Moçambique precisa
“De jovens com enguiço de liderança desenvolvimentista” Adriano Nuvunga
Jovens vamos beber da fonte e o caminho para passarmos de excluídos para incluídos no processo de desenvolvimento: Uma aula a juventude...
Diferente do crescimento económico que considera apenas o Produto Nacional Bruto e o Produto Interno Bruto, o desenvolvimento económico toma, para além destes parâmetros, o Produto Nacional Bruto per capita, taxas de natalidade e mortalidade, índice de desenvolvimento humano, taxa de mortalidade infantil, taxa de analfabetismo e esperança de vida.
O conceito de desenvolvimento econômico é bastante complexo, principalmente quando se pretende determinar o fator gerador e motivador de tal desenvolvimento. Nestas notas se pretende, tão somente, aflorar o enquadramento da juventude no processo de desenvolvimento. Para este exercício, Amartya Sen, Premio Nobel de Economia, é fundamental.
Para Amartya Sen o desenvolvimento econômico está baseado na liberdade que o individuo possui em uma determinada economia. Para ele, o desenvolvimento pode ser encarado como um processo de alargamento das liberdades reais de que uma pessoa goza. A tônica nas liberdades humanas contrasta com perspectivas mais restritas de desenvolvimento, que o identificam com o crescimento do produto nacional bruto, com o aumento das receitas pessoais, com a industrialização, com o progresso tecnológico, ou com a modernização social. Considerar o desenvolvimento como expansão das liberdades substantivas orienta as ações para os fins que tornam o desenvolvimento algo importante, mais do que para os meios que desempenham papéis de relevo.
O seu modelo consiste basicamente em demonstrar que o desenvolvimento de uma nação só é possível se este demonstrar reais possibilidades de seus cidadãos em ter acesso a liberdade. Liberdades essas que incluem não apenas as garantias dos direitos sociais, mas também saúde e educação de qualidade, segurança e acesso a habitação, lazer, cultura e também a ser parte do processo de desenvolvimento. Para Sen, desenvolvimento é o cidadão ter a liberdade de acesso a esses factores, no momento que precisar, sem ser lesado por isso.
É qui onde entra o tema da juventude, na sua relação com o desenvolvimento. Primeiro, em termos de acesso aos factores do processo de desenvolvimento. Segundo, em termos de acesso ao bem-estar, como um bem público resultante desse desenvolvimento. Antes de expandir este ponto, importa mapear um pouco aquilo que se tem visto, na sociedade, no campo da participação da juventude na vida pública.
John Gaventa distingue dois espaços de participação política e socioeconómica, nomeadamente os ‘convidados’ e os ‘reivindicados’. Os espaços convidados são aqueles criados pelo poder público para a interacção com os vários grupos de interesse e pressão que agitam a sociedade. As ligas juvenis dos partidos políticos, os conselhos nacionais da juventude; os fundos de apoio ao desenvolvimento, são alguns exemplos. Os espaços reivindicados são aqueles informalmente estabelecidos por grupos de interesse e pressão que agitam a sociedade, que captam atenção do poder público pela sua efectividade na estruturação da opinião pública. Os vários grupos informais, incluindo os do comercio, são alguns dos exemplos.
Em sociedades estáveis, com instituições democráticas funcionais, os conselhos nacionais da juventude oferecem avenidas viáveis para a participação da juventude na governação política, económica e social, mas em estados frágeis, as plataformas nacionais da juventude tendem a ser mecanismos de cooptação política ou reservadas para a juventude ligada à elite. O que se está a dizer, aqui, é que, apesar do potencial que a governação democrática tem para a participação da juventude, os mecanismos formais que lá existem para tal participação não são imunes a alguns dos clássicos desafios de participação que incluem ‘token participation’ e exclusão.
A literatura destaca ainda que as relações de poder entre gerações são também uma importante dinâmica que impactam nas possibilidades de participação da juventude na governação política, económica e social. Em Guatemala e outros contextos, a juventude é vista com estereótipos negativos por actores estatais. Em sociedades pós-conflitos há também a questão de como os adultos legitimam a sua dominação e autoridade. Em muitas sociedades, a participação na luta que levou à independência ou nova ordem política é o instrumento de legitimação política que, claramente, age contra os jovens que não participaram desses processos.
O termo ‘born-free generation’, na África do Sul e Zimbabwe, é usado para deslegitimar as vozes dos jovens que não participaram da luta armada. Em termos gerais, as normas sociais requerem que os jovens escutem e sejam subservientes à autoridade dos adultos que veem, no criticismo da juventude, uma forma de desrespeito. A geração adulta é apontada, por jovens, segundo a literatura, em muitos contextos, como sendo obstáculo e não facilitadora da participação da juventude na política e no desenvolvimento. Perante estas dificuldades impostas pelos mecanismos formais, os jovens enveredam por espaços informais para influenciar o processo de desenvolvimento.
É em espaços informais (de interesse e pressão) que os jovens agem como mobilizadores sociais, económicos e facilitadores de mecanismos de governação informal que contribuem para o desenvolvimento. A literatura fala de inspiradores casos de jovens a catalisarem iniciativas não só de contestação, mas também de organização e mobilização de desenvolvimento, apesar de difíceis contextos em Sri Lanka, África do Sul, Serra Leoa, Nepal, Filipinas. São exemplos de jovens que não tiveram medo de enfrentar as autoridades ou de encontrar espaços ‘contestados’ para, no quadro informal, contribuir para o desenvolvimento das suas famílias e comunidades.
