quarta-feira, 19 de novembro de 2025

Lázaro Kavandame e o nacionalismo maconde (2)

 Eusébio A. P. Gwembe

21 de setembro de 2017 
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Lázaro Kavandame e o nacionalismo maconde (2)
Transcrição do texto: Moçambique, uma Experiência Africana
O artigo seguinte foi, originalmente, entregue ao Comité de Descolonização das nações Unidas em 25 de Maio de 1965. O autor é membro do Comité Central da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO)
Sou um camponês de Moçambique, e trabalho na região de Mueda no norte do País. O meu nome é Lázaro Kavandame e quero dar a conhecer a minha experiência de camponês obrigado a trabalhar num país que se encontra sob a dominação colonial portuguesa. Espero que alguns dos factos da minha experiência pessoal possam dar úteis informações ao Vosso Comité e a todos os que se interessam em ajudar o meu povo para alcançar a liberdade contra a opressão portuguesa.
O Governo português não está interessado em aumentar o bem-estar do povo de Moçambique, contrariamente ao que propagandeia através do Mundo, fazendo o possível para alcançar a certeza de que os moçambicanos permaneceram ignorantes. Todas as tentativas do nosso povo para modificar a sua miserável condição são barbara e impiedosamente reprimidas pelo governo português.
As minhas actividades de líder politico popular começaram em 1957, ano em que tomei a responsabilidade de apresentar algumas petições do povo da minha região as autoridades portuguesas locais, após ter constatado as suas misérias e sofrimentos quando eram obrigados a trabalhar nas plantações europeias e asiáticas, ou a cortar madeira e a trabalhar na construção de estradas sem terem sequer as mínimas condições de vida e sem pagamento adequado.
Em primeiro lugar julguei que assim era devido ao nosso povo ser pobre e ignorante, e pedi as autoridades portuguesas que autorizassem que eu- e outros que sabiam ler e escrever, os ensinássemos. Eles eram constantemente chicoteados, encarcerados sem razão, obrigados a trabalhar sem alimentação durante longos períodos, ou multados por não alcançarem as cotas de algodão a que eram obrigados ao fim de cada colheita.
Também pedi que me deixassem organizar um programa de educação para ensinar melhores métodos de cultivo e conservação das colheitas, auxiliando-os a conseguir melhores resultados.
Eu esperava vir a ser capaz de reduzir o sofrimento da maioria dos nossos camponeses, obrigados a trabalhar sob vigilância persistente e opressiva do superintendente português, o qual esta sempre pronto a chicotear. Tentei mostrar as autoridades portuguesas que o salário de 60 escudos (2 Dólares) por mês dum trabalhador agrícola é insuficiente para um homem que também tem de pagar 120 escudos (4 dólares) anuais de impostos ao governo português, fora outras despesas.
As autoridades mandaram-me chamar um certo dia e autorizaram-me a iniciar um programa educativo para os camponeses africanos do meu distrito, permitindo-me também formar uma sociedade cooperativa dos agricultores locais. Além disso as autoridades informaram-nos de que poderíamos cultivar a superfície de terra que desejássemos, uma vez que produzíssemos a quantidade de algodão a que encontrava obrigada cada família africana.
O administrador português tentou desencorajar-me dizendo que era impossível ensinar o que quer que fosse a analfabetos. "Vos, os negros, sois preguiçosos, - dizia ele - a única coisa que vos faz trabalhar é o chicote". Entretanto, durante um certo tempo, ele deixou-nos trabalhar. Estabelecemos a sociedade cooperativa que chamamos "Sociedade Agrícola Algodoeira Voluntária dos Africanos de Moçambique". No princípio éramos 500 pessoas e, num grande campo, cultivamos mapira, amendoim e milho. Ao mesmo tempo cultivamos também a superfície de algodão a que nos obrigavam o governo e as companhias concessionárias, isto é, 4 hectares por família. Solicitamos então ao governo que nos permitisse estabelecer um fundo especial para a compra de bicicletas, papel, lápis, etc. de maneira a facilitar o trabalho da cooperativa.
