Dicas sobre como reclamar injustiça
O sentimento de injustiça tem sido instrumental para a mudança. Ninguém se sente bem onde acha que não recebe o tratamento que lhe é devido. O problema, contudo, é que a própria ideia de injustiça não é de fácil definição. Há diferenças fundamentais entre as pessoas e, muitas vezes, o tratamento desigual resulta dessas diferenças. Por exemplo, se você não tem formação em direito, ninguém tem a obrigação de ouvir a sua opinião sobre se o novo código penal viola a constituição ou não. Dar preferência à opinião de juristas faz sentido. Você não pode ser maltratado pela justiça, porém, simplesmente porque não tem formação em direito. O desiderato de justiça impõe apenas o tratamento como se fosse igual, sem que disso resulte uma igualdade absoluta. A dificuldade que temos em destrinçar estas coisas faz com que a gente complique desnecessariamente a abordagem de assuntos sérios. Tenho algumas dicas sobre isso também:
1. Conceitos que estabelecem princípios não fazem sentido fora dum esquema filosófico coerente. O conceito de justiça, por exemplo, parece fácil de entender e parece ter significado igual para toda a gente, mas isso não é verdade. “Justiça” para um marxista, liberal, comunitarista ou mesmo para os matxanganas lá de Makeze não é mesma coisa;
2. Quando você reclama alguma injustiça, você está essencialmente a dizer que a coisa que você reclama viola algo essencial à prossecução do tipo de vida que é promovido por esse conceito de justiça. Por causa disso, por vezes até a solução para o problema pode não estar onde você pensa que está;
3. Por exemplo, você pode achar com razão que é injusto ser governado por idosos num país de maioria jovem. A solução para isso não é necessariamente afastar os velhos do poder. Normalmente, esse tipo de solução revela inconsistências no seu entendimento do conceito de justiça;
4. Só para tornar a coisa mais clara: os nacionalistas moçambicanos que lutaram contra o regime colonial português fizeram-no por razões que tinham a ver com a ideia de que era injusto que um país africano fosse governado por europeus ou até mesmo a ideia de que um país de negros fosse governado por brancos. Na prática, contudo, o que eles formularam como problema a resolver não foi a substituição de europeus ou brancos por africanos ou negros, mas sim a mudança do sistema político para que ele fosse sensível à dignidade humana, a principal razão pela qual o sistema colonial produzia a injustiça contra a qual eles lutaram;
5. Antes de desejar que o exemplo de outros países que colocam jovens no poder sirva de modelo para Moz, procure saber para que tipo de injustiça ele foi uma solução. Não se esqueça que nesses países o rejuvenescimento pode ser manifestação de um de dois factores importantes;
6. Primeiro, pode ser que o envelhecimento geral da população em condições de bem-estar promova nos mais velhos apatia em relação à política e maior interesse em gozar a vida. Nessas circunstâncias, o surgimento de jovens na arena política não seria necessariamente o resultado de algum projecto de rejuvenescimento, mas sim uma resposta natural à demografia;
7. Segundo, a política nestes países não atrai necessariamente os mais capazes e inteligentes, mas sim aqueles que têm um espírito missionário de alguma espécie ou não são suficientemente bons nas suas áreas profissionais e, por isso, tentam a sua sorte na política. Aliás, isto é algo que vemos no nosso próprio país. Muitos bons profissionais são cada vez mais reluctantes em aceitar postos de governação com o receio de que isso prejudique a sua carreira profissional. A profissão de “chefe” tem cada vez menos aderentes em Moz.
8. Alguns jovens que reclamam “inclusão” no nosso país têm um perfil profissional de activismo, isto é de pessoas muitas vezes sem profissão definida (o que não quer dizer que não tenham formação profissional), mas que se afirmam através da articulação de “causas” que os reproduzem socialmente. A injustiça que eles reclamam não descreve necessariamente a violação de algo que os impede de viver o tipo de vida que o seu conceito de justiça (se o tiverem) protege e promove, mas sim a necessidade que têm de se reproduzir como “activistas”. São políticos natos;
9. Em Moz a suspeita de que os idosos controlam tudo pode ser uma ilusão óptica. Por um lado, ela pode ser a confusão que se faz entre a protecção do legado da Frelimo (que faz com que as vozes dominantes dentro desse partido, até há pouco os “históricos”, continuem determinantes na indicação de pessoas, incluindo de jovens, para lugares de responsabilidade – foi assim com o actual presidente) e a limitação de oportunidades para os jovens que não fazem parte do círculo de poder;
10. Por outro lado, a acusação de dominação de idosos não corresponde à verdade. Os jovens é que seguram Moz e os poucos “velhos” que dão nas vistas parecem ocupar os postos que ocupam simplesmente por causa da sua competência e experiência, algo que num país apesar de tudo jovem é importante. A “injustiça” nestas circunstâncias não se manifesta necessariamente em termos etários, mas sim em termos de acesso aos recursos de poder por parte de todos os moçambicanos que não estão vinculados aos círculos de poder. O problema é de oportunidades, não de velhos e jovens.
