domingo, 9 de setembro de 2018

Contactado pelo Jornal, Felisberto Manuel evocou problemas de saúde como a razão para a renúncia na direcção executiva da EMATUM.

 Mas perante nossa insistência, deixou escapar que, na verdade, já não suportava com “tanta confusão” na EMATUM, embora prefira não assumi-lo publicamente. Mas uma coisa assumiu: “preciso de estar num ambiente tranquilo”. E esse local tranquilo é a Pescamar. “Aqui há menos confusão. Tenho documentos médicos que me recomendam a estar num sítio mais tranquilo. Então, decidi regressar porque há menos pressão”, precisou. Questionado sobre se na EMATUM havia muita pressão, foi cauteloso. “Não é isso que estou a dizer”, respondeu. Como sempre, António Carlos do Rosário não respondeu às nossas chamadas telefónicas. Dirigimo-nos à sede da EMATUM. À nossa chegada, o cenário de quase abandono total na empresa, em plena hora normal de expediente, nos vai chamar atenção. A campainha montada na entrada do edifício accionámo-la que baste. Mas não houve resposta, até que um agente de segurança, que se encontrava do lado exterior, se apercebeu da nossa presença e instruiu a colega que estava no interior a nos abrir o portão. Chegamos à recepção, só que não havia recepcionista e, com o apoio da agente de segurança, foi possível chegarmos à fala com um de dois trabalhadores que se encontravam nos fundos do edifício. “Não trabalha aqui”, informa-nos o trabalhador em referência a António Carlos do Rosário que, ao que nos disse o referido trabalhador, só vai à EMATUM para atender a “questões pontuais”. Para além da EMATUM, com uma dívida inicial de USD 850 milhões, o “indivíduo A”, como é conhecido o todo-poderoso agente do SISE, é também PCA da MAM [USD 535 milhões] e da Proindicus [USD 622 milhões], as outras duas empresas que compõem o pacote das chamadas dívidas ocultas, uma operação nebulosa que empurrou o país à maior crise económico- -financeira de sempre.

D efinitivamente, caiu por terra aquela que era a última esperança de Venâncio Mondlane se candidatar à presidência do município de Maputo, nas eleições autárquicas de 10 de Outubro próximo. Hermínio Morais, ou, simplesmente, “Comandante Bobo”, alcunha dos tempos de guerrilha, é o homem que se segue. Em acórdão nr 8/CC/2018 de 03 de Setembro, o Conselho Constitucional (CC), em decisão já esperada, julgou improcedente o recurso submetido pela Renamo e por Venâncio Mondlane contra a decisão da Comissão Nacional de Eleições (CNE) de rejeitar a candidatura do cabeça-de-lista do principal partido da oposição a autarca da capital. Nos próximos dias, o maior partido da oposição deverá oficializar o general na reserva Hermínio Morais como cabeça-de-lista, uma vez que é o número dois da candidatura da Renamo em Maputo. Apesar de ser um conhecedor profundo da Renamo, onde chefiou a delegação do partido na Comissão Conjunta para a Formação das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (CCFADM), na sequência do Acordo Geral de Paz (AGP), não tem o carisma político de Venâncio Mondlane e estava praticamente na “prateleira” há vários anos. Sinal de alguma condescendência em relação à Renamo, Morais foi recentemente “acomodado” no Conselho de Administração da estatal Petromoc, uma prática tradicional em relação a velhos quadros da Frelimo. A Petromoc, que há anos não publica relatórios de contas, é uma das empresas do Estado em situação de falência técnica. Veredicto Esta terça-feira, o CC nem se deu ao trabalho de apreciar o mérito da exposição da Renamo, limitando-se a analisar a conformidade formal do partido e de Venâncio Mondlane para pedirem a declaração de inconstitucionalidade das normas usadas pela CNE para chumbar a candidatura do cabeça-de-lista. No seu veredicto, o CC lembra que apenas o Presidente da República, a Presidente da Assembleia da República, pelo menos um terço dos deputados da Assembleia da República, o Primeiro-ministro, o Procurador Geral da República, o Provedor da Justiça e dois mil cidadãos podem pedir a apreciação da constitucionalidade de uma lei. “Face ao