Mais tarde, como as autoridades portuguesas notassem o êxito do nosso trabalho, fui de novo chamado a administração central do distrito, onde me perguntaram porque é que eu trabalhava tanto sem ser pago. Perguntaram-me, também, se alguém me pagava de qualquer maneira secreta. Respondi-lhes que ninguém me pagava coisa alguma e que o fazia, simplesmente, para o bem-estar do povo de Moçambique, de modo a que cada homem do nosso país viesse a possuir o que cada homem tem direito, vivendo com dignidade e sem sofrimento.
As minhas respostas não agradaram e as autoridades propuseram-me que eu aceitasse trabalhar para a companhia concessionária de algodão SAGAL, a qual controla a região noroeste do Moçambique, oferecendo-me um salário de 1000 escudos por mês (33,33 dólares), uma casa e uma motocicleta, explicando-me que tudo isso era devido ao meu bom trabalho.
Recusei essa oferta devido a sentir que já tinha contraído uma grave responsabilidade para com o meu povo, parecendo-me uma traição abandonar os que tinham confiado em mim durante tanto tempo. O dinheiro que os portugueses me ofereciam não me tentou pois o bem-estar do meu povo era, para mim, mais importante.
Em 1958, a nossa cooperativa tinha alcançado mais de 1000 membros, os quais eram, sobretudo, atraídos pelo facto de não terem de trabalhar sob a supervisão opressora do homem branco, e pelo facto de que, em conjunto podíamos produzir muito mais. Em Julho de 1959 alcançamos 1500 membros.
Foi por essa altura que o governo português, sob a instigação da SAGAL, a companhia concessionária do algodão da região começou a proibir que aumentássemos o número dos nossos membros, dizendo que dali em diante os africanos de Moçambique podiam somente trabalhar para a SAGAL.
Porém, mesmo após essa proibição, a companhia algodoeira não estava contente, pois os 1500 membros da nossa sociedade tinham a liberdade de trabalhar como lhes apetecia, sem serem obrigados, nem directamente explorados. A SAGAL iniciou então uma campanha de provocação mais directa. Sob o pretexto de investigação das nossas plantações, como lho permitia a autorização do governo, começou a enviar homens para visitarem os nossos campos, ordenando a destruição de todas as árvores frutíferas, tais como Laranjeiras e cajueiros, sob o pretexto de que elas eram prejudiciais a produção de algodão. Após isso muitos dos nossos membros começaram a ser presos e obrigados a trabalhar noutras plantações de algodão e sisal, acusados de não ter cumprido com as cotas obrigatórias de algodão. Para nos tornou-se óbvio que o governo português não estava interessado no nosso bem-estar, pois senão não mandava prender bons camponeses africanos, mandando-os para o trabalho forçado nas plantações europeias. Eu, pessoalmente, conclui que os portugueses se opunham a liberdade dos negros e a todas as suas tentativas para melhorar o seu padrão de vida.
Entretanto eu tinha convencido os membros da nossa cooperativa a construírem as nossas próprias estradas, de modo a facilitar o transporte da produção para os mercados centrais, evitando assim de caminhar muitos quilómetros transportando pesadas cargas. Assim, abrimos quatro estradas que nos ligavam com as estradas principais que comunicavam com as principais cidades. Quando os portugueses deram por isso, em vez de contentamento, ordenaram que eu fosse preso, com o pretexto de que não tinha pedido autorização para construir as estradas, e achando estranho que, por simples sugestão minha, o povo fosse capaz de construir trinta a quarenta quilómetros de estradas em tão pouco tempo, uma vez que o mesmo povo não trabalhava com vontade para o governo português.
Entrei na prisão em Setembro de 1959, permanecendo dois anos sem julgamento. Entretanto a nossa cooperativa foi dissolvida por ordem das autoridades, sendo presos muitos dos seus dirigentes. Em 1961 fui libertado da prisão, mas condenado a reclusão em casa. Uma semana depois fui interrogado acerca dos meus planos para o futuro, ao que respondi não ter nenhuns planos.
