"Os intelectuais, os académicos já não podem falar", afirma o presidente do município moçambicano de Quelimane, que acusa a Frelimo das ondas de violência que se têm vivido no país.
O presidente do município moçambicano de Quelimane defendeu esta quinta-feira, em declarações à agência Lusa, que, “até prova em contrário”, o partido no poder, a Frelimo, é a “principal suspeita” dos atos de violência que assolam Moçambique.
Manuel de Araújo, eleito presidente do município pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), na oposição, falava à Lusa após receber, em Lisboa, o prémio de personalidade do ano da organização Movimento Internacional Lusófono (MIL), que o distinguiu pelo trabalho em prol do desenvolvimento de Moçambique e da lusofonia.
“Moçambique neste momento está no mar alto. O [antigo] Presidente da Tanzânia, Julius Nyerere, disse, em 1977 [pouco depois do início da guerra civil], que Moçambique estava no mar alto. Hoje, nós é que estamos no mar alto: há incerteza, há medo, está-se a criar um clima de medo. Os intelectuais, os académicos já não podem falar. Quem abre a boca leva um tiro ou é raptado”, afirmou o autarca.
Para Manuel de Araújo, “não é essa a democracia” pela qual se lutou em Moçambique durante os dez anos de guerra contra Portugal e os 16 que se seguiram num conflito civil, que terminou em 1992.
“Queremos um outro Moçambique. Um Moçambique onde nenhum tirano nos possa escravizar”, defendeu, salientando o mais recente caso de violência, o ligado a Ericino de Salema, jornalista e comentador político moçambicano raptado terça-feira por desconhecidos e abandonado quarta-feira, ferido, numa estrada dos arredores de Maputo, encontrado por populares e, entretanto, hospitalizado em Maputo.
“O meu colega e amigo, Ercino de Salema, foi raptado e violentado só porque ousou criticar o filho do Presidente da República [Filipe Nyusi]. Não é essa a democracia pela qual milhares de jovens de Moçambique lutaram”, frisou, lembrando também o caso de Mahamudo Amurane, o presidente do município de Nampula assassinado a tiro em outubro último, eleito também pelo MDM.
Manuel de Araújo lembrou ainda o “atentado” de que foi vítima o analista político e docente universitário José Macuane, que foi ferido a tiro por desconhecidos na província de Maputo em maio de 2016, e o assassínio de Carlos Cardoso, jornalista abatido a tiro em 2000.
“Não tenho dúvidas quanto a isso [responsabilidade do Governo moçambicano na violência)]. Mahamudo Amurane, Carlos Cardoso, Ericino de Salema, o atentado ao professor José Macuane, a todos eles, até prova em contrário, o primeiro suspeito é o partido Frelimo e o presidente Nyusi”, frisou.
Por outro lado, em termos políticos, e questionado pela Lusa sobre se o MDM está disposto a negociar eventuais coligações com o maior partido da oposição, Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), tanto nas eleições gerais (presidenciais e legislativas) como nas autárquicas, Manuel de Araújo nada adiantou.
“É o que a Comissão Política [do MDM] decidiu e, como não sou da Comissão Política, não posso avançar nada. Em abril, vamos ter uma reunião do Conselho Nacional, de que sou membro, e aí poderemos discutir a estratégia eleitoral”, sublinhou.