segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Filipe Nyusi, tecnocrata pragmático por vezes impulsivo a caminho da reeleição na Frelimo


A forma meteórica como Filipe Nyusi chegou à chefia do Estado moçambicano fez com que fosse recebido como uma incógnita, mas os três anos de mandato que já leva assinalam-lhe traços de um homem pragmático e por vezes impulsivo.
O atual líder da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder em Moçambique desde a independência, é, para já, o único candidato à sua própria sucessão no 11.º congresso do partido que começa na terça, na Matola, arredores de Maputo.
Com uma passagem fugaz pelo cargo de ministro da Defesa e sem percurso notável na Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), partido no poder - ao contrário dos seus três antecessores na Presidência da República -, o batismo de fogo de Filipe Nyusi consistia em emancipar-se de Armando Guebuza, que lhe cedeu a Presidência da República em janeiro de 2015, após dez anos de mandato, mas manteve a direção do partido no poder.
Para muitos, o facto de Guebuza ter mantido a chefia do partido na altura da investidura de Nyusi iria condicionar a ação do novo Presidente e confirmar a ideia de um líder manietado pela anterior direção máxima da Frelimo.
Contra todas as expetativas, Armando Guebuza foi forçado a abandonar a presidência da Frelimo, dando o lugar, em março de 2015, a Filipe Nyusi, que averbou a sua primeira vitória na luta pelo controlo de um partido que em Moçambique é confundido com o Estado em muitos aspetos, como notam diversos académicos.
Correspondendo ao espírito do seu discurso de tomada de posse, de promover um país mais inclusivo, logo nos primeiros dias do seu mandato, Filipe Nyusi encontrou-se com o líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), Afonso Dhlakama - que se recusou a reconhecer a derrota nas eleições gerais -, e com o líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), terceiro maior partido, Daviz Simango.
O seu estilo repentino e por vezes menos protocolar ficou à vista quando apareceu subitamente, num sábado à tarde, no antigo e já decrépito Mercado do Peixe, no Bairro da Costa do Sol, em Maputo, a conversar com vendedores e sem a comunicação social por perto, sendo as imagens distribuídas à imprensa por um videoamador.
Sentou-se várias vezes no chão com crianças em salas de aulas sem carteira para se solidarizar com os alunos que estudam sem grandes condições, dando depois algumas lições de Matemática, uma disciplina que lecionou nos seus tempos de docente na Universidade Pedagógica.
Amante de futebol, a ponto de ter sido campeão nacional na qualidade de presidente do Ferroviário de Nampula, participou nalgumas partidas de carácter recreativo pela equipa do Governo e fez alguns minutos em jogos inaugurais de campeonatos escolares.
Tecnocrata e admirador assumido da ciência, em detrimento "da advinha", como já o disse, para gerir as instituições públicas, foi ao Fundo Monetário Internacional (FMI) buscar o atual governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, e Mateus Magala ao Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) para dirigir a estratégica Eletricidade de Moçambique (EDM), contrariando a desconfiança com que a Frelimo olha para quadros que deixam o país para prosseguir a carreira no estrangeiro.
Engenheiro de formação e com uma carreira de gestor nos Caminhos de Ferro de Moçambique (CFM), tem primado pelo pragmatismo na relação com as instituições financeiras internacionais na questão das dívida oculta deixada pelo anterior Governo, quase nunca mencionando a palavra autoestima, muito querida do seu antecessor Armando Guebuza.
O realismo levou-o há poucas semanas, em agosto, a um encontro inédito com Afonso Dhlakama nas matas do distrito de Gorongosa, centro de Moçambique, onde o líder da Renamo se encontra refugiado, em mais uma ação visando o alcance da "paz efetiva" no país.
As visitas às empresas públicas, recuperando um estilo seguido pelo primeiro Presidente moçambicano, Samora Machel, revelaram um Filipe Nyusi impulsivo, quando várias vezes fez fortes reprimendas a gestores das empresas públicas devido ao estado em que as firmas participadas pelo Estado se encontram.
"Há dificuldade em deixar a concorrência fluir. Vocês fecham os circuitos. Como é que alguém tem aviões e não os deixamos voar? Como é que alguém com autocarros prontos para operar numa determinada rota é impedido por [alegadamente] existirem outros dois os três operadores privados", questionou o Chefe do Estado, depois de em abril visitar a transportadora nacional Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) e a Empresa Municipal dos Transportes de Maputo (EMTM).
Gelou a sala de reuniões do Ministério dos Transportes e Comunicações quando em pleno Conselho Consultivo da instituição censurou uma jornalista que o filmava através de um telemóvel.
Como sinal do desconforto que sente, a sua segurança proíbe liminarmente a gravação de imagens por esta via, como já se notou em várias ocasiões em público.
Com Filipe Nyusi, aumentou o zelo com a segurança, sendo por isso proibidos telemóveis de visitantes, incluindo de jornalistas, no interior da Presidência da República.
Apesar da aparente fobia, abriu recentemente uma conta no Facebook onde responde a algumas perguntas colocadas pelos utilizadores da rede social.
O congresso da Frelimo que se inicia na terça-feira pode ser o da consagração de um homem que precisará de mais do que os dotes da sua formação de engenheiro para resolver os problemas hercúleos com que o país se debate.

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