2. Quando você reclama alguma injustiça, você está essencialmente a dizer que a coisa que você reclama viola algo essencial à prossecução do tipo de vida que é promovido por esse conceito de justiça. Por causa disso, por vezes até a solução para o problema pode não estar onde você pensa que está;
3. Por exemplo, você pode achar com razão que é injusto ser governado por idosos num país de maioria jovem. A solução para isso não é necessariamente afastar os velhos do poder. Normalmente, esse tipo de solução revela inconsistências no seu entendimento do conceito de justiça;
4. Só para tornar a coisa mais clara: os nacionalistas moçambicanos que lutaram contra o regime colonial português fizeram-no por razões que tinham a ver com a ideia de que era injusto que um país africano fosse governado por europeus ou até mesmo a ideia de que um país de negros fosse governado por brancos. Na prática, contudo, o que eles formularam como problema a resolver não foi a substituição de europeus ou brancos por africanos ou negros, mas sim a mudança do sistema político para que ele fosse sensível à dignidade humana, a principal razão pela qual o sistema colonial produzia a injustiça contra a qual eles lutaram;
5. Antes de desejar que o exemplo de outros países que colocam jovens no poder sirva de modelo para Moz, procure saber para que tipo de injustiça ele foi uma solução. Não se esqueça que nesses países o rejuvenescimento pode ser manifestação de um de dois factores importantes;
6. Primeiro, pode ser que o envelhecimento geral da população em condições de bem-estar promova nos mais velhos apatia em relação à política e maior interesse em gozar a vida. Nessas circunstâncias, o surgimento de jovens na arena política não seria necessariamente o resultado de algum projecto de rejuvenescimento, mas sim uma resposta natural à demografia;
7. Segundo, a política nestes países não atrai necessariamente os mais capazes e inteligentes, mas sim aqueles que têm um espírito missionário de alguma espécie ou não são suficientemente bons nas suas áreas profissionais e, por isso, tentam a sua sorte na política. Aliás, isto é algo que vemos no nosso próprio país. Muitos bons profissionais são cada vez mais reluctantes em aceitar postos de governação com o receio de que isso prejudique a sua carreira profissional. A profissão de “chefe” tem cada vez menos aderentes em Moz.
8. Alguns jovens que reclamam “inclusão” no nosso país têm um perfil profissional de activismo, isto é de pessoas muitas vezes sem profissão definida (o que não quer dizer que não tenham formação profissional), mas que se afirmam através da articulação de “causas” que os reproduzem socialmente. A injustiça que eles reclamam não descreve necessariamente a violação de algo que os impede de viver o tipo de vida que o seu conceito de justiça (se o tiverem) protege e promove, mas sim a necessidade que têm de se reproduzir como “activistas”. São políticos natos;
9. Em Moz a suspeita de que os idosos controlam tudo pode ser uma ilusão óptica. Por um lado, ela pode ser a confusão que se faz entre a protecção do legado da Frelimo (que faz com que as vozes dominantes dentro desse partido, até há pouco os “históricos”, continuem determinantes na indicação de pessoas, incluindo de jovens, para lugares de responsabilidade – foi assim com o actual presidente) e a limitação de oportunidades para os jovens que não fazem parte do círculo de poder;
10. Por outro lado, a acusação de dominação de idosos não corresponde à verdade. Os jovens é que seguram Moz e os poucos “velhos” que dão nas vistas parecem ocupar os postos que ocupam simplesmente por causa da sua competência e experiência, algo que num país apesar de tudo jovem é importante. A “injustiça” nestas circunstâncias não se manifesta necessariamente em termos etários, mas sim em termos de acesso aos recursos de poder por parte de todos os moçambicanos que não estão vinculados aos círculos de poder. O problema é de oportunidades, não de velhos e jovens.
Dentro de dias vou acrescentar mais um ano à minha vida e merecer o meu lugar no campo dos idosos. Isso significa que, em princípio, devia ficar mais sábio, algo difícil numa pessoa que tem dificuldades com o conceito de modéstia. De qualquer maneira, gostaria de dizer que me esforço em ser modesto (ainda que seja difícil...). A minha imodéstia, contudo, não tem a ver com ter razão a todo o custo, pois as coisas sobre as quais insisto nestes textos não se referem a algo que se resolva dessa maneira. A minha preocupação é de convidar o maior número de pessoas a observar as melhores maneiras de discutir e reflectir assuntos de interesse geral. Essas maneiras não garantem a verdade, mas aproximam-nos mais dela se é que ela existe.
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