O frenesi que se instalara à volta do “Processo Chang” na África do Sul vai começar a afrouxar hoje. A audição marcada para esta manhã no Kempton Park Magistrate Court pode não ter lugar, disse ontem à “Carta” Rudi Krause, um dos advogados que tenta libertar o ex-Ministro das Finanças, Manuel Chang, e evitar a sua extradição para os Estados Unidos da América. “Não creio que amanhã (hoje) haverá algum desenvolvimento. É muito provável que a audição será adiada”, disse ele, evitando entrar em detalhes sobre as prováveis razões para este novo ritmo lento que começa agora a marcar a discussão de dois aspectos imediatos decorrentes da detenção de Chang a 29 de Dezembro na RAS: a decisão sobre um eventual pedido de liberdade provisória sob caução, que estava marcada para ser tomada hoje; a extradição de Manuel Chang para os EUA, conforme requerido pela Justiça americana, mas não ainda fundamentado.
Na breve conversa que manteve connosco ontem, Krause revelou que o Departamento de Justiça americano ainda não tinha submetido a papelada necessária para fundamentar o pedido de extradição, designadamente os elementos de prova. “Carta” apurou que o novo ritmo do caso decorre da entrada em cena do Ministério Público moçambicano (PGR), que solicitou formalmente às autoridades sul africanas, em carta em enviada ao Ministério da Justiça e Desenvolvimento Constitucional, o desejo de Chang ser julgado em Moçambique, para se acautelar o confisco de bens.
”Não se trata de um pedido de extradição como tal. Na nossa carta, nós não falamos taxativamente em extradição para Moçambique. Dissemos apenas que queremos que o deputado Chang seja julgado em Maputo”, disse-nos ontem uma fonte do Ministério Público moçambicano. “A denominação e os procedimentos do sistema sul africano são muito diferentes do nosso. E pode ser que a carta remetida no dia 10 de Janeiro seja suficiente para se decidir sobre a extradição para Moçambique sem ser necessário outro expediente adicional, como os advogados estão a referir”, acrescentou a fonte. O provável adiamento da sessão de hoje tem justamente a ver com esse pedido de Moçambique. “Carta” sabe que a resposta formal ao desejo expresso pelas autoridades de Maputo vai ser dada na próxima segunda-feira pelo Ministério da Justiça e Desenvolvimento.
A entrada em cena do Ministério da Justiça sul africano, arrastando a decisão do caso para um plano politico e não meramente judicial, já era previsível, mas não se esperava que fosse tão já. Os advogados de Chang haviam deixado perceber que iriam apostar no arrastamento do processo por longos meses, até o caso ultrapassar o foro da justiça como estabelece a legislação sul africana: a decisão final de um processo de extradição na África do Sul não se esgota com uma ordem judicial. A decisão final de uma extradição é tomada pelo governo.
O actual Ministro da Justiça e Desenvolvimento Constitucional, Michael Masutha, pode negar a extradição de Chang para os EUA se achar que não seria do "interesse da Justiça”, ou a extradição seria “injusta”, ou a punição “severa demais”. A decisão é unicamente do Ministro e não é passível de recurso e nem importa se o seu raciocínio é questionável. Assim sendo, o novo dia D para Manuel Chang é a próxima segunda-feira, quando Masutha anunciar o seu veredicto político. A entrada em cena Ministério Público argumentando que deve ter precedência no julgamento de Chang, também já constituído arguido em Moçambique, e tendo como pressuposto que ele é um antigo membro do Governo, alterou completamente o rumo das coisas. O facto de o Departamento de Justiça dos EUA não ter ainda submetido a fundamentação para o pedido de extradição joga também a favor de Chang. (Marcelo Mosse, em Joanesburgo)
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