ALEMANHA
Porta-voz da VW é a primeira baixa dos testes com macacos e humanos
Thomas Steg acumulava o pelouro das Relações Externas com o da Sustentabilidade do fabricante de Wolfsburgo. O presidente executivo da Volkswagen promete levar o caso “até às últimas consequências”.
VICTOR FERREIRA 30 de Janeiro de 2018, 15:34 actualizado a 30 de Janeiro de 2018, 16:06
FotoThomas Steg trabalhou com dois chanceleres (Schröder e Merkel) antes de ser contratado pela VW LUSA/JACEK BEDNARCZYK
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Começaram a rolar cabeças na indústria automóvel alemã, que está sob alta pressão por causa do uso de macacos e humanos como cobaias em testes de laboratório às emissões de gases. Na segunda-feira, os três grupos directamente atingidos – Volkswagen, BMW e Daimler (Mercedes) – apostaram em promessas de que nada voltaria a ser como dantes. Vinte e quatro horas depois, eis a primeira baixa: a Volkswagen demitiu o porta-voz, Thomas Steg.
Talvez a saída de Thomas Steg não surgisse como primeira aposta de demissão para muitos que vieram a terreiro qualificar os testes com macacos e humanos como algo “inqualificável”, “absurdo” ou “eticamente reprovável”. A começar pelo Governo de Berlim, que criticou em peso a indústria alemã (sem poupar nos adjectivos) quando o assunto assumiu contornos de escândalo público.
Construtores alemães financiaram testes de emissões com macacos
Angela Merkel, que só se fez ouvir através do seu porta-voz, e todos os ministros – federais e regionais, do Ambiente à Economia – que antes ou depois da chanceler se juntaram ao coro de críticas, talvez apostassem em demissões em perfis mais técnicos ou de gestão. Mas não. A fava saiu ao porta-voz da marca sediada em Wolfsburgo, uma decisão que parece pouco óbvia, mas que se explica sobretudo pelo facto de Thomas Steg acumular o pelouro das Relações Externas com o da Sustentabilidade.
Além disso, exerceu funções semelhantes em governos de Angela Merkel (CDU, conservadores) e Gerhard Schröder (SPD, sociais-democratas). Os mais cínicos entendem, por isso, que a demissão de Steg serve mais a classe política – cujas relações com a importante indústria automóvel alemã tem sido questionada por mais vozes nas últimas horas – do que a prestação de contas ao mercado. Os mais pacientes olham de forma mais prudente para esta decisão, encarando-a como o início de um processo que vai fazer rolar mais cabeças.
“Métodos errados, antiéticos e repugnantes”
A indignação de consumidores e políticos na Alemanha apanhou o presidente executivo (CEO) da VW, Matthias Müller, em Bruxelas. Em vez de falar dos planos da empresa para 2018, Müller pediu desculpa por testes “inaceitáveis” com macacos, levados a cabo nos EUA, por um instituto fundado e financiado por VW, BMW e Daimler, o EUGT. Prometeu levar o caso “até às últimas consequências”, relata a edição online da revista Spiegel.
“Lamento que a Volkswagen, como um dos financiadores do EUGT, esteja envolvida nestes ensaios. Há coisas que simplesmente não se devem fazer”, declarou Müller. “Os métodos da EUGT nos EUA eram errados, foram antiéticos e repugnantes”, rematou.
Daimler, BMW e VW já tinham apresentado desculpas no início da semana, assim que as notícias dos testes com macacos, revelados pelo New York Times, atravessaram o Atlântico. Tal como as marcas, outros representantes do sector, como o presidente da associação da indústria automóvel alemã (DVA, na sigla original), Matthias Wissmann, tentaram demarcar-se dos ensaios com animais e humanos. Wissman está de saída da presidência da DVA – será substituído a 1 de Março pelo ex-líder da Ford na Alemanha, Bernhard Mattes – e é um exemplo das relações próximas entre poder político e indústria de carros naquele país, tendo sido ministro federal de diversas pastas pela CDU, entre 1993 e 1998.