Em relação ao desenvolvimento – na dimensão de processo – o que se está a passar, com a juventude moçambicana, é aquilo a que Amanpour (2007) chama de ‘falta de ferramentas para a participação’. Talvez as ferramentas existam, mas não haja clareza sobre as regras de jogo, ou, talvez seja o próprio jogo não esteja claro! Com isto presente, se a governação é a maneira como cada sociedade se organiza para gerir o seu processo de desenvolvimento humano e socioeconómico, então em Moçambique, ela (a governação) não esclarece a que se propõe em termos de desenvolvimento. Com isto a acontecer, não há como ser claro o papel da juventude nesse processo de desenvolvimento.
Não tem futuro a sociedade que não esclarece o papel da juventude no processo de desenvolvimento. Não apenas pela ‘oportunidade perdida’ com as varias gerações de jovens que vão passando para a vida adulta sem terem deixado o seu contributo como jovens, mas também e sobretudo porque se hipoteca o futuro da sociedade ao não se permitir que o processo de desenvolvimento seja gerador de futuros líderes desenvolvimentistas. Os (bons) líderes são formados através de processos na sociedade. Isto pressupõe que a juventude seja colocada ‘na casa das maquinas’ (como diria Bertrand Russel) do processo de desenvolvimento.
Na ausência dum framework de desenvolvimento, é o que se vê, hoje: a participação da juventude na governação política e socioeconómica se traduz em ‘meter’ alguns jovens para ocupar alguns assentos numa mesa de consumismo esterilizante e perpetuadora dum estado improdutivo. Isto não só não gera o desenvolvimento, como também, mata o espírito e agência da juventude, porque, sendo excludente, requer que se seja passivo, obediente, bem-comportado para que se tenha acesso à mesa, mas os termos do bom comportamento são definidos por aqueles que controlam o acesso à mesa. Isto vai no sentido contrário à mudança transformacional e desenvolvimentista que pode resultar da agência da juventude. O que se está a dizer é que, neste momento, a governação se esforça em controlar a irreverência da juventude, ao invés de incentivá-la, a bem do desenvolvimento.
Na realidade, a governação gira em torno do ‘comer’, em termos de identificação dos que já comeram e que deviam deixar espaços para os que ainda não ‘comeram’. Isto é exterlizante ao desenvolvimento, no sentido de não permitir a exploração do potencial que o país tem, mas sim, distribuição das poucas rendas que existem.
Estas dinâmicas acorrem nos espaços ‘convidados’ da governação económica e sociopolítica, deixando para informalidade, dos espaços ‘reivindicados’ um grande segmento da juventude que apesar de ganhar sustento familiar e, em muitos momentos, conseguir pressionar a ‘governação’, não beneficia do processo de formação das lideranças do futuro da sociedade. São as liberdades de que fala Amartya Sen estruturalmente negadas à juventude que, no fundo, é um movimento que vai no sentido contrario ao desenvolvimento político da sociedade.
Implicações para a Coesão Social
Este cenário multiplica os conflitos na sociedade, incluindo intra e inter-geracionais e empobrecimento do Estado, entanto que garante dos bens públicos para o bem-estar das pessoas. Estas duas realidades minam as possibilidades de coesão social que são os fundamentos harmónicos da vida comum da ordem social mantidos entre sociedades diversas. A sociedade aqui é vista como um todo integrado e os laços é que unem os indivíduos entre si.
Os conflitos resultantes da falta de clareza sobre o modelo de desenvolvimento; as regras do jogo, alienam a juventude, criando tensões geracionais na sociedade. A perspectiva de participação na governação económica e sociopolítica como ‘meter’ alguns jovens empobrece o espírito da juventude e cria conflitos entre diferentes grupos de jovens. A governação económica como gestão do ‘comer’ cria conflitos não só entre os que tiveram ou têm acesso a mesa e os que não tiveram ou não tem como também entre os que tiveram e os que tem agora. Mais problemático, são as implicações em relação ao futuro.
Isto não cria riqueza para a presente e para a próxima geração. O que é potenciador de conflitos. Mais problemático ainda não permite desenvolvimento de novas lideranças para o futuro da sociedade. Com isto a acontecer, os mais nobres valores da convivência social como a confiança social se destrói. A coesão social é baseada em valores sociais, culturais, costumes, regras de conduta, dogmas, políticas e valores religiosos que ligam os indivíduos a sociedade. Os indivíduos assimilam os valores, hábitos e costumes, adaptam-se a socialização e garantem a existência da sociedade, a coesa, harmonia social e a continuidade da sociedade.
A unidade nacional; unidade na diferença, moçambicanidade são aspectos estruturantes da coesão social em Moçambique, no sentido de princípios de convivência dentro da sociedade moçambicana. Com exclusão social, desigualdades sociais, marginalização, pobreza absoluta, conflitos intra e intergeracionais, não gera forcas centrifugas que centrípetas para a coesão social.
Coesão social pressupõe confiança social, na sociedade, que, por sua vez, quer um mínimo de desenvolvimento económico, na sociedade, para garantir dignidade humana. O potencial da juventude de agenda de mudança transformacional desenvolvimentista de hoje e líder da sociedade de amanhã A juventude ara garantir medida como confiança entre os cidadãos dentro dos países, é uma maneira frutífera de analisar a integração social e a coesão social.
Notas de Aula Pública proferida na Universidade Pedagógica, Delegação de Quelimane, 15 de Agosto de 2018
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