exposto, o Conselho Constitucional nega provimento ao recurso interposto pelo partido Resistência Nacional Moçambicana- Renamo e ao cidadão Venâncio António Bila Mondlane”, sentenciou o CC. De acordo com o acórdão, a Renamo solicitou ao CC a não aplicação Cumpre-se a premonição Acórdão do CC afasta Venâncio Mondlane da norma contida no nr 4 e a última parte do nr 1, ambos dos artigo 14 de Lei nr 7/97 de 31 de Maio, conjugada com o nr 3 do artigo 18 da Lei nr 7/2013, de 22 de Fevereiro, alterada e republicada pela Lei nr 10/2014, de 22 de Abril e alínea b) do artigo 13 da Lei nr 7/2018 de 3 de Agosto, por ser inconstitucional e a consequente declaração de inconstitucionalidade. Mais ainda, a Renamo queria que se considerasse elegível Venâncio Mondlane como candidato e cabeça-de-lista daquele partido, uma vez que havia sido excluído do processo pela CNE. Venâncio Mondlane e Silvério Ronguane, cabeça-de-lista da candidatura do MDM por Matola, renunciaram aos seus mandatos de membros das assembleias municipais de Maputo e Matola, respectivamente, em 2015, enquanto membros do MDM, para exercerem o cargo de deputados na Assembleia da República, em representação do mesmo partido. A norma vertida no artigo 13 da Lei n.º 7/2018, de 3 de Agosto, dispõe que não é elegível para os órgãos autárquicos o cidadão que tiver renunciado ao mandato imediatamente anterior. Dado que se filiou à Renamo, o terceiro maior partido requereu a inelegibilidade de Mondlane como cabeça-de-lista do partido liderado por Ossufo Momade. A CNE deliberou pelo chumbo da candidatura de Venâncio Mondlane, com os votos favoráveis da Frelimo e do MDM, embora vários juristas tenham expressando opinião contrária, sugerindo “uma exclusão política” por parte da CNE. Inconformada com a deliberação, a Renamo submeteu um recurso ao CC para impugnar a deliberação da CNE, pedindo a declaração de inconstitucionalidade da norma evocada. Vamos avançar Reagindo à deliberação do CC, o mandatário da Renamo, André Magibire, lamentou a decisão que coloca Venâncio Mondlane fora da corrida eleitoral. Em alguns sectores, pede-se a cabeça dos juristas da Renamo que elaboraram a petição, por se entender que cometeram “erros monumentais”. Mas não restam dúvidas para Magibire de que se trata de uma atitude movida com contornos políticos decorrentes da aliança entre a Frelimo e o MDM. “Felizmente, a nossa lista não cai. Mas lamentamos com muita profundidade a exclusão daquele que daria um outro dinamismo a esta cidade de Maputo, que é Venâncio Mondlane”, declarou. Venâncio Mondlane, prosseguiu, saberá compreender a situação, que resulta de uma perseguição, “porque os nossos opositores querem ganhar as eleições antes da sua realização, excluindo os seus potenciais adversários”. Referiu que, de momento, o partido só se pode conformar com a decisão do CC por esta ser a última instância a que se pode recorrer. Com a exclusão de Mondlane, o cabeça-de-lista da Renamo em Maputo poderá ser o general na reserva Hermínio Morais, que é número dois da lista. O número três é Gilberto Chirindza, um burocrata partidário afecto ao Gabinete de imprensa e propaganda e estudante de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane. Magibire remeteu à Comissão Política Nacional do seu partido o anúncio oficial do sucessor de Mondlane como cabeça-de-lista. Vincou que a exclusão dos cabeças- -de-lista da Renamo, que se tem verificado em algumas autarquias, visa fazer com que o partido boicote o pleito de Outubro próximo, facto que, segundo Magibire, não irá ocorrer. Lamentou o facto de essa acção ocorrer numa altura em que decorem negociações com o governo para o restabelecimento da paz efectiva e duradoura, pelo que considera incoerente este tipo de comportamento. Na semana passada, o coordenador interino da Renamo, Ossufo Momade, havia-se pronunciado nos mesmos termos, denunciando aquilo que chamou de perseguição dos membros do seu partido. Venâncio Mondlane e outros candidatos da Renamo têm sido humilhados publicamente pela polícia ao não permitir marchas