Então propuseram-me que estabelecesse outra sociedade cooperativa sob as condições seguintes: a sociedade permaneceria sob o controle directo do governo e não poderia ter mais de 25 membros. Por não ter alternativa aceitei a proposta que era feita, trabalhando arduamente durante dois anos para tentar reconstruir o que tinha sido perdido. Plantamos arroz, gergelim, batatas, mamonas e milho. Para podermos cultivar mais terreno sugeri aos membros que compra um tractor novo com os nossos próprios fundos. No dia da entrega do tractor houve uma festa em que participou, praticamente, todo o povo de Mueda e eu falei, explicando a importância do tractor para os nossos trabalhos, dizendo-lhes que os que nos acusavam de preguiçosos não tinham razão e que, para que o nosso povo prosperasse, o que tínhamos a fazer era organizarmo-nos e aprender melhores métodos de cultura. Em nome da sociedade cooperativa coloquei o tractor a disposição dos Moçambicanos da região que dele necessitassem, pelo que todos me aplaudiram, agradecendo o que eu tinha dito e feito.
As autoridades portuguesas foram informadas acerca das minhas palavras, não tendo ficado satisfeitas com elas. Poucos dias mais tarde, a polícia começou a prender membros da nossa sociedade, acusando-os de vários crimes. Eu fui de novo chamado ao posto administrativo central da região e o administrador perguntou-me se eu tinha ouvido falar do que acontecera na Tanganyka, se eu sabia da existência dum novo movimento chamado FRELIMO, se eu próprio era membro desse movimento político, ou se trabalhava para ele.
Respondi que jamais ouvira falar desse movimento e deixaram-me voltar para casa a pé, uma distância de quase 5 quilómetros. Uma hora mais tarde um polícia bateu a minha porta, informando-me de que eu teria de voltar ao posto, para ser interrogado de novo. Era evidente que as autoridades queriam humilhar-me e assustar-me, mas obedeci e o funcionário português disse-me que eu deveria pensar seriamente na minha vida e não entrar em complicações. Após isso ordenou-me que voltasse a casa.
Passei a noite sem dormir, sabendo que jamais me deixariam em paz, que tudo o que eu fizesse seria controlado pelas autoridades, que a policia investigaria todos os meus passos e que os interrogatórios se tornariam ainda mais frequentes. A minha única esperança de salvação era a fuga, decidindo esconder-me na floresta em vez de voltar a casa, esperando poder continuar em contacto com os meus compatriotas e escapar a prisão.
Quando as autoridades souberam do meu desaparecimento, mandaram os soldados procurar-me nas florestas, mas sem resultado. A minha família e muita gente da minha região pensaram que os portugueses me tinham matado, principalmente após que as autoridades levaram tudo o que me pertencia.
Dez dias depois, quando as autoridades deixaram de me procurar, voltei calmamente a casa, contando a minha família e os outros compatriotas, ficando todos contentes com que eu não estivesse morto. Combinamos imediatamente uma reunião dos liders na floresta, para discutirmos a maneira de conquistar a nossa liberdade e expulsarmos os portugueses opressores da nossa pátria. Após uma longa e seria discussão concluímos que o povo makonde, sozinho, não seria capaz de expulsar o inimigo, decidindo então unir as nossas forças as dos outros povos de Moçambique.
Já tínhamos ouvido falar no estabelecimento do movimento de libertação em Junho de 1962, a FRELIMO, e contactamos os membros da FRELIMO na nossa região, dizendo-lhes que estávamos prontos a trabalhar com eles para a libertação do nosso país.
Como é sabido a FRELIMO declarou a insurreição geral armada contra os colonialistas portugueses em Moçambique em 25 de Setembro do ano passado. O nosso povo esperava pelo dia em que poderia levantar-se para poder lutar pela liberdade, regozijando-se com a declaração de guerra aos opressores, embora sabendo que ainda terão muito que sofrer com a repressão implacável do exercito e da policia portuguesa. Entretanto estamos determinados a lutar para alcançarmos a vitória. Deus deu-nos a vontade de vivermos livres e nada se poderá opor no caminho da nossa liberdade.
- Lázaro Kavandame.