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Porta-voz da VW é a primeira baixa dos testes com macacos e humanos
Thomas Steg acumulava o pelouro das Relações Externas com o da Sustentabilidade do fabricante de Wolfsburgo. O presidente executivo da Volkswagen promete levar o caso “até às últimas consequências”.
VICTOR FERREIRA 30 de Janeiro de 2018, 15:34 actualizado a 30 de Janeiro de 2018, 16:06
FotoThomas Steg trabalhou com dois chanceleres (Schröder e Merkel) antes de ser contratado pela VW LUSA/JACEK BEDNARCZYK
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Começaram a rolar cabeças na indústria automóvel alemã, que está sob alta pressão por causa do uso de macacos e humanos como cobaias em testes de laboratório às emissões de gases. Na segunda-feira, os três grupos directamente atingidos – Volkswagen, BMW e Daimler (Mercedes) – apostaram em promessas de que nada voltaria a ser como dantes. Vinte e quatro horas depois, eis a primeira baixa: a Volkswagen demitiu o porta-voz, Thomas Steg.
Talvez a saída de Thomas Steg não surgisse como primeira aposta de demissão para muitos que vieram a terreiro qualificar os testes com macacos e humanos como algo “inqualificável”, “absurdo” ou “eticamente reprovável”. A começar pelo Governo de Berlim, que criticou em peso a indústria alemã (sem poupar nos adjectivos) quando o assunto assumiu contornos de escândalo público.
Construtores alemães financiaram testes de emissões com macacos
Angela Merkel, que só se fez ouvir através do seu porta-voz, e todos os ministros – federais e regionais, do Ambiente à Economia – que antes ou depois da chanceler se juntaram ao coro de críticas, talvez apostassem em demissões em perfis mais técnicos ou de gestão. Mas não. A fava saiu ao porta-voz da marca sediada em Wolfsburgo, uma decisão que parece pouco óbvia, mas que se explica sobretudo pelo facto de Thomas Steg acumular o pelouro das Relações Externas com o da Sustentabilidade.
Além disso, exerceu funções semelhantes em governos de Angela Merkel (CDU, conservadores) e Gerhard Schröder (SPD, sociais-democratas). Os mais cínicos entendem, por isso, que a demissão de Steg serve mais a classe política – cujas relações com a importante indústria automóvel alemã tem sido questionada por mais vozes nas últimas horas – do que a prestação de contas ao mercado. Os mais pacientes olham de forma mais prudente para esta decisão, encarando-a como o início de um processo que vai fazer rolar mais cabeças.
“Métodos errados, antiéticos e repugnantes”
A indignação de consumidores e políticos na Alemanha apanhou o presidente executivo (CEO) da VW, Matthias Müller, em Bruxelas. Em vez de falar dos planos da empresa para 2018, Müller pediu desculpa por testes “inaceitáveis” com macacos, levados a cabo nos EUA, por um instituto fundado e financiado por VW, BMW e Daimler, o EUGT. Prometeu levar o caso “até às últimas consequências”, relata a edição online da revista Spiegel.
“Lamento que a Volkswagen, como um dos financiadores do EUGT, esteja envolvida nestes ensaios. Há coisas que simplesmente não se devem fazer”, declarou Müller. “Os métodos da EUGT nos EUA eram errados, foram antiéticos e repugnantes”, rematou.
Daimler, BMW e VW já tinham apresentado desculpas no início da semana, assim que as notícias dos testes com macacos, revelados pelo New York Times, atravessaram o Atlântico. Tal como as marcas, outros representantes do sector, como o presidente da associação da indústria automóvel alemã (DVA, na sigla original), Matthias Wissmann, tentaram demarcar-se dos ensaios com animais e humanos. Wissman está de saída da presidência da DVA – será substituído a 1 de Março pelo ex-líder da Ford na Alemanha, Bernhard Mattes – e é um exemplo das relações próximas entre poder político e indústria de carros naquele país, tendo sido ministro federal de diversas pastas pela CDU, entre 1993 e 1998.
