O General-Procurador e a Greve dos Funcionários da PGR
Os técnicos de justiça e funcionários da Procuradoria-Geral da República iniciam hoje um greve com a duração de três semanas.
Não houve, por parte do actual procurador-geral da República, General Hélder Pita Grós, depois de anunciada a greve, qualquer tentativa real de resolução dos problemas que afligem os trabalhadores, além das habituais reuniões cálidas e promessas vagas.
Pelo contrário, o procurador limitou-se a emitir um comunicado a 26 de Janeiro, em que declara que a greve é “inoportuna” e “surpreendente”, acusando os grevistas de actuarem de forma:
– “contraproducente, irrazoável e de má-fé, na medida em que não houve nenhuma ruptura do processo negocial, e [a greve] manifesta-se contrária ao empenho da actual Direcção da PGR na busca de soluções para as reivindicações legítimas dos funcionários”;
– “ilegal, por não ter obedecido ao estabelecido na Lei da Greve, designadamente a realização prévia de uma assembleia de trabalhadores, que devia ter sido convocada com antecedência mínima de cinco dias, e que deveria contar com a participação de dois terços dos funcionários, nos termos previstos no art.º 10º. da Lei n.º 23/91, de 15 de Junho, Lei da Greve.”
– “ilegal, por não ter obedecido ao estabelecido na Lei da Greve, designadamente a realização prévia de uma assembleia de trabalhadores, que devia ter sido convocada com antecedência mínima de cinco dias, e que deveria contar com a participação de dois terços dos funcionários, nos termos previstos no art.º 10º. da Lei n.º 23/91, de 15 de Junho, Lei da Greve.”
Desse modo, o general Hélder Pita Grós convida os funcionários a não aderirem à greve, avisando que as ausências fundadas na greve serão consideradas faltas injustificadas.
No seu comunicado, a PGR vai um passo mais longe do que seria admissível num processo negocial laboral, pois contém expressões efectivamente coactivas e de ameaça, mais ou menos velada, aos trabalhadores.
O direito à greve está garantido pelo artigo 51.º da Constituição angolana, que remete a sua regulamentação para a lei ordinária.
Por sua vez, a lei que regula o direito à greve é a Lei n.º 23/91, de 15 de Junho. A lei aplica-se a todos os trabalhadores do sector público e privado, excepto aqueles que estão elencados no artigo 6.º. Nesse elenco não se enquadram os técnicos de justiça e funcionários da PGR, portanto, não há qualquer dúvida de que a lei se lhes aplica.
O artigo 4.º da mesma lei garante a liberdade de aderir à greve e proíbe qualquer discriminação em relação aos participantes numa greve.
Com efeito, a lei distingue entre greves lícitas e ilícitas, sendo estas últimas proibidas e puníveis (artigo 7.º). Para uma greve ser lícita, a lei exige uma série de requisitos legais, entre os quais a existência de assembleias de trabalhadores (art.º 10.º) e um procedimento decisório e negocial adequado (artigos 9.º e 10.º).
A PGR vem dizer que os trabalhadores não cumpriram estes procedimentos. Ora, deve haver aqui alguma distracção. O processo grevista e a sua decisão já ocorrem, como aliás o Sindicato salienta, desde, pelo menos, Abril de 2017. E em Julho de 2017 foi decidida uma greve a ser realizada por fases, a primeira das quais teve lugar ainda nessa época, e a segunda terá lugar agora.
Não tem razão, portanto, a PGR ao querer isolar esta greve como um único acto agora a ocorrer. Todas as aprovações e decisões foram realizadas oportunamente.
É verdade que a lei permite à PGR não pagar os salários dos grevistas (artigo 21.º), mas também lhe dá a faculdade de os pagar se assim o decidir, o que seria um bom sinal de abertura para as negociações. Ao declarar de antemão que não vai pagar salários aos grevistas, o procurador-geral endurece a sua posição, e não demonstra a flexibilidade que o “novo” regime pretendia arvorar.
Ao estabelecer que a greve dos trabalhadores acarretará faltas injustificadas para estes, o general Hélder Pita Grós esquece que a lei já define no seu artigo 21.º os efeitos da greve. O principal é a suspensão da relação jurídico-laboral, sem prejuízo dos direitos laborais a férias, segurança social e antiguidade.
De notar, finalmente, que o artigo 26.º da Lei da Greve proíbe a coacção para evitar ou impedir as greves. Haverá que estar atento às actuações dos dirigentes, designadamente do procurador-geral da República, pois o comunicado da PGR indicia uma vontade coactiva e um efectivo mal-estar com a greve. Pode, por isso, ser interpretado, em conjunto como outras eventuais atitudes ou acções, como uma forma ilegal de impedir a greve.
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