Emerson Chiloveque
Poxa, HISTORIA, isto precisa ir parar aos livros, precisa ser ensinado , revelado... epah!
Olegário Muando
Pàginas da nossa História.... Grato Eusébio A. P. Gwembe
Claudino G. Nchumali
Saudades desse meu amigo Eusébio A. P. Gwembe, por favor nao suma mais muito tempo assim, principalmente sobre este tipo de informacao. Obrigado
Eduardo Domingos
Quem matou Lazaro Kavandame, Eusébio A. P. Gwembe?
Eusébio A. P. Gwembe
Nao sei quem o matou, Eduardo Domingos. Avança la! 🙂
Fidel Macete
Parabéns. Eusébio A. P. Gwembe. Factos que pelo menos eu não sabia! Gostaria de perceber o momento em que ele é tido como traidor ( tal como aprendi)
Rodrigo Carlos Guedes
É fácil de saber, esquemas da FRELIMO. A luta continua
Jemusse Abel
Diante de nacionalismo candente em Lázaro Nkavandame eu nao sei porque gente do planálto ainda receam exaltar a sua personalidade. A geração moderna precisa de saber esta realidade pra deixarem de exaltarem herois fracos... Poderiamos Ohhh Eusébio A. P. Gwembe sugerir aue esta historia fosse vinculada no museu de mueda(local do massacre que mais uma vez visitei no final de semana passado) que ainda precisa de subsidios como estes pra engrandecer um dos seus queridos filhos seu.
Eusébio A. P. Gwembe
Ai entra o problema da Historia e o Poder Politico, Jemusse Abel. A Ciência da Historia sempre teve este grande amigo que se chama de Poder Politico.
Abinelto Bié
Emocionante este relato de Lázaro Kavandame, uma verdadeira lição de nacionalismo. Obrigado Eusébio Gwembe.
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Claudino G. Nchumali
Pobre Lázaro Kavandame: De naciolista a Reacionario. Eusébio A. P. Gwembe so assim de uma forma muito rapida, haverá nos seus manuais/escritos que por ai tens uma figura nacioanalista/reacionario com as origens no sul do Save? Caso sim? porque nao se ouve falar muito como os Simangos, os Kavandames e os Celinas? Uma vez alguem me puxou a boca quando era crianca, na continuardor de mocambique, quando ao invez de dizer Simango eu Matola, nao conhecia nenhum Matola que fosse reacionario, apenas sabia que era uma coisa no sul do Pais.
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Eusébio A. P. Gwembe
Gwambe e Gumane, eram do Sul do Save, Claudino Nchumali
Rodrigo Carlos Guedes
Lázaro kavandame foi um grande nacionalista e pensador democrático. A luta continua
Angelica Canbido Mucama
Obrigada precisamos de rever a Historia
Wa Ka Mutlinyinye
Este eh o Lazaro kavandame que tirei 20 valores na Historia, defendendo que traiu a Frelimo e matou muita gente. A nossa Historia precisa ser revista,
Mondlane Calane Dzovo Kito
Emocionante este Relato.
Majuba Muabsa
Mas, depois, o que fez com que se desentendesse com a FRELIMO? Sei que foi para no Quenia.
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Leonildo Viagem
Grande Mze Nkavandame
Albino Francisco Fumo Fumo
A ser verdade, tudo indica que o Lazaro Kavandame era um homem muito valente.
Avestino Fundai
Obrigado Eusébio A. P. Gwembe. Por essa aula, Linda história do John Claudio Vandame. Alias do Lazáro Kavandame.
Juma Aiuba
Obrigado Eusébio A. P. Gwembe!
Raul Novinte
"Lázaro Kavandame" O que me deixa com pontos de interrogações é como este tipo de gente foi totalmente excluído da história de Moçambique e tendo sido rotulado de " reacionário". Isso me deixa triste. Cada dia que passa chego a conclusão que os que chegaram no fim são os malandros e os bons foram rotulados e mortos, pois até hoje é o que tem acontecido.. Quando leio a história sobre, Lázaro Kavandame, Joana Simião, Urias Simango, padre Kuenjere, Samuel Kamkompa e outros tudo indica que a maioria deles eram do norte e centro de Moçambique. Isto me deixa a questionar. Por que é que só os do norte e centro é que eram reacionários?
