quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Angola: Orçamento para o Presidente, as Forças Armadas e os Espiões

Angola
 
Todas as funções do Estado estão subordinadas a uma cultura generalizada de medo e suspeição. Os funcionários públicos (e não só) são aliciados e coagidos a vigiarem-se e a denunciarem-se mutuamente, garantindo deste modo a sobrevivência do regime.
Luanda (Canalmoz) - A propaganda governamental tem promovido o orçamento de 2013 como o maior de todos os tempos, sublinhando os montantes que irão ser empregues nos sectores sociais e no combate à pobreza. O Projecto de Lei do Orçamento Geral do Estado (OGE), aprovado na generalidade pela Assembleia Nacional, a 15 de Janeiro, deve tornar-se lei a 14 de Fevereiro.
O montante das despesas, para o presente ano, registou um aumento de cerca de 50 porcento em relação a 2012, fixando o total do orçamento no montante recorde de 6.6 triliões de kwanzas (cerca de US $69 biliões).

Mais de um terço do orçamento, cerca de 33.5 porcento, é dedicado ao sector social. Este inclui a saúde, educação, habitação, ambiente e protecção social. Essa verba é, de facto, a maior de sempre atribuída ao sector social.
Mas a apresentação simplista de números, sem os contextualizar, é enganadora. Na sua essência, o Projecto de Lei do OGE legaliza a falta de responsabilização do Presidente José Eduardo dos Santos na gestão dos recursos públicos.
Para a rubrica Despesas e Fundos Especiais, a referido projecto de lei estabelece um regime especial de gestão ao livre arbítrio do Presidente dos Santos.
Segundo a proposta “ficam sujeitos a um regime especial e de cobertura, execução e prestação de contas, as despesas especiais, afectas aos órgãos de soberania e serviços públicos que realizam as funções de segurança interna e externa do Estado, integrados no Sistema Nacional de Segurança, em termos que assegure o carácter reservado ou secreto destas funções e o interesse público, com eficácia, prontidão e eficiência”. (Art. 11, 1)
Na prática, todas as funções do Estado estão subordinadas a uma cultura generalizada de medo e suspeição. Os funcionários públicos (e não só) são aliciados e coagidos a vigiarem-se e a denunciarem-se mutuamente, garantindo deste modo a sobrevivência do regime.
Com efeito, a proposta orçamental de José Eduardo dos Santos inscreve, no OGE, “créditos orçamentais que permitam a criação de fundos financeiros especiais, a funcionarem como reserva estratégica do Estado, para a execução das despesas (…)” com o Estado policial (Art. 11, 2).
A gestão e prestação de contas dos referidos fundos especiais cabe exclusivamente ao Presidente da República, enquanto titular do poder executivo. José Eduardo dos Santos legaliza, desse modo e por via do OGE, a sua forma habitual de gestão do património do Estado. Não presta contas a ninguém. A autorização legal (Art. 11, 3) permite-lhe determinar como exercer o controlo e a fiscalização sobre si próprio. Em suma, José Eduardo dos Santos recebe autorização da Assembleia Nacional, por via do OGE, para decidir como deve gerir os fundos especiais. Este é mais um modelo atípico de controlo e fiscalização das despesas públicas, em que a falta de transparência é legalizada.
Neste primeiro de uma série de artigos de análise sobre o orçamento de 2013, Maka Angola aborda os orçamentos atribuídos à presidência, assim como as verbas destinadas à defesa e à segurança, comparando-as com os montantes atribuídos aos serviços sociais. (Por Rafael Marques de Morais, com a devida vérnia do Canalmoz)

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