de rua dos seus militantes e candidatos em contraste com os comícios desenvolvidos em todo o país pela Frelimo. Nada está perdido Para o jurista João Nhampossa, a Renamo distraiu-se daquilo que era o objectivo da sua contestação no processo. Explicou que os argumentos estão claros e a Renamo tinha tudo para contestar o ponto da CNE ter violado e aplicado mal o direito, tendo em consideração a situação de Venâncio Mondlane e Silvério Ronguane, que, apesar de estarem na mesma situação, tiveram tratamento desigual. Segundo Nhampossa, o principal partido da oposição não conseguiu fazer com que o CC deliberasse sobre a questão de fundo por ter apresentado de forma contrária o problema. Diz que nada está perdido e tudo depende da agilidade do próprio partido, porque, depois da deliberação, a Renamo pode solicitar ao CC que aprecie e revogue a decisão da CNE no âmbito da lei eleitoral. É que, por estas alturas, o CC funciona como tribunal eleitoral e uma vez que não chegou a apreciar o fundo da questão chumbada pode agora apreciar esta. Vincou que o CC devia se abstrair um pouco mais e ir ao fundo da questão, porque aquele problema foi levantado no âmbito da lei eleitoral, não descura o mérito do acórdão ao evocar falta de legitimidade dos requerentes. Para o jurista Simeão Cuamba, o CC decidiu em função daquilo que lhe foi pedido pela Renamo, que pretendia ver declarada a inconstitucionalidade da norma. Cuamba é de opinião que neste processo ter-se ia solicitado a nulidade da decisão da CNE que coloca fora da corrida Venâncio Mondlane e não a declaração de inconstitucionalidade. Defende que se o CC tivesse conhecido o caso por via oficiosa até poderia ter salvo Mondlane como cabeça-de-lista. Enquanto Nhampossa entende que a Renamo ainda pode voltar ao CC ao abrigo do contencioso eleitoral, Cuamba argumenta que nada mais pode ser feito porque esgotaram todos os mecanismos. Falharam no procedimento O jurista Vicente Manjate entende que a Renamo confundiu as competências do CC, ao acreditar que poderia declarar a inconstitucionalidade daquela norma, apontando que cada um dos pedidos solicitados pela “perdiz” segue um processo próprio. Manjate, que é representante da Ordem dos Advogados na Beira, apontou que a declaração de inconstitucionalidade é um processo complexo e regra geral não é urgente, enquanto que um recurso eleitoral é célere. Destacou que depois desta batalha, já não é possível a Renamo participar nas eleições com Mondlane, como cabeça-de-lista, mas pode pedir inconstitucionalidade para casos futuros. A Associação Juvenil para Desenvolvimento de Moçambique (AJUDEM), movimento que suporta a candidatura de Samora Machel Jr, que na semana finda viu o seu recurso reprovado na CNE, decidiu avançar esta segunda- -feira para o Conselho Constitucional. Este movimento viu a sua candidatura rejeitada por insuficiência de suplentes, depois de seis integrantes da sua lista de candidatura terem abandonado a lista por suposta pressão política vinda do partido governamental. Esta é a causa evocada pela associação na sua contestação, ao considerar que uma vez pressionados os seus membros para abandonar a lista, deve ser dada uma oportunidade de indicar outras pessoas para fecharem os lugares vagos. O jornal “Canal de Moçambique” , publica esta semana um relato aterrador de um dos integrantes da lista da AJUDEM, forçado a retirar o nome na candidatura perante a ameaça de acólitos do partido Frelimo. Fontes credíveis no partido Frelimo indicaram ao jornal haver instruções “ao mais alto nível” para que a CNE e o Conselho Constitucional desqualificassem as candidaturas de Venâncio Mondlane e Samora Machel Jr. AJUDEM aguarda pelo CC -C ompunha o acervo do Museu Nacional do Rio de Janeiro cerca de vinte milhões de itens. Arderam, esta semana. Com lata, afirmou o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão, em entrevista à GloboNews: “O ocorrido é parte do processo de negligência de anos anteriores. Que isso sirva de alerta”, esquecendo-se de referir os cortes drásticos orçamentais que tem