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Antonio A. S. Kawaria
Tenho que ler isto
Rosa Maria
Que coisa boa tao boa que era para o bem dessa populacao ,deixaria de ser pobres e com fartura de alimentos ,viveriam sem fome nem budez ,mas o colono teve muita inveja,Quem matou esse homem????? Como morreu???
Antonio A. S. Kawaria
Fico feliz por saber que a quem me ensinaram que era reacionário era um grande nacionalista. Há que reconciliar-se com a verdade.
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Homer Wolf
«Khavandame começou bem, mas terminou mal.
Eu próprio fui seu quadro. Por meio dele muitos de nós entramos para a política propriamente dita. No principio acreditamos muito nele. Porque além de padre ele parecia ser mais católico do que os católicos normais. Por exemplo, jejuava todas as sextas-feiras (e não só na sexta-feira santa, como os restantes).
Mas aos poucos foi-se revelando: em lugar de obedecer ao chefe (Mondlane), virou-se contra ele. Porque na sua opinião Simango era quem devia ser presidente e ele o vice. Caiu-lhe a máscara da ambição.»
Raimundo Pachinuapa (excerto de uma entrevista a ser publicada em breve)
Nelio Raul Joao
Afinal o Lázaro Kavandame, não o mau da fita como os manuais de história ensinaram nos. Como alguém diria " os cobardes vivos escrevem à história dos herois mortos".....
Gabriel Serafim Muthisse
A deserção e entrega ao inimigo, como se classifica em todos os exércitos? Em todas as guerras?
Como se classifica, em todas as guerras, em todos os exércitos, matar o Chefe Operacional Adjunto do exército, pelas costas, com uma faca? Isso é heroísmo?
Karenina Wonderland
Alta traicao.
Oscar Titos
É necessário que se busque a verdade histórica,na minha opinião duvido da autenticidade e credibilidade da fonte...nesse caso por questões politicas pode ter havido Defraudação, falsificação, omissão e destorcao das informações.. Sr gwambe não manipulaste essa informação?
Oscar Titos
O Lázaro não queria só a libertação regional?como alguns lideres fazem hoje?essa versão contada não passa duma manipulação com fins políticos..essa é a minha opinião
Eusébio A. P. Gwembe
O Desejo de Samora (que foi ultrapassado por um grupo denunciado em 1986) era nobre e encontra-se expresso neste discurso profido na Beira.
"OS REACCIONÁRIOS SERAO EDUCADOS
Fixem bem que a nossa preocupação está toda ela virada para as zonas libertadas e as zonas libertadas devem ser o modelo para as cidades. Lázaro Kavandame não está libertado. Sei que andam por ai boatos de que o Lázaro Kavandare está libertado, mas não está libertado. Verónica Namiva não está libertada, Joana Simeão não está libertada, Uria Simango não está libertado. Nós não os matamos, nós queremos que eles sejam educados por vocês, vocês vão conversar com eles. Eles passarão por todas as zonas libertadas, falarão com vocês e viverão com vocês também. MUITO OBRIGADO Á TODOS. Vamo-nos encontrar depois do 25 de Junho. Pedimos para vocês celebrarem na paz, na ordem, a Independência de Moçambique. Unidade, Trabalho, Vigilância, dentro de dez anos não estaremos nestas condições, tudo terá mudado no nosso país, temos a certeza".
Samora Machel, 1975
Vitorino David
Bem haja ilustre Eusébio A. P. Gwembe
Antonio A. S. Kawaria
Notaram um facto? Lázaro Nkavandame no seu depoimento "esquece-se" de relatar aquele que nos foi dado a crer de ter sido o maior evento da década sessanta: o massacre de Mueda onde alegadamente foram assassinadas 600 pessoas! Distracção minha ou ....! MA
Joao Cabrita
Bom dia, Prezado e Ilustre Gabriel Muthisse.
Paulo S Kankhomba foi morto em 1968. Kavandame apresentou-se às autoridades coloniais em Março de 1969, após a morte de Mondlane. Dois episódios distintos.
