De acordo com o Jornal “O Pais”, o Professor Adriano Nuvunga afirma que a “Constituição da República garante superioridade à Frelimo”. Ele disse isso durante uma palestra na Beira, durante a cerimónia de lançamento de um estudo sobre cidadania urbana. Bem, não irei cingir-me sobre todo seu argumento mas apenas neste específico. Quero crer que o que aconteceu foi mesmo um lapsus lunguae (ato falhado ou lapso freudiano ou parapráxis, é um erro na fala, na memória, na escrita ou numa acção física que seria supostamente causada pelo inconsciente). Não consigo ver no seu argumento algo que consubstancia a sua conclusão.
Comecemos assim:
1. O Professor Nuvunga sabe que a FRELIMO que libertou o país não é juridicamente a mesma FRELIMO que hoje dirige o país. Como o Professor bem recorda, o Partido Frelimo nasceu em 1977 no Clube Militar, em Maputo.
2. A Constituição refere-se a Frelimo – MOVIMENTO DE LIBERTAÇÃO – e não ao partido Frelimo.
3. EU próprio recordo-me de ter sido dos poucos cidadãos que levantou o debate da verdadeira idade do partido Frelimo em 2004, apresentando para tal documentos jurídicos válidos. Posso trazê-los de volta havendo necessidade.
Portanto, o que existe não é necessariamente a vantagem concedida pela constituição à Frelimo mas sim o APROVEITAMENTO que a instituição Partido Frelimo faz da história, tirando partido de três factores importantes: Primeiro, a ideia de “continuidade” – que tenta passar ao povo (maioritariamente ignorante e muito atarefado em garantir a sua sobrevivência como seres vivos) - dado a predominância de quase mesma estrutura e actores pertencentes ao anterior movimento de libertação; Segundo, o legado dos dez anos do socialismo falhado, durante o qual o povo moçambicano sofreu os mais duros golpes da violência psicológica, física, verbal e até emocional, aliado à guerra de desestabilização e em terceiro lugar – eu apostaria em levar todos sobrevivente da Guerra à tratamentos pós traumáticos. Em terceiro lugar, uma transição democrática falhada e que enfrenta problemas sérios ao nível da institucionalização dos partidos políticos da oposição, da despartidarização das instituições do estado e por último da ausência dos partidos políticos da oposição nas arenas políticas. Explico isso a seguir esse último nível, só para concluir.
• O discurso político dos partidos políticos e principalmente da Renamo é um discurso de auto-exclusão. Da mesma forma que o discurso da Frelimo puxa para si a autoria da independência de Moçambique, a Renamo insistentemente puxa para si a autoria da democracia multipartidária. Da unidade nacional fica um vazio, preenchido por pessoas não muito relevantes.
• Desde 1992, foram pouquíssimas senão raras as ocasiões em que a Renamo esteve em cerimónias de estado. Para além de Yaqub Sibindy, Mabote, Massango e outros extraparlamentares, participar em cerimónias públicas passou a ser visto como estando ao serviço do regime ou sua marioneta. Eu sei que o protocolo do Estado deve a obrigação de convidar a todos mas que alguns para lá nunca foram (autoexclusão). Ou seja, a teoria de mudança que se cristaliza no seio destes organismos é de que não há nenhuma possibilidade de mudança e democratização senão com a extirpação da Frelimo. No final, todos os partidos políticos nutrem um sentimento de mútua rejeição. E passam esse “veneno” as suas bases, criando um sentimento de desengajamento mesmo quando as condições exigem o contrário.
• Para mim, uma outra história é possível com a socialização dos valores da democracia. Enquanto vivermos uma sociedade polarizada e instrumentalizada pelas ideologias excludentes, dificilmente chegaremos tão cedo ao que pretendemos. Numa eventual vitória da Renamo, se nós não mudarmos hoje, a nova história será por substituição, onde antigos vilões serão heróis e os heróis de hoje os vilões.
Espero ler bem o livro lançado para também pronunciar-me. Quanto ao resto do seu argumento estou plenamente de acordo e saúdo-o pela audácia.
UMA SOCIEDADE SÓ TEM CHANCES DE MELHORAR QUANDO HOMENS DE BEM TIVEREM A MESMA AUDÁCIA A DOS CORRUPTOS.
Não haverá despartidarização nem da história muito menos das instituições se as entidades que por vocação devem agir não o fizerem. Mais do que supor, urge aproveitar o momento de tréguas para nos aproximar, conhecermo-nos bem nas nossas ideias, intenções para com o país e os nossos maiores medos, compartilhar esses medos, receios, discuti-los em públicos para depois escolhermos as melhores ideias, os melhores filhos e as melhores organizações e pô-las ao serviço da nação.
Obrigado.
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