imposto à instituição: para 2018 foi atribuído ao Museu a irrisória quantia de 205.821 reais. Lastimou Temer: ”A perda do acervo do Museu Nacional é incalculável para o Brasil. Hoje é um dia trágico, foram perdidos 200 anos de trabalho, pesquisa e conhecimento”. São credíveis as suas lágrimas quando a sua gestão investe menos no Museu Nacional do que a Câmara dos Deputados na lavagem de seus 83 veículos oficiais? Enviou-me o Luís Carlos Patraquim o email do poeta Alexei Bueno, que dá a dimensão trágica do ocorrido: «Muito obrigado Reinaldo, chorei muito ontem, passei inúmeros dias da minha infância nesse museu, lá levei meu filho, e assim por diante. Além do que era visto, pouca gente avalia o valor do que não estava exposto, era o que havia de mais importante no Brasil, seguido pela Biblioteca Nacional. Além da coleção egípcia, na verdade a maior do Hemisfério Sul, e da coleção grega – da Magna Grécia -, etrusca e romana da Imperatriz Teresa Cristina (que era de Nápoles), lá estava guardada toda a história de etnologia e arqueologia brasileiras, as urnas marajoaras e tapajônicas, os fósseis, a Coleção da Comissão Rondon e a Coleção Roquette-Pinto (filmes, fotos, registros sonoros, não sei se algo foi copiado), os papéis do Curt Nimuendaju (um alemão que foi o maior etnólogo do Brasil), a magnífica coleção de taxidermia (quantos taxidermistas deve haver hoje, e com aquela qualidade?), os fósseis, os ossos de dinossauros, a sala do trono, onde Deixar arder a memória havia a célebre cerimônia do beija- -mão, milhares de peças de tribos já extintas, um trono que o rei do Daomé deu para D. João VI em 1811, sem similar nem no Quai Branly, tudo destruído. Duzentos anos de coleta, escavações e estudos etnológicos dum país que tem o quarto território contínuo do mundo transformados em pó. Havia quatro vigias para um prédio de 13 mil m2, obviamente sem qualquer recurso, que viram o início do fogo e fugiram, os hidrantes sem água, etc... Exatamente 40 anos depois do incêndio do MAM. E tentavam conseguir vinte milhões (quatro milhões de euros!!!) para o prédio! Mais do que o dobro disso havia no apartamento de Geddel Viera Lima, um deputado corrupto, em Salvador. Gastaram dois bilhões para demolir e adulterar o Maracanã, uma construção classificada federalmente, e queriam resolver o problema dum prédio daquele tamanho e mais do que bicentenário com vinte milhões!!! Nem o interior do prédio conseguirão recuperar, todos os pisos originais, com as imensas tábuas de velhas madeiras brasileiras hoje indisponíveis, os tetos estucados e pintados... Não há o que falar.  Um grande abraço, extensivo aos amigos.» E estes são apenas os incêndios visíveis. Ocorre o desastre ao mesmo tempo em que um candidato às eleições brasileiras, o inefável Bolsonaro, num comício, simula uma metralhadora e diz o que fará aos do PT, caso ganhe, sem que qualquer Comissão Nacional de Eleições o torne imediatamente inelegível. O que ressalta da negligência a que foi votado o Museu e que levou ao incêndio que o destruiu é a triste suspeita de que chamar país ao Brasil possa ser uma calúnia. Como aliás se podia dizer o mesmo, depois dos desastres de Pedrogão e de Monchique, sobre Portugal. Há algo de corrosivamente doentio na aptidão orgiástica com que nos países de língua portuguesa se adulteram e trocam as prioridades nos gastos dos dinheiros públicos, como se padecessem de uma sintaxe infernal que atoleima os seus falantes e conecta os seus destinos às variações de um naufrágio repetitivo e sem remissão. Respondia Hannah Arendt numa entrevista, sobre ter continuado a praticar o alemão a níveis mais profundos, depois de ter enfrentado os horrores do Holocausto. “Mesmo nos tempos mais amargos?”, pergunta o entrevistador. E responde ela: “Eu interrogava- -me: o que fazer? De qualquer maneira não foi a língua alemã que enlouqueceu!”