ASPECTOS SOBRE O REGIME DO DIREITO À MANIFESTAÇÃO NA ORDEM MOÇAMBICANA!
i. Contextualização:
Quando se fala em direito à manifestação, levanta-se a seguinte questão: «os cidadãos, para se manifestarem, carecem dalguma autorização por parte das autoridades estatais?» Pois, a alegação de «falta de autorização» é a que tem sido usada pela polícia para abortar certas manifestações pelo país.
Ora, nos últimos tempos, face aos problemas políticos e sociais que o país tem vindo a experimentar, têm sido idealizadas iniciativas de manifestações, que acabam por ser abortadas devido a interferência do Estado por meio da polícia, apoiada ao discurso de falta de autorização das autoridades respectivas.
Ademais, a falta de autorização para abortar iniciativas dos manifestantes, é o discurso também usado por renomados juristas, alguns dos quais suspeitamente ao serviço do sistema, quando concedem entrevistas pelas televisões, rádios ou jornais, e até quando rabiscam seus artigos pelas redes sociais.
Desta forma, este artigo tem em vista discutir sobre alguns aspectos do regime jurídico do direito à liberdade de manifestação, consagrado no art. 51.º da CRM e regulado nos termos da Lei n.º 9/91, de 18 Julho, sempre com atenção às alterações introduzidas pela posterior Lei n.º 7/2001, de 7 de Julho.
ii. Regime jurídico do direito à liberdade de manifestação:
Nos termos do art. 51.º da CRM, «Todos os cidadãos têm o direito à liberdade de manifestação». Um direito que, já nos termos do n.º 1 do art. 3 da Lei n.º 9/91, de 18 de Julho - Lei que regula o direito à liberdade de reunião e manifestação, «o seu exercício NÃO DEPENDE DE QUALQUER AUTORIZAÇÃO».
A manifestação, de acordo com a definição trazida pelo n.º 3 do art. 2 da Lei n.º 9/91, de 18 de Julho, tem por finalidade a EXPRESSÃO PÚBLICA DE UMA VONTADE sobre «assuntos políticos, sociais, de interesse público e outros», e envolve comício, desfile e cortejos organizados, refere o n.º 4 do art. 2.
Aos cidadãos que pretendem exercer do seu direito à liberdade de manifestação cabe apenas, nos termos do n.º 1 do artigo 10 da Lei n.º 9/91, de 18 de Julho, «EMITIR UM SIMPLES AVISO», por escrito, desse seu propósito e com antecedência mínima de 4 dias úteis às autoridades civis e policiais da área.
Desse aviso, o qual deve ser assinado por um mínimo de 10 pessoas devidamente identificadas ou, tratando-se de pessoas colectivas, pelos seus respectivos órgãos de direcção, deve indicar o trajecto, o dia (que deve ser sábado, domingo ou feriado - art. 6), hora e objecto da manifestação (n.ºs 2 e 3, art. 10).
Recebido o aviso pelas autoridades civis e policiais da área, estas estão obrigadas a emitir um documento comprovativo de recepção do expediente. As autoridades não têm poder algum de proibição ou restrição da manifestação, senão nos casos de alguma violação fundada nos arts. 4 e 5.
Resumidamente, constituirão causadas proibitivas ou restritivas da manifestação, nos termos conjugados dos arts. 4 e 5 da lei que temos vindo a analisar: a ofensa à CRM, lei, moral, aos bons costumes, direitos individuais ou colectivos e quando há uso abusivo de edifícios públicos ou privados.
Havendo essas causas proibitivas/restritivas da manifestação, as autoridades têm o prazo de dois dias, a contar da data da recepção do aviso, para notificar os promotores da manifestação sobre a proibição devidamente fundamentada. Essa notificação deve ser entregue junto da morada indicada pelos manifestantes, sendo que o silêncio das autoridades corresponde ao deferimento tácito (n.º 2, art.11).
iii. Conclusões:
Chegados a esta parte temos a concluir que o direito à manifestação, enquanto direito fundamental, o seu exercício não pode ser proibido ou restringido senão «NOS CASOS EXPRESSAMENTE FIXADOS NA CRM», em atenção ao disposto aos princípios gerais dos direitos fundamentais consagrados nos nºs 2 e 3 do art. 56.º da CRM, bem como por força do disposto nos arts. 4 e 5 da Lei n.º 9/91, de 18 de Julho.
O Estado, através da polícia ou mesmo de outra força pública, não deve proibir ou restringir o gozo do direito à manifestação. Antes pelo contrário, nos termos do n.º 1 do art. 56.º da CRM in medium, «é O ESTADO QUEM DEVE GARANTI-LO». O Estado, actuando pelo Governo, ao vedar o gozo deste direito viola a CRM e demais leis do Estado, desaproximando-nos mais de um Estado de Direito Democrático.
Assim, fazendo parte do catálogo dos direitos fundamentais da 1ª geração, também designados por direitos civis e políticos, para o pleno gozo do direito “sub júdice”, como refere Paulo Ferreira da Cunha (2000; p. 92 e ss), o ESTADO DEVE É ADOPTAR UMA POSIÇÃO NEGATIVA/NEUTRAL, i.e., deve abster-se de impor restrições às liberdades do Homem, a não ser que outro motivo ponderoso se justifique.
Portanto, é uma atitude manifestamente injusta que se lance uma campanha (na verdade contra campanha) contra os proponentes de manifestações pelo país, usando-se como causa impeditiva alienação ao ocidente ou à famosa mão externa, ou mesmo perturbação da ordem pública. Ilícito é, ainda, que as autoridades administrativas determinem sobre que matérias se pode manifestar e outras não, fora das limitações impostas por lei, revelando, assim, um USO EXCESSIVO do poder discricionário.
Att., Ivan Maússe.
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