O regresso do corpo do general “Ben Ben” a Angola, 20 anos depois de várias tentativas, representa “mais um passo” na remoção dos obstáculos para a reconciliação nacional dos angolanos, disse hoje, em Luanda, o presidente da UNITA. Claramente o MPLA usa Savimbi e ”Ben Ben” para ter a UNITA sob controlo. Se o Galo Negro não se importa, parecendo até que gosta…

Isaías Samakuva falava aos jornalistas antes da chegada a Luanda dos restos mortais do general Arlindo Chenda Pena “Ben Ben”, antigo vice-chefe do Estado-Maior das FALA, o então exército da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) e que chegou a ser adjunto do chefe do estado Maior das Forças Armadas Angolanas (FAA) após uma breve reconciliação com o MPLA.
Por outro lado, e questionado sobre se os restos mortais de Jonas Savimbi serão o próximo passo da UNITA e serão inumados até ao final deste ano, Samakuva salientou que esse era o desejo inicial, mas admitiu que existem “questões que têm de ser agilizadas”, pelo que só em 2019 será possível concretizar.
Se calhar nem será em 2019. Tudo depende de a UNITA se comportar com juízo e não fizer grandes ondas. Samakuva parece, aliás, estar bem convencido que a UNITA apenas é o maior partido da oposição que o MPLA permite que lhe seja feita.
“Sim, diria que é o próximo passo, mas olhemos para Angola. Estamos a falar de alguns casos apenas. Há outros casos, uns que são parentes da UNITA e outros do MPLA, outros que não são parentes nem da UNITA nem do MPLA. É preciso que olhemos para Angola no seu todo e é a Angola no seu todo que precisa desta reconciliação”, afirmou Samakuva.
“O Governo, o Estado, tem de parar e reflectir para que estes funerais ainda por fazer. Tem de se fazer com que as famílias por toda a Angola que estão a precisar ainda das certidões de óbito dos seus parentes um dia se sintam também descansados com aquilo que se está a fazer. Há sempre um ponto de partida”, acrescentou.
Sobre a recuperação dos restos mortais do primeiro presidente da UNITA, Samakuva lembrou que até o presidente angolano, João Lourenço, tinha concordado em realizar o processo todo até ao final do ano em curso, mas que tal não será possível.
“Era o desejo de todos nós. O presidente tinha concordado com isso, mas há, aqui, agora, trabalhos que estão a ser feitos e, na prática, parece que o calendário até ao fim do ano não vai dar. Há várias questões que têm de ser agilizadas e, por conseguinte, estamos a olhar para um período para além do fim do ano”, disse, sem especificar.
E Samakuva não especificou porque também não sabe. Então, se o Presidente da República, Presidente do MPLA e Titular do Poder Executivo quisesse não seria possível? Essa só contaram para o líder da UNITA. Se João Lourenço assim entendesse, até poderia ser já amanhã.
O líder “histórico” da UNITA nasceu a 3 de Agosto de 1934, no Munhango, a comuna fronteiriça entre as províncias do Bié e Moxico, e viria a ser morto em combate após uma perseguição das Forças Armadas Angolanas (integrando ex-generais das FALA como Geraldo Sachipengo Nunda, mais tarde Chefe do Estado-Maior das FAA), a 22 de Fevereiro de 2002, próximo de Lucusse, na província do Moxico, onde os seus restos mortais supostamente permanecem sepultados, à guarda do Estado angolano.
Sobre “Ben Ben”, que estava sepultado num cemitério em Zandfontein, próximo de Pretória, o actual líder da UNITA destacou o apoio do Presidente angolano, depois de anos em que tudo parecia “impensável”.
Da maneira subserviente e bajuladora como fala de João Lourenço, até poderá acontecer que Isaías Samakuva quando deixar (se deixar) a liderança da UNITA, possa ser “recuperado”, como outros militantes, pelo MPLA. “Ajoelhar-se”, perante João Lourenço, é um acto ofensivo para com Jonas Savimbi, Ben Ben, António Dembo, Jeremias Kalandula Chitunda, Adolosi Paulo Mango Alicerces, Elias Salupeto Pena, Eliseu Sapitango Chimbili e muitos, muitos outros.
“Temos todos de reconhecer, não só o facto de ter sido possível, hoje, trazer o corpo do general Ben Ben para Angola, como também que tudo se processou de uma forma bastante rápida quando, ao longo desse tempo todo, parecia ser impensável fazer-se este acto hoje. É importante quando estamos a falar da reconciliação nacional, da unidade dos angolanos”, frisou Samakuva.
“Pensamos que temos, de facto, de virar a página e olharmos para a frente. E não podemos olhar para a frente quando temos aspectos candentes que tocam directamente as vidas das famílias, as nossas vidas. Realizar actos como este é ultrapassar o que posso considerar obstáculos à verdadeira reconciliação nacional. Muitas vezes estamos a falar da reconciliação, temos discursos bons, mas, na prática, deixamos muita coisa para trás. Penso que é importante e temos todos de reconhecer este passo”, congratulou-se.
Samakuva lembrou que, no dia em que lhe foi comunicada a morte de “Ben Ben”, Savimbi lhe telefonou a dar a notícia e pediu para que o corpo não fosse trasladado para Angola, uma vez que nunca teria uma cerimónia “digna”.
“Esperemos até que um dia o Ben regresse e seja enterrado com dignidade”, afirmou Savimbi.
E ele (Savimbi) dizia: “Podemos ser nós, ou outros”. Ele já não é, mas outros, sim, estão aqui. Se eu reparo na importância e na dignidade que se está a dar ao acto, vejo que, afinal, Savimbi tinha razão. Certamente não teria esta dignidade naquela altura”, terminou.
Se para ter cerimónias com esta dignidade, no dizer de Samakuva, “Ben Ben” teve de esperar 20 anos… Jonas Savimbi terá com certeza de esperar aí 50 anos.
À chegada, os restos mortais de Arlindo Chenda Pena “Ben Ben” foram recebidos com honras militares por altas individualidades do Governo angolano, bem como pelo “Estado-Maior” da UNITA (que, por ordem – diz-se – das autoridades sul-africanas, foi impedida de cobrir a urna com a sua bandeira), altas patentes das Forças Armadas e a própria família.
Folha 8 com Lusa