Um numeroso grupo de apoiantes de Lázaro Kavandame, que veio com ele, foi alvo de um ataque da Força Aérea Portuguesa em Cabo Delgado, tendo muitos morrido. O piloto da FAP, que julgou tratar-se de um grupo de guerrilheiros da Frelimo, não estava informado da chegada de Lázaro Kavandame.
Não tenho conhecimento que Lázaro Kavandame tivesse indicado bases da Frelimo para serem atacadas. A localização das bases foi sempre do conhecimento das tropas portuguesas. O que Gabriel Muthisse afirma é a versão da Frelimo. Há que cruzar as fontes, Caro Gabriel Muthisse, segundo ensinamentos que colhi de si – e que sigo religiosamente.
Joao Cabrita
Bom dia, Cara Amiga Josina Malique.
Pertencer a uma formação política, ou grupo, movimento, partido ou instituição, ou deixar de pertencer a qualquer um deles. é um direito elementar, fundamental, consagrado em tratados de Direitos Humanos universais, alguns deles ratificados pelo Estado moçambicano.
Não constitui, portanto, acto de traição, o facto de Kavandame ter abandonado a Frelimo.
A continuação de um bom dia, Cara Amiga.
Karenina Wonderland
E-o no meu entendimento e naquelas circunstancias. E acredito que se calhar assim seja em outras latitudes de referencia. Essa aceitacao significa necessariamente uma comunhao de valores, principios e praticas. Agir em contrario a esta comunhao, a esta causa e sim traicao.
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Joao Cabrita
Os direitos são para ser respeitados – sempre. A Lei não prevê o respeito por direitos humanos em regime de part-time. É certo que em certas latitudes isso nem sempre acontece, e em casos desses estamos perante uma violação.
Gabriel Serafim Muthisse
Joao Cabrita, entregar-se ao inimigo foi punido com pena de morte na Resistência Francesa, na Resistência Grega. Até meados da década 70 ou pouco mais, era punido com pena de morte na maioria dos exércitos do mundo.
Nkhavandame indicou bases da FRELIMO, sim. Mobilizou, por diferentes meios, os guerrilheiros a desertarem e a entregarem-se aos portugueses.
Foram homens de Nkavandame que mataram Nkankhomba.
Negar isto é irresponsabilidade. Há gravações da voz de Nkavandame, que era repetida pela aviação portuguesa a chamar à deserção. Não sei o que Cabrita está a desmentir
Joao Cabrita
Debater com Gabriel Muthisse é um exercício fútil. Ele não apenas é parte interessada -- logo, comprometida, o que parece indicar que está isento do princípio do cruzamento de fontes que reclama só para outrém, como aqui demonstrado -- , mas distorce o que os outros escrevem. O que volta a ser lamentável.
Concretamente, não desmenti que Paulo S Kankhomba tivesse sido morto por gente ligada a Kavandame. Em 2000 deixei publicado:
«Shortly after the [Tanzania/Cabo Delgado] border reopened, Frelimo sent its deputy chief of operations, Paulo Kankhomba, to Cabo Delgado to reorganize Frelimo’s structures in the province, relieving those loyal to Kavandame from their posts. On 22 December 1968, as he was about to enter Cabo Delgado, a group of Frelimo youth leaguers waylaid Kankhomba, stabbing him to death.» pp 56,57
Na página 61 da mesma publicação acrescentei que os “youth leaguers” eram leais a Kavandame.
Portanto, não seria agora que iria desmentir o que escrevi há mais de 17 anos, Gabriel Muthisse.
Também não desmenti que Kavandame tivesse apelado a membros da Frelimo a juntarem-se a ele, depois de Março de 1969.
O que disse foi que não dispunha de provas de que Kavandame indicara bases da Frelimo às tropas portuguesas. Gabriel Muthisse tem a versão da Frelimo. À luz do princípio acima recordado, Gabriel Muthisse tem de apresentar outras provas.
