terça-feira, 20 de novembro de 2018

Preservativos são considerados “armas perigosas” nas prisões angolanas, devido ao risco de suicídio


Os reclusos angolanos não têm acesso ao preservativo, considerado uma "potencial arma" de suicídio ou de crime. O "muito alto índice de tuberculose" neste grupo é também destacado.
Os presos "não têm acesso ao preservativo, pois estes são considerados como potenciais armas perigosas, que podem pôr em risco a integridade física e a vida das pessoas"
AMPE ROGÉRIO/LUSA
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  • Agência Lusa
Os reclusos angolanos não têm acesso ao preservativo, considerado uma “potencial arma” de suicídio ou de crime, segundo um relatório esta terça-feira divulgado, que destaca ainda o “muito alto índice de tuberculose” neste grupo, doença associada à sida.
A informação consta do Relatório Nacional Consolidado da Avaliação do Ambiente Jurídico em Angola, cuja análise para a sua validação arrancou esta terça-feira em Luanda, decorrendo até quinta-feira no âmbito de uma avaliação simultânea em vários países da África Austral.
Os presos “não têm acesso ao preservativo, pois estes são considerados como potenciais armas perigosas, que podem pôr em risco a integridade física e a vida das pessoas”, lê-se no documento.
O relatório, a que agência Lusa teve acesso, refere, no ponto de análise à população-chave, que a Rede Angolana de Organizações e Serviços da Sida (ANASO) considera, embora não haja informação precisa, “muito alto o índice de tuberculose neste grupo vulnerável, uma das principais doenças associadas à sida”.
Com vista a aproximar os serviços de saúde à população prisional e autoridades penitenciárias, o Governo angolano, através da Direção Nacional dos Serviços Prisionais, tutelada pelo Ministério do Interior, tem apostado na criação de centros de saúde em todos os estabelecimentos prisionais do país. Contudo, devido à insuficiência de recursos humanos e materiais, só foi possível, até ao momento, instalar os centros em unidades penitenciárias de apenas seis das 18 províncias do país.
Nas províncias de Luanda, Bié, Malanje, Cuanza Norte, Lunda Norte e Bengo, os reclusos têm acesso a serviços de aconselhamento e testagem nos centros. “Os serviços penitenciários também realizam intervenções, tais como a formação de educadores de pares, de conselheiros e manuseio de terapia antirretroviral junto às pessoas reclusas”, refere o relatório.
Durante o trabalho de campo, foi constatado no Hospital Cadeia de São Paulo, em Luanda, que os reclusos possuem conhecimento dos modos de transmissão do VIH e procuram a prevenção, por exemplo, não compartilhando as lâminas de barbear, descreve o relatório.
No que se refere ao quadro jurídico-legal, o relatório sublinha que a Lei 8/04 sobre VIH/sida reconhece os direitos das pessoas privadas de liberdade, mas as disposições limitam-se à proibição de testes obrigatórios (com algumas exceções) e aos direitos dos reclusos à assistência médica e medicamentosa.
O diploma legal também não tem em conta todas as necessidades especiais dos reclusos, incluindo os aspetos relacionados com a saúde sexual, violência, discriminação e consumo de drogas, observa o relatório.
Entre os vários direitos estabelecidos na Lei Penitenciária destaca-se o das visitas conjugais que, em termos legais, são consideradas “convívio íntimo do recluso com o seu cônjuge ou companheiro(a) de união de facto em local apropriado”, mas separado do seu aposento, pelo menos uma vez por mês, com duração de uma até três horas, limitando-a apenas a casais heterossexuais.
Como recomendações, o relatório apela à revisão da Lei 8/04 de modo a reconhecer as necessidades específicas desta população, especialmente no que diz respeito ao acesso aos serviços de saúde, incluindo a sexual e reprodutiva — com ênfase na educação e informação — e eliminação da violência, particularmente aquelas que constituem crimes ou infrações sexuais.
“Recomenda-se especificamente que o direito à saúde para os reclusos seja configurado de modo a assegurar que os serviços de prevenção e tratamento do VIH disponíveis na comunidade também devem ser prestados às pessoas na prisão e em outros estabelecimentos fechados”, sugere o documento, entre outras recomendações.

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