30.03.2018 às 18h16
Depois de, no fim do ano passado, o governo espanhol ter dissolvido o Parlamento eleito da Catalunha e provocado novas eleições, Carles Puidgemont deixou um compromisso e uma pergunta. Antes de se saber qual seria o resultado, o compromisso era que os independentistas respeitariam escrupulosamente o resultado desse ato eleitoral. A pergunta era se o governo espanhol do PP faria o mesmo.
Como se vê, não fez. A resposta do Reino de Espanha não podia aliás ter sido mais expressiva. Os 13 ex-membros do governo da Generalitat da Catalunha, bem como deputados eleitos nas últimas eleições regionais a 21 de dezembro de 2017, estão acusados de crimes como rebelião, sedição e desvio de fundos. Além disso, foi emitido um mandado de captura europeu e internacional para todos os que, entretanto, decidiram exilar-se para evitar a perseguição.
O autoritarismo do governo e a sanha punitiva do Supremo Tribunal não têm tido limites. Mais de um milhar de autarcas e de diretores das escolas foram acusados por terem colaborado na organização do referendo de outubro. A libertação dos presos políticos catalães, que nunca usaram qualquer meio violento para defender os seus pontos de vista, é liminarmente recusada. A situação política e social na Catalunha degrada-se a olhos vistos. Com estas escolhas, o governo espanhol e o Supremo Tribunal boicotam qualquer solução democrática para a questão catalã.
Sim, é mesmo do respeito por princípios básicos da democracia que se trata. Por mais que as autoridades espanholas proclamem que são uma “democracia”, os seus atos contradizem-nas todos os dias. Constituir como presos políticos dirigentes que foram eleitos, propor que sejam condenados a penas que podem ir até aos 30 anos de prisão, perseguir os exilados com mandados internacionais, não é próprio de uma “democracia madura”. Se somarmos a isso a violência policial e a repressão das manifestações, a coberto da chamada “Lei da Mordaça” aprovada em 2015, só podemos constatar que hoje, aqui ao lado, os mais elementares direitos democráticos se encontram, de facto, suspensos.
Há uma semana, o Comité de Direitos Humanos da ONU insistia que o Estado espanhol deveria com urgência "assegurar todos os direitos políticos de Jordi Sánchez" (o dirigente associativo que foi impedido de defender a sua candidatura à Presidência da Generalitat). No mesmo dia em que este apelo era feito, Jordi Turull (o novo candidato independentista à presidência) foi preso. É o modo do Reino de Espanha responder à ONU.
Perante isto, o silêncio quase generalizado da chamada “comunidade internacional” é um gesto lamentável de cobardia. O governo português pode invocar que não pretende ingerir-se em “assuntos internos” de outros estados, e os deputados da Direita e a maioria dos deputados do PS podem alinhar pelo mesmo diapasão. Porque o argumento é puramente circunstancial, a hipocrisia torna-se evidente. Dezenas de votos foram aprovados noutros momentos sobre situações de desrespeito pelos direitos humanos e pelos direitos democráticos noutros países. Agora, o silêncio e a conivência.
Não vale a pena mascarar de legalidade o que é um evidente atentado à democracia, independentemente do que cada um e cada uma possa pensar sobre a independência ou a autodeterminação da Catalunha. Nenhum problema político se resolve sem que haja a negociação de uma solução política. Por isso, o que está a acontecer é grave e é uma irresponsabilidade. Felizmente há quem, em Portugal como noutros países, não se cale. E exija o mais básico dos direitos: liberdade para os presos políticos catalães
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