Se a Resistência Francesa, gregos e a maioria dos exércitos do mundo puniam os que se entregavam ao inimigo com a pena de morte, essa prática não deixava de constituir uma violação da lei. Mas alguns poderão argumentar que em situações de guerra prevalece a lei do mais forte.
Quando a Frelimo executou sumariamente Kavandame e outros alegados traidores, nenhum deles estava em guerra com o governo da República Popular de Moçambique. Estavam detidos, sem mandado de captura passado por instituição competente, detenção essa efectuada após a assinatura de um acordo de cessar-fogo. À luz da Constituição que esse próprio governo aprovou, os detidos beneficiavam do direito a defesa. Direito que lhes foi negado. Além do mais, não existia na altura a pena de morte no Código Penal em vigor no país.
Como se depreende, Gabriel Muthisse e outros regem-se pela ‘lei’ dos dois pesos e duas medidas.
Joao Cabrita
Além do mais, o conceito de traição que uns poucos aqui defendem não pode ser visto de forma isolada. Bem antes de Março de 1969, Kavandame havia rompido com a direcção da Frelimo. Pedira a realização do II Congresso em Mtwara para, entre outras coisas, eleger um novo presidente. A facção oposta, decidiu realizar o Congresso em local diferente, o que levou a facção de Kavandame a rejeitar a direcção da Frelimo por completo, declarando que Cabo Delgado era zona vedada a Mondlane e seus seguidores. O Baraza la Waze também retirou o apoio a Mondlane. Afigura-se, pois, necessário ir às raízes deste conflito para se ser ter uma visão completa da situação e assim concluir-se que o que constitui traição para uns, não é necessariamente traição para outros.
Gabriel Serafim Muthisse
Matar o Chefe Adjunto das Operações de um exército de que se é dirigente é traição. Quando Nkankhomba foi assassinado, Nkavandame ainda era membro da FRELIMO. Só se exige a realização de um novo Congresso de uma organização de que se é membro.
Cabrita deve ver quando Nkavandame foge para o interior. E quando é expulso da FRELIMO
Joao Cabrita
Kavandame pediu a realização do Congresso quando ainda era membro da Frelimo, Gabriel Muthisse. De acordo com uma nota autobiográfica do Padre Mateus Gwengere datada de 16.11.1972, Kavandame e os 'chairmen' da Província de Cabo Delgado pretendiam um Congresso em 1968, em território tanzaniano. A nota diz que outros secretários provinciais concordaram. Mondlane acedeu ao pedido, tendo o Congresso sido marcado para Junho de 1968, mas não em território tanzaniano. Kavandame e os delegados de Cabo Delgado boicotaram o Congresso, que viria ter lugar no Niassa.
Não preciso ver quando Kavandame 'fugiu' para o interior, Gabriel Muthisse. Indiquei acima que foi em Março de 1969.
Gabriel Serafim Muthisse
Portanto, quando os homens deles mataram Nkankhomba, ele ainda era membro da FRELIMO. Matar um teu oficial é um acto de heroísmo? Ou é traição?
Joao Cabrita
Nem heroísmo, nem traição. Não estou aqui a defender matanças, nem me cabe tomar partido por uma das facções. O que desejo - e julgo ser a vontade de muitos aqui presentes - , é compreender o porquê desta situação de crise interna na Frelimo.
Gabriel Muthisse insiste em apontar o caso de Kankhomba. Mas 7 meses antes, Sansão Muthemba morria em Dar es Salaam. A intenção dos assaltantes não era liquidar Muthemba, mas sim toda a cúpula da Frelimo.
E de novo a pergunta: o que explica esta situação?
Como disse antes, não se pode analisar a situação isoladamente. Há que vê-la no seu todo. Essa a dificuldade de Gabriel Muthisse.
Não lhe nego a si, Gabriel Muthisse, o direito de classificar o assassinato de Kankhomba de traição. Mas uma vez que deseja analisar as coisas sob essa perspectiva, como classifica a morte, dois anos antes, de Filipe Magaia?
Quanto a mim, desejo saber o mesmo: porquê? o que explica essa situação interna na Frelimo que se manifestava de forma violenta já em 1966? Talvez assim possamos compreender o presente.
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