. Já Derrida, num livro muito interessante, O Monolinguismo do Outro, levanta a suspeita de que as línguas possam enlouquecer e contaminar com a sua demência as comunidades que as usam, e até as instituições. Se olharmos para o que se passa no Brasil e em Moçambique (onde há muito ardem, em sentido figurado, o Arquivo Histórico ou o fantasmático Museu da Revolução), e para a irresolução de rumos sobre o que fazer com a Memória Colectiva em Portugal, Guiné e Angola, é difícil não concluirmos que seria difícil correr pior e como a inaptidão de cooperar e de operacionalizarmos algo de útil, sistémico, e de mútuo interesse, deixa cada país sozinho com as suas orgulhosas infeções internas. Há uma subcutânea maldade nesta incapacidade para, em todos os quadrantes, ultrapassar os irreais; nesta irresponsabilidade com que deixamos arder os valores e a cultura; nesta desagregação de vínculos, que prefere o egoísmo da má consciência à mutualidade de uma comunidade de língua que pudesse ser melhor em conjunto e erguer um carácter que relevasse por sobre os defeitos individuais? Não somos capazes. Será preciso deixar arder a língua, para darmos conta de que urge uma terapia? N um país onde a história é muitas vezes escrita de forma selectiva, poucos, em especial os mais novos, saberão a razão do 7 de Setembro ser chamado o Dia da Vitória. Mas nunca será repetitivo explicar que se refere ao dia em que, no ano de 1974, delegações da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e do governo português reuniram-se na capital da Zâmbia, Lusaka, e rubricaram os instrumentos que conduziriam ao fim de mais de 500 anos de dominação colonial portuguesa em Moçambique. Sublinhe-se aqui a designação da FRELIMO como movimento de libertação congregando todas as tendências independentistas moçambicanas, e não o partido político em que viria a transformar-se em 1977. Em pouco menos de dez meses depois daquela histórica data, Moçambique era um país independente, gozando, no plano internacional, dos mesmos direitos que outros estados independentes, e com uma identidade própria. Mas a vitória não teve o mesmo significado para todos os moçambicanos. Para alguns, que sacrificaram a sua juventude para lutar pela libertação deste país, mas que nesse processo caíram em desavenças com os seus camaradas, o 7 de Setembro marcou o início de um calvário que os levou até a uma morte particularmente indigna e violenta. Ao grupo dos “reacionários”, como eles foram apelidados pelos seus detractores, juntaram-se outros moçambicanos cuja visão de Moçambique independente colidia com o pensamento dominante da época. Entre os “reacionários” estavam inclusos aqueles que entendiam que as responsabilidades coloniais de Portugal obrigavam este país a organizar eleições antes de entregar o poder. Este grupo estava muito avançado quanto ao conceito de pluralismo político que viria, mais tarde, a ser adoptado em Moçambique. As contradições que se desenvolveram no seio do movimento de libertação não terminaram com o fim da luta pela independência política. Alcançada a vitória, os derrotados das lutas internas foram perseguidos, desterrados e executados extra -judicialmente. Como nunca foram julgados também nunca foram provadas as acusações que pesavam sobre eles. Igualmente, nunca foi publicamente ou oficialmente assumida qualquer responsabilidade sobre o destino que tiveram, o que pode justificar que os seus familiares os tomem ainda apenas como desaparecidos. Moçambique está a trilhar um longo e penoso percurso para a reconciliação, mas esses esforços nunca estarão verdadeiramente concluídos sem que as feridas do passado sejam completamente saradas. Porque estas pessoas desapareceram nas mãos do Estado moçambicano, há aqui a responsabilidade deste esclarecer em definitivo o destino que tiveram. Isto é importante não só por uma questão de permitir que a reconciliação nacional seja mais completa, como também para dar aos familiares dos desaparecidos a oportunidade de um desfecho final sobre um assunto que directamente lhes diz respeito. O Estado moçambicano não pode se dar ao luxo de continuar a viver o estigma de ter cidadãos seus desaparecidos nas suas próprias mãos.

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