Quem
também foi cáustico no seu discurso foi António Prista, académico e
membro do “Grupo da Petição - Não queremos privatização dos espaços
públicos”. Desta vez as críticas não foram para os dirigentes políticos,
mas para as próprias organizações da sociedade civil. Prista diz que o
dinheiro “viciou” muitas organizações, ao ponto de trabalham só quando
há financiamento. “Até parece que para ser cidadão e preocupar-me com a
minha cidade só posso fazer se me pagarem”, desabafou.
Defende
que é urgente “convencer” as organizações a moverem-se por ideias e não
por oportunidades financeiras. “HIV/Sida é um exemplo disso. Há muita
gente metida lá porque há dinheiro. Não estão lá por causa da doença,
mas porque há dinheiro para o HIV”.
A
questão do dinheiro, ou melhor, da sua falta, foi colocada na
apresentação do estudo como um desafio para a participação da sociedade
civil no desenvolvimento urbano. “Nunca tivemos nenhum apoio financeiro e
as pessoas precisam de estar motivadas, temos que comprar crédito
(...). As pessoas formam-se, capacitam-se e depois vão ficar em casa,
porque não há financiamento para implementar (...)”. Este é um
depoimento reproduzido no estudo “Cidadania Urbana” e que resume a
problemática do dinheiro na participação política dos cidadãos.
Outro
depoimento destaca constrangimentos de natureza sociocultural: “O que
acontece é que o cidadão não é muito informado. As pessoas não lêem
jornal, o jornal continua a ser algo para as elites (...) Acho que
maximizando a questão da informação, algo poderia mudar”.
Mais do que palavras, Prista entende que a melhor forma de consciencializar as pessoas sobre a
cidadania está nos exemplos. Aliás, para o académico (e não só), não
faz sentido que pessoas que era suposto serem cidadãos, porque dão a
cara na luta pela promoção da cidadania, sejam as mesmas a praticarem
actos que contrariam a própria cidadania. “A primeira coisa que temos
que fazer é começarmos por nós próprios. Temos que dar exemplos tirando
os nossos carros que estacionamos nos passeios, deixando de deitar lixo
no chão e evitando passar com sinal vermelho no semáforo”.
Sobre o estudo
Com
foco nas cidades de Maputo e Nampula, o estudo encomendado pela
organização denominada Diálogo Local para a Boa Governação discute as
condições para o desenvolvimento de uma cidadania urbana em Moçambique.
Na apresentação dos resultados, o académico Domingos do Rosário
(produziu o estudo com o jovem Elísio Muendane) destacou alguns
paradoxos na actuação de algumas organizações. Desde logo, a existência
de organizações baseadas no meio urbano, mas que são desconhecidas
nestes espaços, porque desenvolvem as suas acções no meio rural. E a
segunda é “uma cidadania orientada para os direitos e não para os
direitos e deveres”. O estudo verificou, também, que os processos de
capacitação privilegiam os grupos com o mínimo de organização nos
bairros. A estratégia pode ser viável, mas os pesquisadores alertam para
o risco de se excluir todos os actores da cidadania urbana que actuam
individualmente. “É preciso diversificar os beneficiários das
capacitações, para atingir mais grupos.”
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