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Construtores alemães financiaram testes de emissões com macacos
Um novo capítulo do escândalo de manipulação das emissões poluentes na indústria automóvel implica três fabricantes alemães em testes com animais.
A Volkswagen, a Daimler (que detém a Mercedes-Benz) e a BMW financiaram um estudo em que macacos foram submetidos a fumos tóxicos emitidos por motores a diesel, noticiou esta semana o New York Times, num artigo que reabre a polémica sobre a fraude relativa à manipulação dos valores das emissões de gases poluentes que afectou milhões de veículos daqueles grupos germânicos e de outras marcas europeias. No sábado, os três construtores automóveis condenaram publicamente a realização do estudo em causa, que foi conduzido nos Estados Unidos a pedido de um centro de investigação europeu financiado pelas referidas empresas alemãs.
De acordo com o New York Times, a experiência num laboratório do Instituto Lovelace de Pesquisa Respiratória, em Albuquerque, estado norte-americano do Novo México, foi encomendada pelo Grupo Europeu de Pesquisa Ambiental e de Saúde no Sector dos Transportes (EUGT, na sigla original alemã), um organismo inteiramente financiado pela Volkswagen, a Daimler e a BMW, que entretanto encerrou perante críticas e dúvidas relativas à sua actividade.
A experiência suportaria um estudo cujo objectivo seria apontar que os motores diesel não trariam perigos para a saúde pública. Noutros trabalhos, o mesmo organismo financiado pela indústria automóvel alemã contestou as conclusões da Organização Mundial de Saúde, que em 2012 considerou que os fumos dos combustíveis fósseis são cancerígenos, e tentou lançar dúvidas sobre se a exclusão de automóveis mais antigos dos centros urbanos reduziria a poluição.
Segundo um relatório do Parlamento Europeu, só em 2012 morreram cerca de 72 mil pessoas na Europa devido à poluição provocada por dióxido de azoto, que tem sobretudo origem em veículos com motor a diesel.
Os testes em animais datam de 2014. Dez macacos foram colocados numa sala hermeticamente fechada, onde eram mostrados desenhos animados para distrair as cobaias, enquanto inalavam gases de escape de um Volkswagen Beetle com motor a diesel e de uma pick-up Ford F-250. O New York Times sublinha que o Volkswagen Beetle utilizado, um modelo de 2013, era um dos veículos cujo motor tinha sido manipulado de forma a que os níveis de poluição registados no laboratório fossem inferiores aos reais.
A experiência laboratorial foi referida pela primeira vez em 2017, no âmbito de um processo que decorre em tribunal nos EUA e em que proprietários de viaturas Volkswagen lutam por uma indemnização da construtora automóvel germânica, que acusam de defraudar os consumidores. O teste é igualmente referido num episódio de uma nova série documental da Netflix, Dirty Money, segundo refere o Financial Times.
Entretanto, a notícia gerou protestos por parte de organizações de defesa dos direitos dos animais como a PETA.
A agência Reuters refere que não é claro se a Volkswagen, a Daimler e a BMW teriam conhecimento de que foram utilizados macacos na experiência em Albuquerque. No entanto, o New York Times indica que engenheiros da Volkswagen terão estado no Novo México a preparar o teste.
No sábado, os três construtores alemães condenaram publicamente o uso de animais neste tipo de testes.
“O grupo Volkswagen distancia-se de forma clara de todas as formas de crueldade animal. Os testes feitos em animais contradizem os nossos próprios princípios éticos”, disse a Volkswagen, em comunicado.
“O grupo BMW não influenciou de modo algum o propósito ou a metodologia destes estudos levados a cabo pelo EUGT”, disse por sua vez a BMW, citada pela Reuters, sublinhando que não conduz testes em animais e que não teve qualquer relação directa com a investigação.
Também a Daimler considerou que os testes em animais são “repugnantes”, dizendo distanciar-se dos estudos e do EUGT, declarando ainda, no Twitter, que foi aberta uma investigação interna ao caso. “A Daimler não tolera ou apoia qualquer tratamento não ético de animais”, sublinha.
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