terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Na era do Twitter, parar para pensar

EDITORIAL


As réplicas do caso dos offshore são a prova (de que não precisávamos) de que as notícias vivem tempos difíceis. Mas também de como é fundamental a descoberta da verdade.
10 mil milhões de euros é mesmo muito dinheiro - mas nem era o essencial da notícia que o PÚBLICO trouxe há precisamente uma semana. O maior problema que denunciámos não está na quantia, está na falha da Administração Fiscal.
Escrevemos um Editorial sobre isso, aqui mesmo, neste espaço. Referindo que não sabíamos o que tinha falhado, quem tinha falhado e sequer se o erro teria consequências na colecta de impostos. Mas quando a notícia chegou aos políticos (e aos amigos deles), foi rapidamente contestada, reescrita, usada para fazer uma guerra - sem sequer a ler, sem esperar. Repito: sem esperar.
Ninguém está imune a esta crítica. Enquanto de um lado nos acusavam de replicar uma notícia de Abril, do outro espalhavam a ideia de uma gigantesca fuga ao fisco. Sim, as réplicas do caso das offshore são a prova (de que não precisávamos) de que as notícias vivem tempos difíceis.
Sim, a política do Twitter já chegou a Portugal e está confortavelmente instalada. Se os políticos sempre trataram os media como veículos de conveniência, hoje reduzem-nos a um título para circular nas redes sociais. É o que basta para mostrar uma ideia (e esconder o resto), é o que conta num debate que se repete a cada quinze dias, é o que chega para um (cada vez mais rápido) duelo televisivo. Quando vivem para as claques, os políticos mostram o quanto preferem o curto prazo à verdade. Daí ao que temos visto na América é uma estrada curta.
A nós, a imprensa, casos como este só obrigam a reforçar o rigor com que fazemos as notícias, o cuidado com que ouvimos os argumentos - e a coragem de os verificar. A si, leitor, deve levá-lo a ler com muito cuidado as notícias antes de ir ver o que corre nas redes sociais. É que mesmo um militante ou um membro de uma claque é também, no fim do dia, um contribuinte e um eleitor. Nunca se esqueça disso.
Feita a recomendação, sorrimos com as consequências. Neste caso das offshore, uma semana depois, já todos defendem que o Fisco deve ser obrigado a publicar as estatísticas das transferências (um passo seguro na direcção da transparência, que é a única forma de descobrirmos os erros da Administração). Uma semana depois, também o Fisco já percebeu que não lhe vamos tolerar os erros (que não nos tolera a nós). 
Quanto à polémica que sobra, ouçamos os responsáveis, esperemos pelas conclusões da Inspecção-Geral. Aí sim, voltaremos ao caso. Com os factos devidos poderemos fazer alguns julgamentos.

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