estes. Ao Senhor Presidente da República peço que, em nome da dignidade da sua função de Chefe de Estado, se não humilhe, cedendo à intimação de, sob pressão, conceder a estes grupos, por agora e para o que de momento exigem ou ameaçam, o pretendido “encontro ao mais alto nível”!
Termino com um alerta: aos ismaelitas e aos hindus presentes nestas acções de concertação da “comunidade asiática”, a cargo da “comunidade muçulmana”: a História das vossas seculares relações tem sido de tudo, menos pacífica. Não vos deixeis enganar.
Quando conseguirem o que querem, largar-vos-ão, como de costume, se possível depois de vos comprometerem.
O mesmo pedido faço aos inocentes úteis, (aos cafres, como eles nos chamavam!): nos primórdios da História islâmica, aparece Bilal, sim, mas como escravo de uma ilustre figura árabe. Fugi desse papel, e não aceiteis ser mainatos desse grupo! Vede que, no nosso País, o Islão está implantado há mil anos, a ele tendo aderido largas dezenas de milhares de compatriotas.
Isso nunca foi objecto de conflitos entre nós. Temos, aqui mesmo no Maputo, confrarias islâmicas bicentenárias e património imobiliário que atesta a inserção do Islão nativo (Anuaril Issilamo, Comunidade Mahometana, etc.) que convive pacificamente com outros credos e cumpre a lei do Estado.
Mais recentemente, apareceram o Congresso Islâmico de Moçambique e o Conselho Islâmico de Moçambique. Foi deste último que começaram a emergir alguns dos mentores dos problemas de que a presente crise é, apenas, a ponta do iceberg.
Ao Governo, solicito que, não havendo espaço para ceder à chantagem deste grupo de agitadores, que não passa de pura bravata, mantenha a laicidade das escolas públicas, cumprindo-se, exactamente, como até aqui, sem excepções de grupos, nem de épocas lectivas.
Seria, também, de desejar que, em respeito à mesma laicidade, os dignitários do Estado exigissem, nas audiências, que os que as solicitam se apresentassem em traje civil e não com indumentária religiosa (estilo Sibindi, que até perante o Chefe de Estado se apresenta de bastão – será bastão de Marechal da Jihad?!). Creio que, por estas e por outras razões, deveria passar pelo Parlamento, com carácter de urgência, uma Lei de Liberdade Religiosa, que reafirme e regule, em pormenor, o exercício da garantia de que Moçambique é um Estado Laico, conforme sucessivamente reafirmado no nosso ordenamento constitucional.
Por um Moçambique de todos e para todos. A Luta continua!
Canal de Moçambique – 29.08.2012