terça-feira, 11 de dezembro de 2018

Fraudes nos exames: o vazamento da prova de Física e uma guerra comercial como pano de fundo


Ontem, o exame de Física da 12ª Classe foi cancelado na cidade de Maputo momentos antes da sua realização em 33 escolas públicas e privadas da capital, por fortes indícios de que a prova já estaria em circulação nas redes sociais. Ao princípio da noite, “Carta” soube de fonte segura que a anulação não abrange os distritos municipais da Catembe e Inhaca. Novo exame será realizado na próxima quinta-feira, 13 de Dezembro, abrangendo 4042 alunos e 137 elementos de júri.
Uma investigação foi lançada pelo Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano (MINEDH) visando apurar a fonte da publicitação da prova através das redes. O apuramento da explicação imediata para o vazamento da prova de Física poderá levar o seu tempo mas há evidências circunstanciais de uma tentativa de descredibilização do processo este ano.

Fraudes nos exames em Moçambique são um fenómeno comum. Regra geral, as provas são desviadas da rota de distribuição, depois da impressão. Este ano, em Agosto, o MINEDH tomou uma decisão corajosa: cancelou o contrato com uma empresa, a Sisonke, que tinha o exclusivo da impressão dos exames na RAS. Uma decisão política, almofadada por uma aferição técnica insuspeita, levou os exames à Brithol Michcoma, uma gráfica que faz impressão de segurança e é altamente cotada no sector financeiro de vários países da região, para quem presta serviço.
O envolvimento da Brithol fechou algumas torneiras de partilha de “comissões” por “procurement” manipulado por parte de grupos de dentro do Ministério, disse uma fonte. Isso provocou a sua ira. Não era para menos: os exames do ensino Secundário Geral e Técnico Profissional movimentam 70 milhões de Mts todos os anos. Esse valor é basicamente alocado para a produção de 25 toneladas de papel em exames. Uma das táticas do grupo de insatisfeitos é descredibilizar o processo de examinação, para mostrar que a mudança de operador não trouxe melhorias.

Antes do vazamento de ontem da prova de Física, já tinha havido muito burburinho na semana passada. Em escolas de Maputo, Boane e cidade de Nampula, registou-se um fenómeno inédito e estatisticamente improvável: o nível de notas positivas de 20 valores nos exames de Biologia e Matemática era demasiado alto, comparando com o normal. Pior...muitos dos que tiraram 20 valores tiveram negativas noutras disciplinas. Isso levantou suspeitas de que algo de estranho tinha ocorrido. A hipótese de um vazamento a partir da gráfica e dos seus canais de distribuição foi descartada. A Brithol distribui livros de cheques para bancos em Angola, Tanzania e Zâmbia e nunca teve quebras de segurança. No caso vertente, os exames são impressos e acondicionados numa embalagem selada de plástico, que é enviada para cada uma das escolas; lá são abertas por membros das comissões relevantes nas escolas. Não há como violar o plástico sem deixar marcas.

Com o anterior fornecedor, que subcontratava empresas sul-africanas para a impressão, os exames viajavam da RAS por terra e eram entregues às Direções Distritais da Educação. A distribuição para as escolas era também feita por terra. A probabilidade de fuga era grande. Com a Brithol, os exames são enviados de Maputo por avião para as províncias do centro e norte, e em todo o país não se envolve os armazéns da Educação. Só no dia da realização das provas é que as escolas recebem o envelope de plástico contendo os exames. 

Qual foi então a origem da boleia dos alunos que brilharam em Biologia e Matemática quando não eram alunos exemplares?
Uma das pistas aponta para professores das escolas Francisco Manyanga e Josina Machel, em Maputo. A elaboração dos exames conta com a colaboração de professores destas escolas e, curiosamente, foi nelas onde se verificou o fenómeno de notas anormais em Biologia e Matemática, o que levou a crer na possibilidade de alguns professores ao serviço do “lobby” da descredibilização terem vazado a correção dos respetivos exames. 
Há também um precedente estranho. No passado dia 29, um influente empresário da área da impressão gráfica, sediado em Nampula, fez circular uma informação dizendo que os exames de Biologia e Matemática estavam à venda em todos mercados da cidade e que alguns alunos da Escola Secundária de M’paca já o tinha adquirido. 
Quando foi confrontando por quadros do MINEDH, o aludido empresário não apresentou provas. Mas, dias depois, o fenómeno das anormais notas altas teria lugar em Nampula. Eventualmente, os alunos teriam tido acesso aos guias de correção, enviados de Maputo para esse empresário de Nampula, cujas ligações são suspeitas. (Omardine Omar)
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