Análise
Paulo Guilherme
Salvar a face - talvez seja esta a expressão que melhor abarca o que José Eduardo dos Santos faz ao deixar a João Lourenço a candidatura presidencial do partido em 2017. A opção começou a tornar-se clara a 14 de Novembro e confirmou-se na reunião do Bureau Político a 01 dezembro, ambas noticiadas pelo Africa Monitor Intelligence em primeira mão.
Era por de mais evidente a impopularidade do presidente, que era visto até como um ónus para o partido, onde muitos se preocupavam com o resultado em 2017, perante uma crise económica e social sem precedentes. Até aqui chegar, JES urdiu uma complicada teia - bem ao seu jeito cerebral e calculista. Vem-no fazendo nos últimos meses, de acordo com uma estratégia que pode sintetizar-se em 5 pontos:
1. Controlo da economia pela família presidencial - Com a subida à presidência da Sonangol, Isabel dos Santos controla a principal fonte de receitas do país e 4 dos 5 maiores bancos - o maior, o BPC, é público e está descapitalizado; o filho varão, José Filomeno dos Santos, já controlava o Fundo Soberano de Desenvolvimento de Angola.
2. Um fiel na presidência - João Lourenço, além de apoiado dentro do partido e pelo aparelho militar, manteve sempre a lealdade à família presidencial, evitando conflitos - mesmo quando, pela mão de JES, fez a sua travessia do deserto.
3. A Presidência do partido - Será o "posto de vigia" de Santos, onde poderá mover, mais ou menos discretamente, as suas influências. E, com elas, assegurar que os seus interesses - e os da família - não são tocados.
4. Uma extensa rede de influências - Incluindo figuras fiéis, que promoveu, ao longo de 37 anos, aos mais altos cargos, desde a Segurança e Defesa ao sector empresarial do Estado.
5. Domínio da máquina eleitoral - Com os novos poderes do governo sobre a Comissão Nacional Eleitoral, e da comunicação social do Estado, com crescente pressão sobre privados independentes - acrescida com a (abrupta) aprovação da nova lei do sector, que condiciona ainda mais o trabalho dos jornalistas, um poderoso factor para a vitória eleitoral do MPLA.
A ironia é que o MPLA chega às eleições de 2017 com caras novas - enquanto UNITA e CASA-CE trazem as caras de sempre. Com o controlo do espaço mediatico pelo partido-Estado, onde irá o eleitor angolano ver a mudança?
Ao sair agora, em vésperas de um ano de 2017 em que não se esperam alterações significativas da conjuntura de depressão dos últimos anos, José Eduardo dos Santos livra-se de mais críticas. E pode mesmo passar à história como um chefe de Estado africano que livremente abdicou do poder. Magnanimidade que os media do Estado não se cansarão de repercutir, previsivelmente.
Ao mesmo tempo, cola ao momento do seu partido uma palavra que há muito - dentro e na sociedade - se ansiava por ouvir - Renovação. Será só verbo de encher?
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