terça-feira, 20 de novembro de 2018

Um Rochedo debaixo do sapato. Espanha não aprova acordo do Brexit

Bruxelas diz que há consenso entre os 27 sobre o documento de 585 páginas, mas Madrid quer garantias em como o futuro estatuto de Gibraltar será negociado à parte. Em Londres, Corbyn afirma que os trabalhistas não aceitam ausência de acordo.

A Espanha não vai aprovar o acordo entre o Reino Unido e a União Europeia se não ficar assegurado que o futuro estatuto de Gibraltar será negociado entre Londres e Madrid. "O artigo 184.º apareceu do dia para a noite. Só o descobrimos na quarta-feira", disse o ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol, Josep Borrell, em Bruxelas.
"Nós queremos ter a certeza de que a interpretação do texto é clara e que demonstre que o que está a ser negociado entre a União Europeia e o Reino Unido não se aplica a Gibraltar. As negociações futuras sobre Gibraltar são separadas. Até que isso fique claro no texto de retirada e na declaração política sobre a relação futura não vamos poder concordar", afirmou aos jornalistas.
O citado artigo estipula que a União Europeia e o Reino Unido irão "tomar as medidas necessárias para negociar rapidamente os acordos que regem a futura relação", sem mencionar a questão de Gibraltar, território britânico desde 1713 e reclamado pela Espanha.

Como o dossiê sobre a Irlanda e as bases aéreas britânicas em Chipre, o Rochedo também foi contemplado num protocolo próprio, que prevê uma comissão de coordenação hispano-britânica que abarque os direitos dos trabalhadores transfronteiriços, as questões ambientais, de pescas e de segurança, bem como as questões fiscais e o uso do aeroporto.
Um funcionário de Bruxelas recordou à Reuters que a Espanha foi obrigada a aceitar as posições britânicas sobre Gibraltar quando negociava a sua adesão à então CEE, em 1986, e que Londres agora tem de aceitar que "o jogo mudou".
As objeções de Espanha surgiram no mesmo dia e no mesmo local em que o negociador chefe da UE para o Brexit, Michel Barnier, garantiu que os 27 estão em sintonia quanto ao acordo, o qual considerou "justo e equilibrado".
Este quase consenso marca o início de mais uma semana que se prevê agitada no que respeita à saída do Reino Unido da UE e que culmina com um Conselho Europeu extraordinário no domingo.
Em Londres continua a contagem de cartas de deputados conservadores a chegar ao Comité 1922, a pedir uma moção de censura à líder do partido. Mas à medida que o tempo passa esse cenário parece cada vez mais afastado. A explicação é que mesmo que se atinja o número mínimo de 48 cartas para desencadear o processo de destituição, a maioria dos tories não quer neste momento usar esta cartada. Se a moção não passar, a chefia de Theresa May não pode ser desafiada durante um ano.

Livre circulação ou passar à frente da fila?

A primeira-ministra foi alvo de críticas devido ao seu discurso na Confederação da Indústria Britânica. Ao defender o Brexit, May usou como argumento um maior controlo migratório e que os europeus vão deixar de "passar à frente da fila" no acesso aos empregos.
A chefe do governo da Escócia, a europeísta Nicola Sturgeon, lamentou a forma como May falou do assunto. "Impedir que os cidadãos da UE passem à frente da fila - que o argumento do Brexit tenha sido reduzido a uma frase tão miserável e autodestrutiva é deprimente ao extremo". Horas depois Sturgeon voltou à carga: "Na realidade, quanto mais eu penso sobre isto, mais ofensivo é 'passar à frente da fila' como uma descrição do direito recíproco de livre circulação. Verdadeiramente vergonhoso."
Também os Scientists for EU, uma organização de cientistas britânicos que querem que o Reino Unido permaneça na UE, criticaram os termos usados por Theresa May. "Os cidadãos da UE não 'passam à frente da fila' dos engenheiros/cientistas da Índia e da Austrália. Os laboratórios e as empresas identificam o talento de que necessitam. Se os indivíduos são de fora da UE, o nosso próprio governo coloca as barreiras", reagiu a organização no Twitter.

Corbyn rejeita saída sem acordo

No mesmo evento da confederação empresarial, o trabalhista Jeremy Corbyn garantiu que o seu partido não vai aceitar que o Reino Unido saia da UE sem acordo se o documento aprovado pelo governo britânico e pela Comissão Europeia for rejeitado pelo Parlamento.
O Labour - ou pelo menos os deputados leais a Corbyn - irá votar contra a proposta de acordo na Câmara dos Comuns. No entanto, o partido também "não irá aprovar um Brexit sem acordo" porque exporia os negócios e as pessoas a perturbações, disse o líder trabalhista perante empresários.
Corbyn não especificou o que irá o seu partido fazer nesse cenário, mas aproveitou o palco para mais uma vez demolir a proposta de acordo. Desta vez referiu-se ao período de transição, que "aprisiona o país na incerteza" durante anos.
"O resultado desta prioridade distorcida é um acordo para o Brexit que simplesmente não é bom o suficiente. Em vez de acabar com a incerteza dos últimos dois anos e meio, o acordo que o governo negociou aprisiona-nos na incerteza por mais dois, três, quatro - quem sabe quantos anos mais?", perguntou.

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